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O poder das carreiras não lineares

A definição de sucesso profissional está sendo radicalmente reescrita. Não estamos mais limitados à tradicional estrada, baseada na formação acadêmica, nas estruturas piramidais de cargos e na progressão linear que uma vez nos conduziu a carreiras previsíveis. Estamos em uma era de carreiras não-lineares, onde as oportunidades se expandem em todas as direções e onde a inovação e a adaptabilidade são as chaves para o sucesso.

Do ponto de vista das empresas, a construção de alternativas de carreira não lineares significa um novo formato para dar oportunidades e aproveitar o potencial de contribuição dos funcionários. O modelo tradicional baseado em progressão linear está cada vez mais limitado. Segundo estudo da consultoria global Mercer, os números de níveis hierárquicos caíram de 18 para 8 nos últimos 20 anos. A necessidade de aumentar eficiência fez com o que estruturas fossem achatadas gerando menos opções de crescimento tradicional.

Além disso, os dados mostram que o principal fator para perda de talentos é a falta de desenvolvimento profissional. Estudo do LinkedIn mostrou que para 61% dos profissionais o fator chave para ficar na empresa é possibilidade de crescimento.
Temos uma equação de difícil resolução. De um lado estruturas enxutas e do outro, pessoas querendo mais espaços e crescimento.

A carreira não linear é uma forma de lidar com essa problemática. Nela, as pessoas podem trabalhar em atividades complementares circulando na empresa de acordo com as atividades disponíveis e sua possibilidade de contribuição. É como um profissional que está na área de vendas, mas pode trabalhar algumas horas da semana na área de recursos humanos contribuindo numa iniciativa específica.

A não linearidade significa a formalização de um aspecto cada vez mais vivo nas expectativas de carreira de muitos profissionais: o interesse de contribuir além do cargo que ocupam.

Em que pese fenômenos recentes como o “quiet quitting”, em que profissionais só querem fazer aquilo para que foram contratados e nada mais, temos um número significativo de pessoas com fome de aprendizado e interesse em colaboração além da área em que atuam.

Querem se destacar e contribuir e não necessariamente ter mudança de cargo. Entendem que participar de uma atividade complementar ao seu foco pode ser um caminho para ampliar networking e visibilidade na empresa.

A carreira não linear, também chamada de carreira em nuvem, não pode ser imposta. Precisa ser dialogada uma vez que determina esforço adicional. Esse diálogo deve considerar o interesse do profissional, momento de vida e capacidade de equilibrar suas demandas.

O movimento exige uma mudança cultural dos líderes que precisam escutar e encorajar seu time. Não podem impor e nem bloquear, precisam construir. A carreira em nuvem é uma caminhada que exige dedicação extra e isso só acontece quando o individuo entende os ganhos para sua carreira.

A não linearidade é um exercício de protagonismo em seu estado mais genuíno, pois exige autoconhecimento para descobrir interesses e paixões. Também é um movimento que sintetiza a ideia de aprendizagem permanente e adaptabilidade. É um treinamento poderoso para habilidades essenciais do século XXI e também um caminho para pensar em novos formatos de trabalho e reforçar a capacidade de gerar renda para além do emprego tradicional.

À medida que o mundo do trabalho continua a evoluir, as carreiras não-lineares estão se tornando a norma, não a exceção. É um caminho para abraçar a diversidade de oportunidades que a vida profissional moderna oferece pode ser uma jornada emocionante e gratificante, gerando ganhos para indivíduos e organizações.

POUCOS SABEM OUVIR FEEDBACKS

Na soma de exigências que são feitas aos gestores de equipes a importância de dar feedbacks tem sido destaque recorrente. Os desafios de negócios e de performance fazem com que os feedbacks sejam essenciais. A necessidade de desenvolver pessoas é crescente. Líderes vêm sendo cada vez mais cobrados a agirem como formadores de pessoas. Devem preparar novos líderes e desenvolver seus times.

Esse papel de educador passa por conversas mais frequentes.

Na mesma linha, os profissionais afirmam quererem mais conversas e feedbacks constantes para aprimorar seu desenvolvimento. 

No entanto, a arte de saber ouvir e processar as informações é uma rara habilidade.

Recente estudo realizado pela Harvard Business Review mostrou que 78% das pessoas dizem que feedbacks são fundamentais, mas apenas 26% dizem que utilizam de fato para o desenvolvimento.   

Outro estudo conduzido pelo Instituto Gallup mostrou que apenas 25% dos entrevistados acreditam que os feedbacks os motivam a realizar um trabalho melhor. 

O medo de julgamento está entre os principais motivos que geram essa incapacidade de ouvir feedbacks. Vivemos a era dos “likes” em que todos buscam aceitação e reconhecimento constantes. Receber um feedback de algo que não está indo bem pode soar como uma bomba para muitos profissionais, gerando sentimentos de rejeição e perseguição. 

Receber feedbacks construtivos requer habilidades de escuta ativa e empatia. A falta dessas habilidades pode dificultar a compreensão das críticas de forma produtiva. Para desenvolver essa habilidade é necessário cultivar uma mentalidade de crescimento. Encarar feedbacks como oportunidades de aprendizado e desenvolvimento, em vez de críticas pessoais, pode ajudar a reduzir a aversão.

A mentalidade de crescimento é a ideia de que estamos sempre aprendendo. A jornada do desenvolvimento é permanente e em todas as fases da carreira estamos sempre em aprendizado. 

Desenvolver a habilidade de escuta ativa permite compreender melhor o feedback recebido. Isso envolve concentrar-se genuinamente no que está sendo dito, fazer perguntas clarificadoras e demonstrar interesse em melhorar. Mesmo que feito com limitações ou muitas vezes numa forma não ideal, é necessário extrair reflexões do que foi dito. 

É essencial construir metas profissionais. Decodificar o feedback e transformá-lo em planos de ação é uma característica essencial de um profissional responsável com a gestão de sua carreira.

Nesse sentido o gestor pode apoiar, mas cabe a cada um de nós, construir metas de desenvolvimento.

Definir metas profissionais claras ajuda a contextualizar os feedbacks recebidos. Isso permite direcionar os esforços para áreas específicas que necessitam de melhoria. 

A dificuldade de muitos profissionais em receber feedbacks construtivos é um desafio que pode impactar negativamente o crescimento e o desenvolvimento.

Reconhecer a importância do feedback, compreender as razões por trás da aversão em ouvir e adotar estratégias para lidar com esse desafio são passos relevantes para aproveitar ao máximo as oportunidades de aprendizado proporcionadas por essa ferramenta valiosa. Enfrentar essa barreira pode resultar em um ambiente de trabalho mais produtivo, colaborativo e voltado para o desenvolvimento individual e organizacional. 

Vivemos uma época de uma perigosa e crescente terceirização de responsabilidades, como se tudo fosse culpa do líder, da área de recursos humanos e das instituições.

Em que pese existirem líderes com enorme dificuldade em fazer conversas de desenvolvimento, cabe ao protagonista aproveitar as oportunidades para refletir e buscar mentores para se inspirar. Saber gerenciar o chefe e lidar com as limitações da gestão faz parte do trabalho. Não podemos idealizar a liderança e o ambiente corporativo. 

Receber um feedback é um presente raro. Saber ouvir e decidir o que fazer com ele é a arte que cabe ao protagonista na carreira.

A arte de se comunicar em tempos difíceis

As conversas cruciais são aquelas que envolvem questões importantes, controversas, emoções fortes e situações delicadas.

Fazem parte da nossa jornada em diversos campos da vida: trabalho, família e também na esfera pública.

São cruciais porque podem determinar o resultado de uma situação. Têm impacto relevante e seu desfecho pode acarretar transformações importantes para bem ou para o mal.

A habilidade de conduzir conversas cruciais é determinante para condução de uma carreira. E, em especial, para líderes.

Um estudo da consultoria Gartner sobre movimentos de carreira mostrou que 49% dos líderes tendem a procrastinar conversas difíceis com sua equipe. Sejam conversas sobre questões salariais, problemas de relacionamento, perspectivas profissionais e divergências sobre o trabalho.

Essa postergação acarreta diversos problemas, inclusive a perda de talentos. A ausência de conversas é um dos fatores centrais do turnover voluntário porque deixa o colaborador sem visibilidade para sua carreira. Outro dado do estudo mostrou que 53% dos funcionários de alto desempenho que pediram demissão no último trabalho relatam que a ausência de perspectivas profissionais foi fator determinante para sua saída. No núcleo dessa neblina interna está a falta de diálogo.

A condução de conversas difíceis pressupõe alguns pontos.

O primeiro é o diálogo aberto e honesto. A honestidade inclui assumir vulnerabilidades. Nem sempre temos a resposta certa e precisamos assumir isso sem medo. Uma das conversas difíceis mais frequentes é sobre os próximos passos de uma carreira. Propor reflexão, fazer perguntas para ajudar na construção de cenários e explicar como as coisas funcionam são pontos essenciais.

Os autores Kerry Patterson, Joseph Grenny e Ron McMillan têm se dedicado ao estudo desses momentos decisivos e afirmam que o interesse genuíno no outro é a base para termos conversas cruciais. Também destacam a importância da segurança psicológica para criar um ambiente em que seja possível ser honesto e transparente.

Um ambiente seguro é aquele em que as partes envolvidas se sentem confortáveis para expressar opiniões e emoções. Isso envolve ouvir atentamente, demonstrar empatia e respeitar a perspectiva do outro, mesmo que não concorde com ela. É a diversidade cognitiva.

Outra técnica fundamental é o uso de fatos e dados concretos para embasar nossos argumentos. Em vez de se basear em suposições ou generalizações, é importante apresentar informações objetivas que possam sustentar nossas posições. Isso ajuda a reduzir a influência das emoções e a promover uma discussão mais racional e fundamentada.

Além disso, é essencial adotar uma postura de curiosidade genuína, buscando entender verdadeiramente o ponto de vista do outro. Muitas vezes, nos fechamos em nossas próprias perspectivas e nos recusamos a considerar outras opiniões. No entanto, ao abrir espaço para a compreensão mútua, podemos descobrir soluções criativas e encontrar um terreno comum para resolver os problemas.

Outro ponto relevante é a importância de separar as pessoas do problema. Muitas vezes, deixamos que nossas emoções e julgamentos sobre a pessoa envolvida influenciem a forma como abordamos a situação. Ao separar a pessoa do problema, podemos focar a resolução e o entendimento, em vez de nos envolver em ataques pessoais ou acusações.

Além disso, é fundamental provocar a conversa e não procrastinar.

Não devemos esperar que as coisas se resolvam sozinhas ou que outra pessoa tome a iniciativa. É essencial ter coragem e disposição para abordar as questões de frente, mesmo que isso seja desconfortável ou desafiador.

As conversas cruciais são uma parte inevitável da vida. Ao enfrentar esses diálogos com confiança, respeito e abertura temos a oportunidade de resolver problemas e construir relacionamentos saudáveis.

A retórica corporativa não agrada ninguém

Durante o século XX as pessoas aceitavam o que lhes era imposto no trabalho pela ideia do vínculo de longo prazo. O modelo mental era ingressar numa empresa e aposentar-se lá. Questionar o modelo era perigoso e ofensivo.

A gestão da carreira era delegada à empresa. Havia uma relação de subserviência. Trocar de trabalho era complexo e visto de forma pejorativa. O melhor era fingir que não percebia incoerências, assédios e esquisitices corporativas. Aceitar a retórica tinha um sentido na sustentação do emprego para a vida toda.

Isso mudou drasticamente nos últimos anos. Os indivíduos começaram a lutar por satisfação e propósito. A evolução da sociedade fez surgirem novas dinâmicas de interação entre indivíduos e empresas.  A conexão entre o sentido do que fazem e a coerência organizacional está em evidência.

A pandemia e seus impactos marcaram o início de uma nova era no trabalho. Fenômenos como “a grande renúncia” ganharam força a partir de 2020 e são um extrato da nova dinâmica, em que o indivíduo tem mais poder e quer fazer novas escolhas. Assistimos a um número significativo de pessoas que pediram demissão em busca de trabalhos que atendessem melhor ao seu estilo de vida e propósito.

Uma pesquisa realizada em 2022 pelo Instituto Gallup apontou que 43% dos profissionais estavam dispostos a trocar de trabalho e os fatores centrais eram ausência de identificação com práticas de gestão e a percepção de falta de oportunidades de mudar na empresa.

Até pouco tempo dizíamos que uma empresa precisava contar histórias para atrair pessoas ou clientes. O tal storytelling. Hoje é mais do contar histórias: é necessário garantir que ela de fato exista. O discurso deve ser vivido na realidade da empresa.

Não é aceitável uma empresa ser defensora de agenda ESG e ter fábricas que usam trabalho análogo à escravidão noutro continente. Ou ainda, pregar transparência nas equipes e usar práticas antiéticas sobre dados de clientes.

Nessa linha, as críticas às bizarrices corporativas estão mais intensas. Líderes que não observam os interesses de carreira de suas equipes impondo modelos jurássicos de comando e controle estão no centro dessa retórica inaceitável. Recente estudo da consultoria internacional Gartner, numa amostra de 5000 profissionais, apontou que 78% dos indivíduos não se sentem encorajados por seus líderes a explorar possiblidades de carreira na empresa. Não sentem confiança na relação com seus líderes.

Períodos de desemprego mais alto podem suavizar o problema para contratar, mas os danos às marcas empregadoras hostis geridas por líderes desconectados de seu tempo prevalecerão aumentando o turnover e a dificuldade de engajar.

Precisamos formar líderes que sejam faróis para apoiar seus times que façam conversas mais frequentes e assumam suas vulnerabilidades. É fim da era do líder quem tem todas as respostas. O líder contemporâneo é um conselheiro no desenvolvimento das pessoas. Precisa agir com transparência e ser embaixador de uma cultura coerente que possa atrair e engajar as pessoas. Como afirma John Mackey, co-fundador e CEO da Whole Foods Market, considerado um dos pais do capitalismo consciente: coerência e ética empresarial são os pilares mais importantes de sustentação de uma empresa.

Alguns poderiam dizer “na minha época as pessoas eram comprometidas e não havia esse discurso”. Ao invés de ficarmos escandalizados com fenômenos novos, como o TikTok de jovens se demitindo, precisamos entender essa transformação e aceitar que estamos diante de uma nova era do trabalho. Novas gerações denunciam práticas obscuras com alta intensidade.

Para os críticos da evolução já passou da hora de eliminar a naftalina do armário e se atualizar. Do contrário, serão gestores de empresas parecidas com mausoléus repletos de histórias horripilantes para contar.

 

Quando a obsessão por talentos vira um pesadelo

A gestão de talentos tem se tornado uma preocupação cada vez maior para as organizações. A ideia de que a identificação de profissionais excepcionais é um fator crítico para o sucesso das empresas tem sido difundida pelos profissionais de gestão de pessoas e acolhida por líderes empresariais.

No entanto, essa crença no talentismo, como tem sido chamada, vem sendo alvo de críticas por parte de alguns especialistas em gestão. Entre eles, destaca-se o autor Matthew Stewart, que em seu artigo “The Management Myth” faz uma crítica contundente à ideia de que a gestão de talentos é a chave para o sucesso das empresas.

De acordo com Stewart, a crença no talentismo é baseada em uma visão equivocada da natureza humana, que ignora o fato de que o desempenho de uma pessoa é influenciado por uma série de fatores, incluindo a sorte e a situação em que se encontra. Ele argumenta que a obsessão por “talentos” pode levar a uma cultura organizacional que valoriza apenas o desempenho individual, em detrimento do trabalho em equipe e da construção de relações saudáveis entre colegas.

Além disso, Stewart critica a tendência das empresas segmentarem grupos de indivíduos em detrimento da equipe como um todo, argumentando que a colaboração e a diversidade de habilidades são fundamentais para o sucesso de uma organização.

A gestão de talentos pode levar a uma competição interna prejudicial para a empresa como um todo. Isso ocorre porque, em muitos casos, os chamados “talentos” são colocados em posições de destaque, enquanto outros funcionários são deixados de lado, mesmo que possuam habilidades e competências igualmente valiosas.

A concentração de recursos nesse grupo especial também pode gerar ressentimentos internos e também favorecer um sentimento de superioridade ilusória no grupo de elite. Isso pode contribuir para aumentar a toxicidade do ambiente de trabalho. A construção de “feudos” é um dos riscos mais severos para o fortalecimento de uma cultura de equipe.

Além disso, a pressão constante para se destacar no trabalho pode levar a uma falta de equilíbrio entre vida pessoal e profissional, o que pode levar a burnout.

No entanto, a gestão de talentos pode trazer benefícios para as organizações, se for conduzida de forma adequada e equilibrada. A identificação e o desenvolvimento de talentos podem ajudar as empresas a manter uma vantagem competitiva no mercado, ao contar com profissionais altamente qualificados e inovadores. A valorização dos talentos pode aumentar a motivação e o engajamento dos funcionários. Também é uma estratégia relevante para a construção do mapa de sucessão da empresa. Mapear quais são os talentos e também refletir sobre as áreas onde a empresa não tem profissionais para ocupar posições futuras é uma ferramenta relevante para nortear as estratégias para o desenvolvimento de pessoas.

É necessário adotar uma abordagem sistêmica para o processo de gestão de talentos. Isso começa pela análise de potenciais de uma forma mais ampla, considerando performance, potencial de aprendizagem e agilidade emocional.

Esse conjunto de critérios precisa estar claro. Em organizações sem clareza de processos, o sistema de avaliação perde credibilidade.

Outro aspecto relevante para a gestão de talentos são os investimentos em educação sobre carreira, mostrando ao talento suas responsabilidades e o quanto a caminhada para construção de sua trajetória passa pela capacidade de trabalhar em grupo e contribuir para o sucesso da organização como um todo.

Esse accontability ou responsabilização na carreira é essencial para alinhar expectativas. Ser um “talento” não significa garantia de crescimento: é a sinalização de possibilidades. O desenvolvimento da carreira passará de forma inafastável pela capacidade de trazer resultados com as pessoas.

Multipotencial: talento além da especialização

As transformações aceleradas do mundo do trabalho têm desafiado padrões que até então pareciam bem determinados e inquestionáveis.

Sempre fomos encorajados a buscar a especialização em um campo específico, a fim de nos tornarmos os melhores em uma área específica. No entanto, há um grupo de pessoas que se destacam por sua multipotencialidade – a capacidade de ter múltiplos talentos em diferentes áreas.

A escritora e palestrante Emilie Wapnick popularizou o termo “multipotencialidade”.

Emilie afirma que ser um multipotencial é normal. Acredita que muitas pessoas são multipotenciais, mas não se reconhecem dessa forma porque a cultura valoriza a especialização. Ela argumenta que não há nada de errado em ter muitos interesses e habilidades diferentes, e que essa é uma forma legítima de ser.

Os talentos com multipotencialidade são aqueles que têm habilidades em várias áreas diferentes e muitas vezes têm dificuldade em escolher apenas uma carreira ou campo de atuação. São curiosos e inquietos. Eles têm uma paixão por aprender e descobrir novas coisas, o que pode torná-los valiosos em muitas situações diferentes.

No entanto, essa habilidade também pode ser vista como uma maldição em uma sociedade que valoriza a especialização. Talentos com multipotencialidades muitas vezes são definidos como sem foco e dispersivos.

Muitos talentos com multipotencialidade se sentem pressionados a escolher uma carreira e se aprofundar em um único campo, o que pode ser desafiador para eles.

Multipotenciais precisam de mais tempo para explorar seus interesses e habilidades.

Podem ter carreiras não convencionais, explorando novos formatos, trabalhando em projetos e iniciativas que envolvam atividades conectando diversas áreas de uma organização.

Os multipotencias são adaptáveis. A escritora Bárbara Sher, no livro “Refuse to choose” – recuse a escolher, chama esses indivíduos de “scanners”. São pessoas que aprendem rápido e precisam de desafios para se sentirem estimulados.

As empresas podem se beneficiar muito ao contratar profissionais com multipotencialidade, pois essas pessoas geralmente têm uma ampla variedade de habilidades e interesses, o que pode contribuir para a inovação e a diversificação de suas equipes.

As chamadas carreiras não lineares são o verdadeiro parque de diversões para o multipotencial. As arquiteturas de trabalho que permitem ao profissional navegar dentro da organização transitando entre áreas e contribuindo em diversas atividades acelera demandas de negócio e é a melhor forma de aproveitar a multiplicidade de pontos de contribuição.

Pessoas com multipotencialidade são geralmente criativas. As empresas podem estimular a criatividade desses profissionais, oferecendo-lhes espaço para inovar, experimentar e contribuir com novas ideias.

Esses profissionais são geralmente intraempreendedores.

Profissionais com multipotencialidade podem ter ideias inovadoras e empreendedoras. As empresas podem incentivar esse comportamento, oferecendo espaço para que possam explorar suas ideias e projetos. Essa abordagem pode levar a novos produtos, serviços ou soluções.

Em resumo, as empresas podem aproveitar os profissionais com multipotencialidade, oferecendo-lhes tarefas variadas, espaço para inovar, oportunidades de aprendizagem, incentivos ao empreendedorismo interno e fomentando a colaboração. Isso não só ajudará a reter esses profissionais talentosos, mas também pode levar a um ambiente criativo e inovador.

Num mercado cada vez mais competitivo saber identificar, desenvolver e engajar multipotenciais será um grande diferencial.  Ao invés de tentar encaixá-lo no antigo modelo linear e especializado é essencial permitir que esse talento flua na organização, construindo um ambiente mais diverso e inclusivo.

Como manter sua competitividade no longo prazo

O termo ambidestria organizacional não é novo. Surgiu há mais de 30 anos e foi descrito por Robert Duncan como uma característica essencial para as empresas. Uma organização ambidestra é aquela que dedica tempo para aumentar sua eficiência operacional e também consegue colocar energia na exploração de ideias disruptivas e transformadoras. Significa cultivar em equilíbrio a sobrevivência no curto prazo com iniciativas que permitam a empresa se manter competitiva no longo prazo. É comum que as lideranças queiram fazer escolhas e priorizar iniciativas de explotação (refinamento das atividades operacionais) ou exploração (buscando inovações e descobertas). A ambidestria é a arte de fazer as duas.

O conceito de ambidestria também traz reflexões importantes na gestão da carreira. Num mercado de trabalho cada vez mais exigente e em transformação acentuada ser ambidestro é fundamental. Um profissional ambidestro é aquele que adota a postura de aprendiz permanente. É o chamado modelo mental de aprendizagem.

A ambidestria pode ser aplicada na gestão de carreira permitindo que o profissional se adapte às mudanças rápidas do mercado de trabalho e também explore possibilidades de se manter atrativo no longo prazo.

Ser ambidestro na carreira significa adotar uma postura de aprendizagem e evolução.Usando as definições de ambidestria, temos várias aplicações na condução da estratégia de desenvolvimento profissional.

A primeira é identificar habilidades técnicas e comportamentais que precisam ser reforçadas para manter a competitividade da carreira. Essa visão de reforço da chamada área foco (core) da carreira é essencial. No conceito de ambidestria significa a explotação. Nela, o objetivo é melhorar o nível das atividades atuais. O protagonista na carreira é aquele capaz de definir ações para desenvolver essas habilidades. Feedbacks e avaliações de desempenho são ótimas ferramentas para provocar reflexões sobre pontos de melhoria.

A base de uma carreira sólida está na busca de melhorias e numa entrega consistente de resultados.

Já as iniciativas de exploração na carreira significam observar tendências e buscar inovações. O profissional ambidestro é aquele que se posiciona como um explorador. Para isso, a curiosidade é fundamental. Para inovar é preciso ter uma atitude inquieta para mapear tendências e oportunidades. Pode significar fazer um curso para incorporar algo novo na carreira, como também participar de um projeto para desenvolver um conhecimento. Todas as áreas se transformam. Identificar tendências e buscar se conectar com as iniciativas disruptivas é uma competência essencial para o profissional contemporâneo.

O que há de novo na minha área? O que está vindo pela frente? Quais são as tendências da minha área? O que outras áreas estão fazendo que podem ser inspirações para o meu trabalho? Existem outras áreas que podem ser interessantes considerando uma mudança de carreira? Essas são algumas perguntas para incentivar a exploração.

O networking é uma fonte rica para busca de informações sobre tendências e inovações.

Também faz parte da ideia de exploração na carreira a observação de fontes alternativas de trabalho e mudanças de carreira. O profissional ambidestro é capaz de construir novas formas de contribuir no mercado. Mesmo que não as execute no curto prazo. O emprego não é a única alternativa. A exploração de um conjunto de atividades é fundamental para o profissional contemporâneo. Seja na atividade docente, empreendedorismo, consultoria, atividade interina, entre tantas novas formas de trabalho.

Protagonismo e ambidestria profissional andam juntos. Construir cenários de carreira e dedicar tempo na análise das melhorias incrementais e na busca do novo são atitudes decisivas na condução da carreira.

Recrutamento interno ganha mais transparência nas empresas, diz pesquisa

Funcionários estão mais cientes das movimentações de carreira, mas ainda falta estímulo da liderança – saiba como ganhar espaço na companhia

Em um momento marcado por mudanças nos modelos de trabalho, competição acirrada por talentos e novas demandas dos profissionais para permanecerem nas companhias, as possibilidades de movimentações internas e as ações de relacionamento das lideranças ganham mais destaque. É o que mostra pesquisa realizada pela Produtive e obtida com exclusividade pelo Valor.

O estudo, feito com 356 funcionários – de analistas a diretores –, revela que 62,6% percebem que a empresa dá abertura para que diálogos sobre movimentações internas aconteçam, e 78,4% conhecem os processos de recrutamento interno. Isso quer dizer que as organizações estão se mostrando mais abertas a isso. A ideia é ampliar o engajamento e encontra espaços para os novos interesses de carreira que surgem a cada novo ciclo dos colaboradores e do negócio.

“A autonomia, a liberdade e a experimentação são características de ambientes em que as pessoas querem, de fato, estar”, explica Rafael Souto, presidente da Produtive. De acordo com ele, quanto maior o encorajamento dado aos colaboradores, maior será o engajamento e a produtividade.

No entanto, apesar de os dados indicarem boa transparência por parte das empresas em relação aos processos e estratégias de transições internas, Souto chama a atenção para o encorajamento dado pela liderança para a exploração de oportunidades internas de carreira. A pesquisa aponta que 47,8% dos funcionários ainda não se sentem encorajados por seus gestores, sendo que 93,3% deles consideram importante ter diálogos frequentes sobre carreira.

“A abertura do líder à leitura das expectativas, anseios e interesses dos colaboradores é essencial para a construção do portfólio de experiências de carreira”, diz Souto.

Ele explica que o movimento em direção a um maior protagonismo de carreira por parte dos funcionários é evidente, porém, gestores e RHs devem ser os facilitadores desta atitude. “Para atrair, desenvolver e manter talentos é preciso personalizar a experiência, e os líderes devem dialogar para conhecer os anseios e expectativas de carreira da equipe”.

Veja a seguir algumas recomendações da Produtive para os funcionários ampliarem as chances de movimentações na empresa:

1 – Explore e conheça as ferramentas de desenvolvimento pessoal e de carreira que a organização oferece.

2 – Identifique seus objetivos e metas por meio de processos de autoconhecimento.

3 – Desenvolva os 4cs da adaptabilidade: consideração, curiosidade, confiança e controle. Ter alta adaptabilidade é essencial para lidar com as mudanças no trabalho. Significa considerar o que vem pela frente, estar aberto a novos conhecimentos sobre si mesmo e sobre as oportunidades, ter senso de que é responsável pelo desenvolvimento de sua carreira e estar disposto a enfrentar os obstáculos que surgirem.

4 – Fique atento às oportunidades internas e crie espaços de conversa com sua liderança.

5 – Solicite feedback ao seu gestor imediato sobre sua atuação e sobre oportunidades de desenvolvimento de carreira.

 

 

 

 

 

 

 

 

Como planejar a sucessão no novo mundo de trabalho

A continuidade de uma empresa depende de sua capacidade de formar pessoas. Basta analisar as empresas mais bem-sucedidas para concluir que um dos aspectos centrais da perenidade dos negócios está na sucessão planejada como um processo e não um evento isolado.

O tema de sucessão não é novo. É uma agenda presente na pauta da gestão há anos.

Porém, a evolução do mundo trabalho trouxe novas reflexões sobre o assunto.

A principal mudança é que durante o século passado as relações de trabalho eram de longo prazo. Os indivíduos ingressavam numa organização para fazer a carreira. O plano era elaborado pela empresa e as pessoas seguiam um caminho sequencial previsível. Para a maior parte das posições a preparação de novos profissionais era organizada pelo decurso do tempo. Com isso, a discussão mais relevante ficava nas posições de CEO e demais cargos de alta gestão. Em muitos casos, o desafio era preparar a transição de gerações em empresas familiares.

O mundo do trabalho mudou. O tempo médio de permanência caiu drasticamente e as pessoas não parecem tão interessadas em fidelidade. Querem espaços para crescer e estão mais atentas ao mercado. Ficam na empresa que oferecer mais possibilidades e querem realizar seus projetos de vida. Nesse cenário a sucessão ganha outro contorno.

O ponto de partida está na construção de uma visão sobre o tema. A sucessão precisa ser entendida como um desafio de todos os gestores. Escolher alguns níveis e posições mais críticas para dedicar energia pode ser uma estratégia. Mas, a filosofia de formar pessoas precisa estar nas atividades prioritárias da liderança.

Mapear talentos começa pela identificação dos interesses de carreira das pessoas. Um dos riscos de inferir as intenções dos profissionais é criar um mapa de sucessão “fake news”. Construir um plano baseado no que a empresa avalia é uma forma antiga de conduzir as carreiras. O mundo do trabalho contemporâneo exige decisões compartilhadas e não impostas. Não funciona mais de outra forma.

Outro desafio é abandonar o conceito de sucessão por cadeira e pensar em pool sucessório. Essa lógica de pensar o desenvolvimento significa planejar possibilidades de carreira e não apenas preparar para um cargo. Do ponto de vista do individuo dá liberdade de pensar alternativas de carreira de forma mais fluida. Também reduz o efeito de silo de um líder de área que quer bloquear as pessoas naquela área. Ou que se sente dono de um sucessor. Pela ótica da organização essa lógica também deixa claro que um mapa de sucessão é um conjunto de possibilidades. Não há garantia de vaga. Quando a posição surgir, a organização irá analisar as pessoas e decidir. Até lá, irá apoiar o sucessor para que se prepare e construa seu projeto de carreira na empresa.

Na mesma direção de carreiras mais fluídas, diálogos e cenário mais flexível é importante entender o conceito de potencial. Não é necessariamente aquele de maior performance. Resultados passados são relevantes, mas o futuro depende da capacidade de aprendizagem. Identificar aqueles que mais entregam resultados e também os que possuem mais agilidade para aprendizado é essencial. O talento do futuro é o mais capaz de aprender.

O processo sucessório precisa ser compreendido como uma filosofia de gestão a ser praticada pelos gestores da empresa. Não é um processo da área de recursos humanos. Precisa ser vivida pela gestão como desafio permanente e estar na pauta regular do conselho e nas reuniões de gestores.

Como afirma a referência global no tema Ram Charan, a sucessão não pode ser vivida apenas no momento de ingressar num comitê de sucessão. Precisa ser vivenciada no dia a dia. A formação das pessoas, o mapeamento de interesses de carreira e a garantia da livre movimentação dos talentos são atividades essenciais de liderança.

Iron Maiden já questionava: quem motiva o motivador?

A frase “quem motiva o motivador?” faz parte da música “tears of clown” da banda inglesa Iron Maiden, mas poderia estar fixada nas mesas das reuniões de conselho ou complementando as simpáticas frases sobre missão e valores das organizações.

Na minha jornada trabalhando com desenvolvimento de líderes observo um crescente fenômeno de sobrecarga de atividades. Os gestores que deveriam motivar suas equipes estão cada vez mais cansados e desestimulados.

Os consultores da Bain Company Chris Zook e James Allen, autores do livro A Mentalidade do Fundador, vêm alertando há algum tempo sobre os riscos desse fenômeno na gestão das empresas.

Chamam esse de processo de “overload” de atividades dos líderes. A crescente burocracia, excesso de relatórios, acúmulo de reuniões e demandas de reporte vêm determinado um naufrágio do que deveria ser o foco essencial do trabalho da liderança: apoiar e desenvolver seus times. O distanciamento de atividades essenciais do líder deixa lacunas profundas.

Esse afastamento da linha de frente atrasa o desenvolvimento de novos gestores e prejudica o processo de sucessão.

Além disso, gera um dos efeitos mais perversos que tem sido observado nos últimos anos que é o desinteresse pela carreira de liderança.

Recente estudo do professor e consultor de carreira da universidade de Harvard Gorick Ng mostrou que a maior parte dos jovens não tem mais interesse em posições de liderança. No livro “Unsponken Rules” algo como “as regras não ditas”, trata das novas questões sobre decisões de carreira. Em síntese, relata como os novos profissionais estão mais atentos ao equilíbrio de vida pessoal e trabalho. Além disso, um ponto crucial é que esses novos profissionais querem ver sentido e eficácia no trabalho. Não querem participar de projetos em que o desgaste e incapacidade de realizar as atividades dominam o cenário.

Não se sentem motivados a participar desse jogo de missão impossível e não trocam sua vida por um conjunto de reuniões infrutíferas e uma qualidade de vida duvidosa.

Essa nova configuração nas relações de trabalho em que os indivíduos passam a tomar decisões de carreira numa direção diferente do que crescer a qualquer custo ganhou força a partir de 2020 e foi chamada de A Grande Renúncia. Uma onda de pedidos de demissão decorrentes da ideia de mudar a carreira em busca de maior equilíbrio.

Todos esses aspectos ganham um contorno dramático num cenário de hiper competição por talentos. Contratar e manter bons profissionais tem sido um desafio crescente. Estima-se que hoje no Brasil existam mais de 800 mil vagas abertas e que não são preenchidas por falta de qualificação. Faltam pessoas qualificadas. Isso torna cada vez mais complexo o desafio de engajar.

Líderes sobrecarregados e hiper competição por talentos formam uma equação explosiva.

Como diz o célebre Ram Charan, o gestor orientado a pessoas precisa ter agenda e dedicar tempo ao desenvolvimento. Essas conversas regulares de feedback e desenvolvimento são essenciais.

Chris Zook, da Bain, afirma que líderes assoberbados estão cada vez mais distantes do seu trabalho primordial. Basta olhar a agenda semanal de um líder e ver a distribuição do tempo. O foco em pessoas é cada vez menor.

Estamos na era da personalização do trabalho. É tempo de revisitarmos as prioridades e discutirmos a essência da missão da liderança.

Não revisar isso nos colocará na árdua missão de engajar pessoas com as armas erradas, nos restando ficar questionando e monitorando os pedidos de demissão.