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O estranho íntimo e a nova agenda de employee experience

Durante muito tempo, o foco das lideranças estava em conhecer bem o trabalho e as entregas da sua equipe. E só. Um executivo, uma vez, me confessou que estava há 20 anos trabalhando na mesma empresa, uma multinacional de grande porte, sem que nenhum dos seus líderes tivesse perguntado, em algum momento daquelas duas décadas, quais eram os seus interesses de carreira. 

Outro caso que ilustra bem a realidade do estranho íntimo na equipe é o de uma bem-sucedida executiva do Rio de Janeiro. Ao receber em sua casa um diretor que viera de São Paulo exclusivamente para anunciar a sua promoção,  que resultaria na transferência para a capital paulista, colocou a mão na cabeça respondeu: “minha mãe está muito doente, este é, sem dúvida, o pior momento da minha vida para uma mudança de cidade.”

 Nenhum dos seus líderes sequer sabia do grave problema de saúde  da mãe desta funcionária. Suas entregas eram impecáveis, quem poderia imaginar? “Enquanto se trabalha, se vive uma vida”. Essa célebre frase é do grande pesquisador e escritor, Donald Super e poderia ser a resposta perfeita para uma situação dessa natureza. 

A lógica de separação entre a vida pessoal e profissional não faz mais sentido. Mais do que conhecer as entregas, é preciso entender o contexto, o desenho de vida das pessoas. Tudo está conectado.

Como disse o professor da Ross School of Business da Universidade de Michigan e autor Dave Ulrich em um dos seus artigos mais recentes no LinkedIn, cuidar de pessoas é um princípio atemporal. A experiência positiva do funcionário é crucial para o sucesso da organização. Ulrich é uma das maiores referências mundiais em recursos humanos e defensor da personalização como a próxima agenda de employee experience. É a personalização que permite aos funcionários definir e alcançar seus objetivos pessoais de maneiras que funcionem para eles. 

O líder desenvolvedor é aquele que ajuda o liderado a entender o que funciona como trajetória de desenvolvimento a partir de uma definição individual de sucesso. Para chegar a essa resposta, o professor indica que cada um deve navegar por quatro paradoxos essenciais:cuidar de si mesmo e servir aos outros, autonomia e responsabilidade, cuidado e competição, e estabilidade e mudança/agilidade. Uma experiência positiva e de personalização é fruto de uma abordagem equilibrada entre esses elementos divergentes.

Os paradoxos representam desafios intrincados e multifacetados que os funcionários enfrentam no ambiente de trabalho. A habilidade de navegar com sucesso por eles é fundamental para o crescimento e a satisfação dos funcionários, bem como para o sucesso geral da organização. 

O papel crucial do líder é facilitar o processo de navegação. Eles têm a responsabilidade de criar um ambiente que permita aos funcionários lidar com os paradoxos de forma saudável e eficaz.

Encontrar o equilíbrio entre se dedicar ao trabalho para alcançar o sucesso profissional e reservar tempo para a vida pessoal e o bem-estar é um dos mais clássicos paradoxos e sabidamente é sofre variações de acordo com o contexto e desenho de vida de uma pessoa, como confirmou o caso da executiva do Rio de Janeiro. 

Não há como personalizar sem compreender mais da equipe. A grande arte é entender que o líder não é um psicólogo, mas precisa conhecer os interesses e o momento de vida para personalizar.  Muitas vezes, o líder entende que esse não é o papel dele, tem medo de ser invasivo, ou está sobrecarregado com os detalhes operacionais. Os desafios e dificuldades para adaptar a experiência do funcionário às necessidades e objetivos individuais existem e vão continuar, mas investir mais tempo na vinculação é o caminho para cuidar das pessoas.

Não basta apenas ser bom tecnicamente: os pilares de uma carreira de sucesso

O que é carreira pra você? Pra mim é uma construção diária que envolve muitos aspectos. Tem a ver com cada trabalho que você realizou, com sua dedicação e comprometimento de entregar o melhor que pode, claro, essa é a base.

Mas também tem relação com a forma de ver as pessoas ao seu redor, com as relações que constrói. Porque você pode ser muito bom tecnicamente, mas sem olhar os outros não chega muito longe. Sem o tal networking, mas aquele de mão dupla, se perde no seu próprio ego.

Não estou falando de colecionar “cartões corporativos”. Estou falando de criar relacionamentos recíprocos e genuínos, em agir sem pensar no que o outro pode te dar, em estar disposto a contribuir para uma rede maior.

Sempre prezei isso! Sempre fiz questão de olhar as pessoas, de criar laços, de colaborar e não competir, mesmo ouvindo que não chegaria “lá” sem ser competitiva, sendo amiga dos meus colegas de trabalho. O voo do outro me alegra e, de certa forma, também me faz voar.

Tenho certeza que boa parte do que conquistei até aqui tem a ver com esse jeito de pensar na carreira. Muitos dos profissionais com quem trabalhei, aliás, são meus amigos hoje. Gosto de dividir, de somar, de compartilhar. A vida é melhor assim. E isso nos leva mais longe.

Nos meus 20 anos de carreira, muitas pessoas (jornalistas, fontes, RPs) me indicaram para projetos, pensaram em mim quando surgiu uma vaga.

A oportunidade de escrever para o Economia SP é um exemplo. A jornalista Beatriz Bevilaqua, também colunista deste portal, me indicou para Ana Paula Dahlke, fundadora e editora-chefe. E olha que ponte bacana. Trocamos conhecimento, nos ajudamos e crescemos.

O norte-americano Mark Savickas, especializado em orientação e aconselhamento vocacional e autor do livro “Career Counseling”, diz que carreiras não surgem, são construídas.

“Quanto mais conhecemos e nos relacionamos com diferentes grupos, mais oportunidades surgem. De nada adianta ter habilidades técnicas, se você não souber se relacionar, preservar os contatos e expandir constantemente a rede”, explica Rafael Souto, presidente da Produtive.

Segundo ele, não é mais possível trabalhar como se estivéssemos numa bolha, sem se interessar pela área ou o colega ao lado.

Mas, como reforcei no início deste texto, não é só colecionar nomes numa lista e buscar as pessoas apenas quando precisa de algo.

“Falamos hoje em conectividade, que funciona como uma roda que articula interesses e estimula encontros entre pessoas. A premissa está em impulsionar a rede de modo coletivo. As demandas individuais devem estar inseridas nessa roda de ações, mas não podem ser o único motivador. Quando busco informações, também as entrego. Se sou procurado, também ajudo”, ressalta.

Veja, a seguir, outros pilares importantes para a construção de uma carreira bem-sucedida, segundo Rafael:

1. Satisfação e propósito

Este pilar está relacionado ao grau de identificação com seus objetivos profissionais, a área e os valores de trabalho.

Rafael explica que a satisfação é construída a partir dos significados que as escolhas e decisões profissionais têm para você:
“Nossa história de carreira tem sentido quando é construída com consciência e planejamento, quando identificamos as oportunidades e as perseguimos”.

De acordo com ele, saber o que você quer, ou seja, seus sonhos e objetivos, é o primeiro passo para o bem-estar e a percepção de sucesso na vida.

Nesse sentido, é importante mapear quais atividades te interessam, o que não gosta e o que gosta de fazer, e em quais áreas investir para se desenvolver e ter satisfação no que faz:
“Não existe mais a regra de que devemos seguir uma trilha de carreira e que o sucesso é ser um líder, por exemplo. A satisfação é definida por você”.

2. Saúde física e emocional

Diz respeito a sua capacidade de manter o equilíbrio entre corpo e mente.

“Somos um sistema integrado, no qual um pilar alimenta e desenvolve o outro. Cuidar da saúde envolve buscar equilíbrios: entre trabalho e lazer, obrigação e diversão, ocupação e tempo livre”, afirma Rafael.

Isso porque, a saúde física e emocional está diretamente ligada ao trabalho.

“No passado havia uma separação, como se tivéssemos que virar uma chave: vida pessoal lá fora e trabalho na empresa. Hoje, esses pilares estão integrados no que chamamos de life design, ou desenho de vida, a integração de todos os papéis que temos”, diz.

De um lado, os líderes precisam olhar o profissional além do trabalho, de outro, você deve entender a importância de cuidar do corpo e da mente, evitando excessos e prestando atenção quando algo não vai bem.

3. Finanças

Este pilar está relacionado à capacidade de administrar seus recursos, por meio do controle de gastos, reservas e investimentos.

“Dificuldades financeiras, assim como as familiares, contaminam o desempenho profissional e têm impacto direto em outros pilares como saúde, competitividade e idoneidade”, explica Rafael.

Não se trata de algo fácil, mas fundamental para dar sustentação à carreira.

“Quem tem um bom equilíbrio nessa área consegue fazer investimentos e escolhas, ter mais produtividade e autonomia no trabalho e na vida pessoal”, complementa Rafael.

Ele sugere algumas reflexões: O que você gostaria de fazer hoje em relação às suas finanças que ainda não consegue? Quais ações ou comportamentos pode modificar para planejar e gerir melhor as suas finanças?

4. Reputação

A reputação tem a ver com a ética profissional, creditando o valor “segurança” aos olhos dos outros.

“Devemos ser íntegros, confiáveis, corretos e comprometidos”, explica Rafael.

Além disso, a está ligada aos seus comportamentos: como se comunica e responde a um email, o que costuma postar nas redes sociais, de que forma trata as pessoas, se tem disposição de ajudar, se costuma inspirar seus colegas, entre outros pontos.

“Muitos ainda pensam que cuidar da reputação é fazer marketing excessivo e ficar dizendo o que o chefe quer ouvir, mas não é isso. Trata-se de se preocupar com sua imagem, pois sabemos que boa parte das decisões, como promoções ou desligamentos, acontece em função de como você é visto. A reputação pode impulsionar ou destruir uma carreira”, ressalta.

5. Competitividade

Está ligada à educação (formação acadêmica, idiomas, leituras complementares), à estrutura da carreira (empresas, experiências profissionais e salários atingidos) e ao acompanhamento do panorama atual e tendências de mercado.

Rafael usa um exemplo muito interessante para explicar este pilar, o da letra T. Na linha vertical, temos o core, que significa área foco de um profissional, como RH, finanças, operações.

Nesse ponto há, ainda, as subatividades de uma área, como em RH que temos recrutamento e seleção, e desenvolvimento. Já a linha horizontal é a visão global do negócio, os outros setores que não estão no seu core.

“Se estou em vendas, meu core é a área comercial, e a visão global são os outros setores, como RH, finanças, operações. É esse equilíbrio entre foco e visão global que determina a competitividade”, diz.

Layoff: entenda como o RH deve agir durante os processos de demissão

Em um momento em que a preocupação com layoffs ganha cada vez mais destaque na imprensa e funcionários do mundo todo ficam apreensivos com as demissões, não é demais dizer que a pressão sobre o departamento de recursos humanos cresce junto.

Se as demissões em massa são inevitáveis, o foco de quem cuida de pessoas nas organizações se amplia. Além do offboarding em si, é necessário pensar em como apoiar os ex-colaboradores a encontrarem uma recolocação no mercado, ou seja, investir também em um plano efetivo de outplacement.

A conduta da corporação com quem vai e com quem permanece em seu quadro será determinante para seu sucesso futuro, diz Emanuella Velez, consultora de RH e top voice Linkedin. “Ao demitir, é preciso tratar com respeito. Caso contrário, haverá impacto em outros aspectos, como atração e retenção de talentos em seus times”, avalia.

O que é layoff?

Se originalmente, a tradução de layoff está relacionada à suspensão de funcionários por alguns meses, com salários reduzidos ou até mesmo sem remuneração, o termo vem sendo empregado quando se trata da prática de demissões em massa nas empresas.

Na forma mais usada atualmente, layoff engloba todo o processo: estratégia de comunicação, etapas de desligamento, processo burocrático do desligamento; recolhimento de equipamentos, pagamento de rescisão e suporte por período determinado para encontrar uma recolocação no mercado, também conhecido como outplacement.

Desde 2020, ondas de layoff vêm crescendo em um setor raramente associado a crises, como o de tecnologia. A partir do começo da pandemia, quando a digitalização do trabalho tomou mais corpo, 1.388 companhias de tech praticaram cortes. De março de 2020 até agora, 233.483 pessoas, no mundo inteiro, saíram nessas demissões, segundo dados do site Layoffs.

Comunicação é fundamental

Ainda é muito comum nas empresas informações sobre crises ficarem restritas a líderes, sendo repassada de forma truncada aos funcionários. Segundo Emanuella, se as resoluções não chegam a todos, os colaboradores vão sendo impactados de forma velada e sentindo o clima mudar instintivamente. “Muitas vezes nem vai haver um layoff, mas uma mudança de estratégia. Porém, o estrago já foi feito”, explica a especialista.

Ao primeiro sinal de crise, a comunicação clara é fundamental para a equipe não desanimar. “Sempre que houver qualquer mudança, o RH deve atuar com os líderes na criação de estratégias que visem a transparência.

Desenhar um plano de ação, destacar os impactos do que está por vir. Se o gestor comunica o que está acontecendo, colocando-se à disposição para tirar dúvidas, evitará que se instale a ‘rádio peão’. Uma informação errada pode estragar todo o processo”, diz Emanuella. Comunicação  é fundamental para criar um layoff estratégico e sem traumas.

O desafio do layoff no trabalho remoto

Com tantas empresas atuando em regime flexíveis, como híbrido e home office, demissões têm sido um novo desafio: como manter a proximidade, a empatia e a escuta ativa quando boa parte dos colaboradores trabalha à distância – até mesmo em outras cidades?

Para Rafael Souto, CEO da Produtive, a perda de qualidade da comunicação neste modelo é inevitável, pois é impossível perceber os sinais emocionais da reação do colaborador, mas não há justificativa para encurtar o processo de demissão.

“Muitos líderes consideram que, por ser remoto, o desligamento pode ser feito de maneira mais rápida. Mas, não. A única diferença será o meio de comunicação. Deve acontecer em uma videochamada, para que o líder veja o colaborador e o colaborador veja o líder.”

E se for preciso fazer uma demissão em massa virtualmente? Os cuidados com o planejamento e a comunicação devem ser redobrados para minimizar o mal-estar geral, diz Emanuella. “Com a tecnologia, as pessoas tendem a simplificar demais. Mas não basta disparar um e-mail anunciando o ocorrido”, analisa.

Vale lembrar também que um corte em massa não deixa de ser um processo individual. “Pode haver inicialmente uma conferência virtual com todos os funcionários para explicar o momento que a empresa vive e que infelizmente alguns desligamentos terão de acontecer por tais e tais motivos, ainda assim é preciso depois conversar individualmente com cada um que vai sair. É fundamental explicar o motivo da saída sempre”, afirma Christine Da Silva-Schröeder, professora da área de gestão de pessoas da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul) e top voice no Linkedin.

Separamos abaixo dicas dos especialistas de como a área de gestão de pessoas pode criar um processo de desligamento transparente e seguro para empresa e colaboradores:

Dicas para um layoff estratégico:

  1. Incluir gestores para traçar o plano mais adequado para cada equipe;
  2. Criar estratégia com os gestores para offboarding, logoff e outplacement;
  3. Reunir todas as informações que serão comunicadas a todos os funcionários;
  4. Comunicar toda a empresa de forma transparente e objetiva;
  5. Treinar gestores para comunicarem especificamente as equipes afetadas;
  6. Gestores e RH devem em conjunto demitir individualmente cada colaborador, em uma conversa acolhedora e respeitosa. E apresentar o motivo do desligamento de forma honesta e transparente, tendo ou não relação com a performance;
  7. Ser empático, ouvir e responder a todas as dúvidas e dores de quem está sendo desligado;
  8. Explicar de forma detalhada os próximos passos que virão;
  9. Dar tempo para o demitido processar a notícia, organizar seus arquivos no computador, se despedir dos colegas e coletar seus pertences;
  10. Acompanhar o processo de desligamento até a saída do funcionário da empresa;
  11. Colocar-se à disposição mesmo depois do desligamento;
  12. Colocar-se à disposição também dos colaboradores que permanecem para esclarecer quaisquer dúvidas;
  13. Reestruturar os times afetados para que quem ficou não seja sobrecarregado ao acumular funções.

O que é outplacement

A responsabilidade de uma empresa para com seu ex-colaborador não termina com o processo de offboarding baixa na carteira de trabalho, assinatura de encerramento de contrato, pagamento de rescisão e demais obrigações legais.

Pensando no aspecto social (o S do ESG), dar suporte financeiro, técnico e emocional ao colaborador que acaba de sair se tornou parte do processo chamado outplacement e é mais uma etapa dentro de um layoff estratégico.

Estender plano de saúde, auxílio creche e vale alimentação; disponibilizar a equipe de RH para montar currículos competitivos e simular entrevistas de emprego como forma de treinamento são algumas das práticas mais comuns.

“Acredito que a corporação deve também acolher esses seus ex-profissionais, criando grupos de apoio, entrando em contato com seus fornecedores e parceiros para recomendá-los para vagas. São ações de menor custo, mas maior impacto”, pontua Christine Da Silva-Schröeder, professora de gestão de pessoas.

Layoff e burnout

Para Rafael Souto, CEO da Produtive e especialista em carreiras, durante uma recessão, o RH deve redobrar a atenção e monitorar o clima organizacional para intervir se necessário.

“O cuidado com a saúde física e mental é uma responsabilidade da organização, e é preciso que a empresa atue para a criação de um ambiente com segurança psicológica, em que as pessoas se sintam confortáveis para dizer o que pensam e o como se sentem em relação ao dia a dia de trabalho”, explica Souto.

Condição especificamente associada ao trabalho, o burnout deve ser combatido com uma estratégia que envolva toda a empresa, afirma Christine. “Quem fica na empresa após o layoff pode passar a trabalhar por três. Para evitar isso, a empresa deve melhorar seus processos, rever fluxos e ser mais eficiente, evitando sobrecarga, insegurança e pressão.”

Que profissões estão em alta por causa do ESG? Salários chegam a R$ 28 mil

Especialistas são unânimes ao afirmar que o futuro será sombrio para empresas que não se preocupam com o meio ambiente, com as pessoas e com a ética de seus processos – três valores sumarizados na sigla ESG (abreviação em inglês para “Ambiental, Social e Governança”).

Mas esse novo modelo de gestão não tem um impacto positivo apenas para o mundo: ele também está aquecendo o mercado de trabalho para profissionais de diversas áreas.

De acordo com especialistas, um gerente executivo de ESG recebe, em média, R$ 28 mil mensais – motivada, em parte, pela escassez de mão-de-obra no setor. Essa é uma das principais barreiras para implementar esse tipo de gestão, segundo 55% das empresas pesquisadas pelo Guia Salarial 2023 da Robert Half (uma das maiores empresas de recrutamento do mundo).

“Entre 2019 e 2022, triplicamos as contratações para ESG, seja em posições ligadas à temática ou com essa nomenclatura propriamente dita”, conta Ricardo Welikson, sócio da EXEC, consultoria de recursos humanos especializada em seleção e desenvolvimento de executivos e conselheiros.

“Notamos tanto o apetite de contratação por parte das empresas quanto o aumento no número de profissionais querendo se especializar para estar à frente de uma posição ESG”, confirma Ana Carla Guimarães, diretora de negócios da Robert Half.

Até mesmo um novo cargo tem aparecido com mais frequência nas empresas, o de Chief ESG Officer. É ele o responsável pela gestão da estratégia de sustentabilidade corporativa, avalia riscos e oportunidades e dá suporte à comunicação entre todos os stakeholders (partes impactadas pela atividade de uma empresa).

Outra boa notícia é que área de ESG oferece muitas possibilidades, já que é relevante em praticamente todos os segmentos do mercado, de bancos e fundos de investimento a bens de consumo, passando por energia, logística, saúde e tecnologia.

Empresas buscam experiência e soft skills

A relevância cada vez maior do tema é a principal explicação para a crescente demanda por profissionais para atuar na área. Mas também há uma outra: embora os temas envolvidos sejam velhos conhecidos das empresas, a área de ESG é relativamente nova, e são poucas as pessoas capacitadas nos três pilares da sigla.

Para ajudar a suprir essa carência, já começam a surgir cursos livres e de pós-graduação mais generalistas. Mas, por enquanto, o que mais conta é ter experiência na área.

As empresas valorizam ainda soft skills como capacidade de articulação e persuasão, dinamismo, facilidade de relacionamento, habilidade política e resiliência. Mas Rafael Souto, especialista em carreira e sócio-fundador da consultoria Produtive, prefere chamá-las de power skills. “Afinal, trata-se de uma pauta que gera impacto, desconforto e questionamentos e lida com questões que demoram para mudar e têm impactos de longo prazo.”

“Também busco pessoas que tenham os valores do ESG como um propósito de vida”, diz Paulo Dias, diretor executivo da empresa de recrutamento Page Group.

Esse, aliás, é um dos principais fatores que motivam a atuação na área. Na edição deste ano do Workmonitor, estudo global da consultoria Randstad com mais de 30 mil trabalhadores de 34 países, quase metade dos entrevistados brasileiros disseram não aceitar atuar em uma empresa que não estivesse alinhada com os seus valores.

Para as gerações mais jovens, temas relacionados, como diversidade e inclusão, também são prioridade. Cerca de 49% da geração Z e 46% dos millennials disseram que não gostariam de trabalhar para uma empresa que não fizesse esforços nessas áreas.

“Esses dados comprovam que os profissionais, principalmente os mais jovens, querem carreiras que tragam bem-estar e que as entregas do dia a dia tenham propósito”, afirma Priscila Magalhães Eleutério, gerente de recrutamento e seleção da divisão de Technologies da Randstad Brasil.

“As empresas que entendem isso garantem aumento da produtividade, redução do turnover e maior engajamento dos colaboradores – e esse é exatamente o papel do profissional de ESG”, afirma a executiva.

Enquanto o mercado se especializa no assunto, as empresas correm para fazer seus diagnósticos e corrigir suas falhas, tarefa que demanda profissionais técnicos. Confira a seguir as áreas que ficam em alta com o boom do ESG.

Administração de negócios e engenharia

“Administradores e engenheiros formam grande parte dos profissionais envolvidos em ESG por conta de sua visão do impacto dessas ações nos resultados dos negócios”, acredita Lina Nakata, professora da FIA Business School. “Profissionais de outras áreas que enxergarem isso também terão mais sucesso.”

Ambiental

Engenheiros ambientais, químicos, físicos, ecólogos e especializados em gestão ambiental ganham espaço pela importância crescente de ações de sustentabilidade, decorrentes dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU).

Financeiro

Esses profissionais são os principais responsáveis por ajudar as empresas a conquistar certificações responsabilidade ambiental e social, que trazem benefícios financeiros e fiscais. A área financeira também atua com transparência de processos e contratos, ética e prestação de contas a acionistas.

Jurídico

Advogados especializados em compliance lidam com questões fundamentais para a boa governança de uma empresa, como leis anticorrupção e de proteção de dados.

Logística

São os profissionais capacitados para analisar toda a cadeia de uma empresa e fornecer diagnósticos sobre origem de matéria-prima, tratamento de dejetos, uso de combustíveis fósseis. São fundamentais para mapear a pegada de carbono.

Marketing e Comunicação

Garante que as políticas da empresa sejam transmitidas não só aos funcionários e outros stakeholders, mas também à sociedade.

Recursos Humanos

Lida com o S da sigla, já que atua em prol da diversidade e inclusão, igualdade de oportunidades, melhores condições de trabalho e, muitas vezes, com ações junto à comunidade.

Tecnologia

Além de desenvolverem produtos e outras inovações que gerem menor impacto ambiental, os profissionais de TI têm papel importante em questões de governança corporativa. Sistemas de ERP (software de planejamento de recursos empresariais), por exemplo, precisam segui-la e são desenvolvidos com base em riscos e impactos dentro da estrutura da empresa.

“Elon Musk dá uma aula sobre como não se deve demitir”, diz especialista

Consultor e especialista em outplacement diz que caso segue a lógica de liderança ‘comando e controle’ e vai na contramão do que mercado discute sobre demissões mais responsáveis

Ontem, o Twitter sinalizou aos funcionários de todo o mundo que uma parte da equipe seria demitida. Informações divulgadas na imprensa internacional indicam que o plano é eliminar até 3,7 mil empregos – metade da força de trabalho da empresa. As pessoas saberiam se ficariam, ou não, na empresa, se recebessem uma mensagem em suas contas de e-mail pessoais. Na madrugada desta sexta-feira, parte dos 150 funcionários da subsidiária brasileira do Twitter tiveram seus computadores de trabalho bloqueados e receberam um e-mail em suas contas pessoais informando que seus cargos não eram mais necessários, informou o Valor.

Para Rafael Souto, CEO da consultoria Produtive, especialista em outplacement, o movimento de demissões segue uma lógica de ‘tudo que não se deve fazer’. “Estamos vendo todos uma aula de como não demitir”. Ele afirma que nesta manhã vem escutando ‘cenas lamentáveis’ de profissionais sendo demitidos sem critério e de áreas inteiras que vão parar. “É um show de horrores e vai na contramão de tudo que o mercado, no Brasil e no mundo, vem discutindo nos últimos quinze anos sobre demissões mais responsáveis, sobre maior foco em outplacement, sobre o fato de que tão importante quanto contratar e desenvolver, é cuidar do ciclo de offboarding [saída] das pessoas”.

As demissões ocorrem cerca de uma semana depois de o empresário Elon Musk ter assumido a empresa. Desde então, ele já demitiu líderes que ajudaram o Twitter a crescer, sinalizou que pretende passar a cobrar pela verificação das contas das plataformas, dissolveu o conselho da empresa e vem fazendo enquetes em sua conta pessoal na rede social para testar a popularidade de possíveis mudanças na forma de a empresa prestar serviços.

Para Souto, Musk lembra de certa forma o CEO da Better, Vishal Garg, que demitiu cerca de 1000 funcionários pelo Zoom no início deste ano. “É a mesma tônica. E eu entendo que desligamentos podem e devem ser feitos como estratégia de negócio, que uma nova gestão pode querer mudar a estrutura. Mas o grande erro é como tudo está sendo feito”. Para Souto, a decisão segue a lógica de liderança de ‘comando e controle’, que vem sendo extremamente criticada nos últimos anos – principalmente pós-impacto da pandemia.

 

 

O talento do futuro é o mais ágil para aprender

O colunista Rafael Souto escreve sobre a definição de talento no mundo atual do trabalho para as organizações entenderem como mapeiam seus potenciais

As transformações do mundo do trabalho impõem um novo olhar sobre as definições de talento e potencial humano nas organizações.

Esse tema sempre inquietou lideranças e profissionais de recursos humanos.

A hiper competição por profissionais qualificados e a crescente dificuldade de formar novas lideranças vem ampliando essa discussão.

Vivemos um paradoxo no mercado de trabalho. De um lado, quase 10 milhões de desempregados. Do outro, 800 mil vagas que não são preenchidas por falta de qualificação. Esses dados expõem um drama brasileiro e que pode também ser observado no mundo todo. Estamos na era do talenteísmo, como chama o renomado economista Marcos Troijo.

Os recursos financeiros e tecnológicos estão disponíveis e o grande elemento que fará o sucesso de qualquer organização será capacidade de atrair, desenvolver e manter os talentos.

Mas, o que é talento? Como mapear os potenciais a serem desenvolvidos na organização?

A pressão por resultados e a necessidade de sustentação dos negócios tem forçado as organizações a concentrar seus esforços num olhar sobre a performance de curto prazo.

Essa diretriz faz com que exista uma crescente dinâmica focada no “o que” e “como” um profissional entrega seus resultados. É evidente que analisar os resultados é fundamental. Mas, cada vez mais concluímos que essa análise focada no passado pode encobrir ou deixar de considerar pontos relevantes na identificação de potenciais.

Nesse sentido o conceito de agilidade de aprendizagem tem ganho espaço. O professor W. Warner Burke é um dos expoentes nos estudos sobre o learning agility (termo em inglês para a agilidade em aprender). Segundo Burke, a agilidade para aprender é a capacidade para lidar com novas experiências de maneira flexível e ágil, experimentando novos comportamentos, recebendo feedbacks das tentativas e fazendo ajustes rápidos para que novos aprendizados sejam concretizados rapidamente quando você não sabe o que fazer.

O professor Burke criou uma escala para medir essa capacidade de aprender.

Muitas organizações vêm reformulando a ideia sobre como mensurar potencial e apostando mais em identificar essa habilidade de aprender e se reinventar do que analisar resultados passados para definir o que é um talento.

A prof. Carol Dweck construiu um conceito chamado modelo mental de crescimento (do inglês growth mindset). No brilhante trabalho da Carol, ela identificou que pessoas com abertura a novas experiências e interesse em aprendizado têm um padrão de destaque. Em oposição ao modelo mental fixo, aqueles que têm interesse em aprendizagem terão mais chance de se desenvolver.

Na mesma direção, o Fórum Econômico Mundial de Davos elegeu a habilidade para aprender como um requisito fundamental para o profissional contemporâneo. É a competência chamada lifelong learning (aprendizagem para a vida toda). O emblemático líder de Alfabetização sobre Futuros da UNESCO, Riel Miller, também cita a habilidade para aprender e abertura ao novo como características essenciais no mundo pós-pandemia.

Todos esses estudos mostram que a curiosidade e a habilidade para aprender estão no centro da transformação que pode impulsar as organizações e a sociedade do futuro.

Esses ensinamentos são um alerta poderoso para que possamos investir mais tempo em incentivar a cultura de aprendizagem continua e identificar as pessoas mais curiosas e dispostas a aprender. São os mais ávidos para aprender, desaprender e inovar que ganharão mais espaço no mercado de trabalho.

As organizações que pretendem manter seu dinamismo precisarão priorizar e incentivar essa habilidade. A performance de curto prazo continua sendo relevante, mas será a prevalência de indivíduos com alta habilidade de aprendizagem que determinará o futuro da organização. O talento do futuro é o mais ágil para aprender.

“Quiet quitting”: o que quer movimento que defende a “demissão silenciosa” e como isso pode impactar negativamente a carreira

Manifestações nas redes sociais ganharam repercussão e motivaram o debate entre vida pessoal e carreira. Especialistas alertam para o prejuízo que a atitude pode causar no desenvolvimento profissional

“Trabalho não é sua vida” e “seu valor não é definido pela sua produção” são ideias defendidas pelo engenheiro de Nova York Zaid Khan, 24 anos, em um vídeo no TikTok. O material tem 3,5 milhões de visualizações e deu visibilidade ao movimento quiet quitting – em português, virou “demissão silenciosa” -, ideia que que defende a necessidade de haver equilíbrio entre o trabalho e a vida pessoal do profissional. Nesse entendimento, a pessoa cumpre apenas atividades essenciais para que não seja demitida.A discussão ganhou espaço com a “The Great Resignation” (a grande renúncia, em português), movimento dos Estados Unidos no qual jovens compartilham a saída do emprego em redes sociais.

O assunto abre discussão sobre os limites entre trabalho e vida pessoal e como as organizações devem se portar para evitar que o quadro de funcionários seja integrado por pessoas desmotivadas, conforme especialistas ouvidos por GZH.

Dano para a reputação
Rafael Souto, especialista em carreira, CEO da consultoria Produtive e fundador da Plan6 Aceleradora de Carreira, diz entender que a discussão é antiga e envolve diversos contextos: de pessoas que querem, de alguma forma, “desacelerar” no trabalho, por questões de saúde mental, por exemplo.

No entanto, unem-se a esse comportamento aqueles indivíduos que querem sair da empresa, mas que, por questões financeiras ou por falta de opção, decidem fazer “corpo mole” nas atividades e esperar por um posicionamento da organização, contextualiza o especialista:

— O indivíduo opta por uma estratégia de escolher fazer estritamente aquilo para o qual é contratado ou está forçando uma saída, fazendo o mínimo para ser demitido e não perder dinheiro? Essa estratégia não parece ser honesta e gera bastante dano para a reputação da carreira da pessoa.

Souto acrescenta que o propósito de quiet quitting é o oposto da busca que o indivíduo deve estabelecer para ter autonomia e crescer na carreira. Nesse contexto, são habilidades do profissional saber organizar a própria vida e o tempo das atividades na organização e fora dela, ter atenção à saúde mental e definir os objetivos no mercado de trabalho.

Portanto, os cuidados com essas demandas precisam partir da pessoa, que deve ser transparente com os líderes da empresa para evitar desgastes para os envolvidos.

— Se o indivíduo tem desconforto em relação à carreira, ele tem de procurar se movimentar, debater internamente uma mudança, não ficar buscando por um comportamento de não entrega para forçar a própria demissão — pontua.

O especialista comenta que as demandas da demissão silenciosa não podem ser ignoradas pelas empresas, que precisam ficar atentas aos profissionais, para identificar se a instituição não tem pavimentado um “ambiente tóxico” para todos. Por isso, ele agrega, a empresa, por meios dos responsáveis, deve colocar a comunicação na rotina do trabalho, estratégia para não criar um “exército de pessoas desengajadas”.

— O novo mundo do trabalho exige mais diálogos transparentes sobre os indivíduos, e não só sobre a rotina, a meta, o processo. Porque, assim, o líder tem uma medida do antídoto para enfrentar esse fenômeno e ajudar a pessoa. A demissão silenciosa mostra que existe hoje um buraco nos diálogos entre indivíduo e organização — finaliza.

Crítica social ao excesso de trabalho
Carmem Giongo, doutora em Psicologia Social, professora da Universidade Feevale e pesquisadora em saúde mental e trabalho, comenta que o debate da demissão silenciosa é um assunto estudado há anos. No entanto, os estudiosos usavam uma definição diferente: presenteísmo, definido como uma “forma de ausência” do funcionário no trabalho, na qual o indivíduo está no local, mas não focado às tarefas. Não há, assim, empenho ou envolvimento afetivo do indivíduo com a empresa.

Segundo a professora da Feevale, esse entendimento é parecido com a demissão silenciosa, mas há um componente novo: agrega à discussão o que a pesquisadora chama da romantização do mercado de trabalho, o que, segundo ela, é um entendimento que se impregnou na rotina da sociedade brasileira nas últimas décadas.

— Existe um movimento social de crítica à glorificação do excesso de trabalho. As pessoas se orgulhavam de ser workaholic (viciado em trabalho, em português), de trabalhar muito, de fazer muitas horas extras, estar no terceiro turno de trabalho, como se isso fosse algo com valor social, que trouxesse dignidade. Então, agora ocorre um processo de crítica à extrema doação ao trabalho — comenta.

Essa visão de mundo, de colocar a carreira frente aos assuntos pessoais e à saúde mental, foi responsável pelo desenvolvimento de quadros de ansiedade, depressão e burnout em diversos trabalhadores nos últimos anos, conforme a pesquisadora. Essas situações são observadas há anos, mas foram impulsionadas por causa da pandemia de covid-19, que exigiu a mesclagem da vida pessoal com a profissional em atividades feitas em home office, fenômeno que a professora da Feevale chama de hiperconexão.

Mas o que o trabalhador precisa fazer para não “exceder o limite” e evitar problemas de saúde? Para a pesquisadora, o indivíduo precisa, primeiro, entender que é indispensável encontrar equilíbrio entre as atividades do trabalho e a vida pessoal, para integrar à rotina da pessoa o tempo com a família, o descanso e ter tempo para se dedicar a compromissos que não têm relação com a carreira.

Qual a power skill para os RHs hoje em dia?

Em artigo de estreia para a Today, Rafael Souto comenta sobre uma super habilidade que pode ser chave para um RH inovador

A capacidade de inovação no desenho organizacional é uma das competências mais importantes para os profissionais de RH contemporâneos e requer uma boa dose de ousadia.

Essa super habilidade, essencial para o futuro do RH, demanda a coragem para propor mudança em estruturas arcaicas limitadas e pouco atrativas, porém arraigadas no modelo mental da liderança.

Houve um tempo em que o RH era encarado como um departamento operacional, quase como um “tomador de pedidos”, executor de ideias alheias. Fora da mesa da estratégia, os profissionais tinham, em média, uma atuação limitada de área de apoio.

Com as transformações no mundo do trabalho e a revolução digital, a necessidade de inovação passou a exigir uma nova atitude para os RHs não só em relação à revisão de modelos de trabalho, mas também no que diz respeito às formas de contribuição dos profissionais dentro da organização.

Levantar a bandeira da inovação e revisar estruturas tão tradicionais não é tarefa simples. O modelo hierárquico piramidal vigora há mais de uma centena de anos. E regimes presenciais fixos foram – e ainda são – a realidade para grande parte das empresas.

A questão que se coloca é o quanto estas estruturas parecem deslocadas no novo mundo do trabalho. O entendimento contemporâneo de carreira é marcado por flexibilidade justamente nestes dois pilares.

Resumir a contribuição de um profissional ao job description de um cargo é tão reducionista quanto ultrapassado. Limitada e pouco atrativa, a pirâmide hierárquica corporativa repele indivíduos de alto potencial.  Estamos numa era em que só os curiosos vencerão.

A ascensão de modelos ágeis de trabalho é um exemplo de prática que vai ao encontro dessa tendência. Na contramão desse modelo fixo, é cada vez mais comum as empresas se organizarem em hubs, projetos e squads, indo além das caixinhas do organograma.

Costumo nomear as possibilidades não-lineares de trabalho de carreira em nuvem. Com estruturas mais fluidas, esse modelo permite que o profissional experimente outras atividades e conheça novas áreas.

Não acredito que a carreira linear esteja com os dias contados, e movimentos recentes como o “quiet quitting”, em que profissionais se limitam a fazer o estritamente acordado no contrato de trabalho, mostram que há perfis que se encaixam em estruturas fixas e lineares.

No entanto, a visão linear não é mais a única forma de se enxergar e tratar o tema carreira em uma organização. Cabe ao RH levar essa discussão para os conselhos. Dificilmente essa pauta virá do CEO. Por isso, é necessária a coragem para propor inovação na estrutura.

Pensar em novos formatos de trabalho – híbrido, presencial ou home office – é a contenda do momento, mas o debate que se faz urgente nas salas de estratégia envolve um amplo redesenho de modelos. Que a flexibilidade não seja apenas de horários e local, mas também de contribuição.

Mais do que discutir o lugar de onde se trabalha, é preciso falar sobre formas de contribuição não engessadas, que possam acompanhar os interesses de carreira das pessoas.

Para levar essa conversa adiante, os RHs devem ter em mente que se trata de uma transformação cultural. O redesenho organizacional aberto a possibilidades de carreira não-linear só funciona em uma cultura de livre-movimentação. Novas experiências podem mudar rumos de carreira.

Dentro dessa nova lógica, qualquer obstáculo às movimentações internas é um contrassenso. Outro ponto fundamental para o sucesso na inovação estrutural é o investimento de tempo no mapeamento dos interesses de carreira dos profissionais. Junto com a livre-movimentação, o conhecimento dos anseios individuais é fundamental para direcionar a experiência profissional para que ela seja, de fato, significativa para a carreira.

As reflexões sobre carreira que todo RH deve fazer

Número de demissões voluntárias aumentou 35% no Brasil, especialmente entre os profissionais mais qualificados, o que leva a questionamentos importantes

De janeiro a maio deste ano, o número de demissões voluntárias – quando o colaborador decide deixar a empresa – aumentou 35% em relação ao mesmo período do ano passado. Os dados, do Caged, levantados recentemente pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjam), mostram que no Brasil a debandada fica restrita ao grupo dos profissionais com maiores níveis de escolaridade e que desempenham trabalho intelectual, passível de modelo remoto.

Na mesma velocidade com que talentos se livram de crachás cresce o desafio de engajamento e retenção. Para além da necessidade de oferta de modelos mais flexíveis de trabalho, que estejam de acordo com o desenho de vida dos profissionais, o tratamento dado ao tema carreira nas organizações precisa passar por uma revisão.

Há alguns anos, pesquisas revelam os vários motivos para um profissional tomar uma decisão de transição. A decepção com os rumos da carreira na organização é um dos principais pontos. Um estudo da consultoria CEB/ Gartner indica esse como o principal motivo para mais da metade (53%) dos entrevistados que trocaram de emprego.

Diante desse cenário, proponho aqui uma série de reflexões aos profissionais de RH, A primeira delas é a respeito do statement de carreira da companhia.  Como a organização de vocês trata o tema carreira? Os líderes são estimulados a ter conversas regulares sobre a carreira de seus liderados?

Quando os indivíduos não têm uma percepção de possibilidades na empresa, eles fatalmente se desengajam. Entre os profissionais de alto potencial, o percentual de desengajamento por falta de possibilidades de carreira é ainda maior.

Em muitas organizações, líderes fogem de conversas sobre carreira por enxergar que cargos e salários são a pauta exclusiva desse diálogo, quando, na verdade, esse nem deve ser o tema da conversa.

É o diálogo para discutir estratégias de desenvolvimento que tem o poder de tornar mais nítidos os caminhos e as perspectivas de carreira na organização ao dissipar a neblina que impede a visão de futuro na empresa. O indivíduo é o protagonista da sua carreira, mas RH e líderes são facilitadores desse processo.

Criar um ambiente seguro para que os talentos exponham seus interesses de carreira é fundamental para que o engajamento via diálogo decole. É responsabilidade do RH e da liderança proporcionar a segurança psicológica da qual depende a fluidez dessa conversa.

Na sua organização, os indivíduos se sentem encorajados a falar sobre interesses de carreira, ainda que esses desejos não necessariamente estejam conectados à posição ocupada no organograma? Como são medidas as aptidões e inclinações da equipe? Existe alguma ferramenta de business intelligence para orientar os líderes nessa jornada?

O futuro do RH aponta para a combinação entre a tecnologia e a poderosa conexão humana. Organizações que têm utilizado a inteligência de dados a favor do estímulo ao protagonismo de carreira e da tomada de decisão da liderança estão à frente nesse movimento.

Programas de recrutamento interno são exemplos de estruturas que devem ser adaptadas a esse novo mundo do trabalho.  O movimento de troca de área é bem recebido pelos líderes da organização? Em muitas empresas uma mudança de área é um movimento complexo que depende da liberação do líder. Ou pior:  é entendido como traição. Já ouvi empresários confessarem que preferiam perder um profissional para o mercado do que para outra área da empresa.

O enraizamento da cultura de comando e controle faz com que o RH tenha de enfrentar a questão da visibilidade das possibilidades de movimentação interna. A realidade em muitas empresas ainda é a necessidade de pedir amém ao gestor da área para demonstrar interesse em novas atividades.  A burocracia trava o recrutamento interno na sua organização?

Os indivíduos de alto potencial tomam decisões de carreira sob a ótica de desenvolvimento e livre-movimentação colocando em xeque estruturas arcaicas e velha práticas.

Demissões em massa expõem problema antigo: líderes não sabem demitir

O colunista Rafael Souto ressalta que as empresas deveriam olhar com mais cuidado o processo de demissão dos funcionários – e explica o porquê.

O desligamento de funcionários é um tema difícil de ser tratado nas empresas.

Ao longo dos anos ficou em segundo plano. O foco está nas contratações e no desenvolvimento de funcionários. A saída sempre foi tratada como tema menos relevante na agenda organizacional.

No entanto, nos últimos meses o assunto vem ganhando destaque em função da onda de demissões nas startups. Pressionadas por resultados e com menos dinheiro disponível, muitas iniciantes do setor de tecnologia precisaram apertar os cintos e cortar pessoas.

As demissões em massa e mal conduzidas expuseram um problema antigo: líderes não sabem conduzir desligamentos.

O caso Vishal Greg, CEO da startup de serviços financeiros Better, que demitiu 900 pessoas online em uma videoconferência, expôs a brutalidade de processo de saída mal planejado e terrivelmente conduzido.

Numa fala irônica Vishal disse: “se você está nessa reunião, não tenho boas notícias”. Num tom prepotente encerrou o contrato de trabalho. O episódio viralizou na internet e colocou o tema em evidência.

O emblemático caso das demissões na Better é um extrato do que acontece no dia a dia das empresas.

A consultoria Produtive, especializada em carreira, concluiu uma recente pesquisa sobre a saída de pessoas das organizações. O chamado ciclo de offboarding.

Foram mais de 400 entrevistados que trabalharam em empresas de diversos setores.  Os dados mostraram que as demissões seguem sendo um ponto crítico. 60% dos demitidos perceberam que seu gestor não estava preparado para realizar o desligamento. 58% dos gestores não sabiam explicar o motivo da demissão e não tinham informações claras sobre os próximos passos.

62% dos demitidos foram surpreendidos pela demissão. Ou seja, não tinham feedbacks anteriores ou sinalização do desligamento.

Em relação a segurança psicológica também os dados não foram positivos, 45% dos profissionais desligados não sentiram sequer espaço para obter mais informações e entender a demissão.

A demissão faz parte da vida corporativa, mas a forma de fazê-la é que define a percepção de quem sai da empresa. Para 56% das pessoas, a forma de demitir foi mais impactante do que o ato em si. Entendem que poderiam sair, mas a forma com que a demissão foi conduzida foi o que marcou a experiência.

Esses dados chamam a atenção porque expõem o quanto esse tema precisa ser aprofundado.

Na pauta das empresas contemporâneas vem se discutindo como melhorar o clima interno. A saída das pessoas é fundamental porque mostra para aqueles que ficam como as pessoas são tratadas quando a relação de trabalho se encerra. Mostra a cultura da empresa para tratar uma questão crucial. Não faz sentido contratar bem e demitir de qualquer forma.

A demissão também tem íntima relação com a agenda ESG (sigla em inglês para as preocupações com meio ambiente, sociedade e governança). Na pauta do envolvimento social da empresa, a demissão é uma ação de alto impacto na comunidade.

Além disso, a forma e as percepções do demitido irão determinar muito sobre a marca empregadora nas redes sociais e sites de avaliações sobre empresas. Isso afeta diretamente a atratividade para contratar.

O desafio está em tratar o desligamento como um processo. Investir tempo no treinamento dos líderes. Quem demite também sofre e precisa ser preparado. É preciso falar sobre o tema e tratar as dificuldades. Pensar num processo responsável e que seja estruturado. Organizar o dia do desligamento para que seja feito de forma individual e com os passos bem definidos.

A condução do desligamento deve dar transparência do que está acontecendo e o porquê da saída. Também é fundamental ouvir o desligado, não com a intenção de rever a decisão, mas sim ser empático aos sentimentos envolvidos. E por fim, dar clareza e organização sobre os passos seguintes à comunicação.

Demitir de forma empática e responsável requer tempo, planejamento e medidas objetivas de apoio para o fechamento do ciclo. As entrevistas de desligamentos são uma boa forma de ouvir os demitidos e compreender oportunidades de melhoria. Na prática, ainda são mero protocolo e pouco levadas a sério.

Um longo caminho segue aberto. O fato é que os danos gerados por demissões mal conduzidas são relevantes e construir uma marca forte passa pelo cuidado com aqueles que contribuíram na organização.