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Plano de carreira: gestores não devem vetar a movimentação dos liderados

Um dos desafios mais árduos das organizações tem sido mostrar para seus funcionários que cada indivíduo é responsável por sua própria carreira. As áreas de gestão de pessoas vêm investindo fortemente na construção de ações que reforcem o protagonismo de carreira.

De fato, isso é essencial. O antigo modelo em que os indivíduos eram guiados por um sistema pré-definido de evolução profissional sucumbiu diante da imprevisibilidade dos negócios. O plano de carreira da empresa é peça de museu. Não existe mais e não é viável diante da necessidade permanente de ajustar estruturas e adaptar o negócio aos movimentos de mercado.

Esse ainda é um desafio enorme porque muitos profissionais continuam reféns do modelo antigo. Esperam que a empresa indique um caminho e cobram o falecido plano de carreira da empresa. Vivem esperando que alguém os leve pela mão e cultivam uma síndrome permanente de vitimização.

O contexto do mundo em que vivemos não permite mais a cultura paternalista.

A adaptabilidade na carreira é fundamental. Precisamos falar em protagonismo e dar ferramentas para que cada profissional construa suas estratégias de carreira.

Para que isso seja viável é necessário criar condições efetivas para movimentos de carreira. E o primeiro passo é estimular diálogos transparentes num ambiente com segurança psicológica para que as pessoas tenham liberdade. Os dados mostram que estamos longe disso. Estudo recente da consultoria global Gartner com mais de 5 mil profissionais mostrou que 78% não se sentem encorajados pelo seu líder a dizer o que pensam sobre sua carreira. Sentem receio de serem punidos ou deixados de lado se não agradarem aos interesses de seu gestor. Em síntese, precisam fazer o que chamo de a deprimente necessidade de agradar ao chefe.

Outro estudo realizado pela consultoria britânica Fuel50 mostrou que 65% dos funcionários não realizam conversas com seu gestor e não sabem como desenvolver sua carreira. Sem diálogo e sem liberdade não existe protagonismo.

A cultura contemporânea de carreira também pressupõe que as pessoas tenham liberdade de movimentação na empresa.

E aí, temos vários pontos críticos. O primeiro é que muitos líderes se acham donos da carreira de seus funcionários. Realizam conchavos internos e bloqueiam os profissionais para garantir os resultados de sua área. E, em muitas empresas, são respaldados por processos internos anacrônicos. O mais absurdo deles é a necessidade de autorização para um funcionário participar de um processo seletivo interno. Esse tipo de controle é a expressão máxima de uma cultura obsoleta em que a carreira das pessoas fica na mão de poucos.

Uma empresa do século XXI não pode permitir que um gestor seja dono da carreira de ninguém. É justo estimular que o líder saiba do interesse numa nova posição por meio  de conversas de carreira. É importante que o gestor possa se preparar caso o funcionário seja aprovado. Mas, jamais poderá ter o poder de veto de um movimento. Caso contrário a mensagem que chega na equipe será distorcida. Como posso ser protagonista na minha carreira se meu líder decide meu futuro?

A diretriz sobre como funciona a evolução profissional é uma importante construção para dar clareza sobre as regras do jogo. O mundo do trabalho tão frenético e em rápida evolução exige que possamos dialogar e engajar os profissionais dando perspectiva e liberdade. E para que ele tenha real sentido, todos os processos de comando e controle sobre a carreira precisam ser revistos.

Plano de carreira: o que é e como montar uma trajetória de sucesso

O plano de carreira previsível e baseado em definições claras sobre crescimento, oferecido pela organização, já não existe mais. Hoje, o profissional precisa ser cada vez mais protagonista e desenhar o seu próprio plano de carreira para obter sucesso e alcançar seus objetivos profissionais. Em reportagem para o Valor Econômico,  Rafael Souto, CEO da Produtive, contribui com o tema com dicas importantes para a construção de uma trajetória de sucesso.

Um plano de carreira é a relação de experiências e atividades associadas ao trabalho de determinada pessoa durante o período de sua vida. A forma como os profissionais constroem esse plano depende do objetivo profissional, da estrutura na qual trabalham (startups, grandes empresas, empreendedorismo, setor público, terceiro setor ou autônomos) e dos recursos que têm disponíveis (próprios ou corporativos).

Até os anos 90, as empresas possuíam estruturas organizacionais mais fixas ou um grande número de níveis hierárquicos. O que significava, analisa Rafael Souto, CEO da Produtive, que profissionais delegavam muitas vezes a sua construção de carreira às empresas. Estas, por sua vez, determinavam quais cargos as pessoas deveriam ocupar, habilidades que eles precisavam ter, formações complementares.

Diziam quem deveria virar líder e a escadinha era clara: do estágio ao analista, do coordenador ao gerente, do diretor ao CEO. E as pessoas normalmente faziam uma carreira em uma organização. “É um modelo tradicional que ainda vigora em muitas organizações, onde há clareza do que as pessoas precisam apresentar e onde podem chegar se entregarem resultados”, diz Vanessa Cepellos, professora de gestão de pessoas da FGV-EAESP.

Mas a globalização, a ascensão da internet (e a consequente demanda por novas habilidades e redesenho de profissões), além de um cenário geral de maior imprevisibilidade de negócios levaram as empresas a reverem os planos de carreira. “Não dá para muitas delas hoje prometerem um nível sênior daqui dois anos se elas nem sabem se aquela função vai existir”, diz Souto.

Na última década no Brasil, principalmente, começou-se a falar em “narrativa do indivíduo”, onde os profissionais precisam ser protagonistas de sua própria construção de carreira – independentemente se estão em uma grande organização ou não, avalia Bruno Andrade, professor da Saint Paul Escola de Negócios, especializado em liderança.

A carreira não será mais baseada majoritariamente em uma sequência de cargos, mas em experiências significativas e acumulativas. “Algo mais ligado a ser polivalente, de trabalhar em várias coisas ou áreas e entregando coisas diferentes”, diz José Augusto Figueiredo, country head do Grupo Adecco.

Cada empresa se adaptou a essa nova noção de uma forma: oferecendo uma formação mais personalizada, criando estruturas mais horizontais onde os talentos se movam na direção que quiserem, mudando incentivos relevantes à sua promoção e reconhecimento ou até mesmo redesenhando cargos.

À parte do pano de fundo ao qual o funcionário está exposto, especialistas defendem que é preciso chamar para si a responsabilidade de construir um bom plano de carreira. E eles dão oito dicas para criar o protagonismo da carreira e traçar os passos rumo ao sucesso profissional.

1. Faça uma autorreflexão

“O primeiro passo para pensar a carreira é: qual sonho você tem? Quais vontades? Que projetos gostaria de abraçar? Onde gostaria de gerar impacto?’ diz Figueiredo.

“Essa reflexão servirá como guia para tomada de decisão de mudar de uma empresa, de pedir para trocar de área e de não se frustrar com uma movimentação lateral – onde o profissional muda de função, mas não necessariamente ‘sobe’ na hierarquia”, diz o executivo. Essa reflexão também precisa levar em conta demandas de vida (satisfação, equilíbrio e interesses) e, se possível, uma reserva financeira para conseguir se movimentar de forma mais estável, afirma Souto.

2. Faça uma reflexão externa
Conversar com profissionais nos quais você confia perguntando a eles quais são seus pontos fortes e ouvir suas histórias de carreira pode ajudar a traçar prioridades e mudanças, diz Souto. “É preciso buscar narrativas fora para você se inspirar a criar a sua.”

3. Seja flexível no plano
O plano de carreira não pode ser rígido porque a vida muda, o acaso abre novas oportunidades e os valores e desejos das pessoas também se modificam, diz Cepellos. É preciso ter um pé no futuro e outro no presente, até para aproveitar oportunidades que surgem no caminho e definirão todo o resto.

“Monte o plano com temas importantes para o longo prazo. Mas revisite sempre o curto prazo. Olhe para sua carreira e pense: eu estou feliz hoje? Preciso fazer um novo curso para abrir uma nova oportunidade? Devo me expor mais? É combinar um plano com o fluxo natural de carreira e de vida.”

— Bruno Andrade, professor da Saint Paul Escola de Negócios

4. Construa seu mapa de competências
Ao revisitar esse plano no curto prazo, entenda se ele está te levando aonde gostaria de estar no longo prazo e quais competências o ajudariam a chegar lá. “Se você quer trabalhar fora e não possui um idioma, por exemplo, é preciso começar a desenvolver essa habilidade muito antes de materializar o plano final”, diz Andrade. Conversar abertamente com o gestor direto sobre quais habilidades você gostaria de desenvolver também é válido. “Às vezes, a empresa tem muitos recursos para o desenvolvimento do profissional, mas ela não sabe que ele gostaria de mudar de área ou função e as pessoas têm receio de falar.”

5. Estude tendências e movimentos de mercado
É possível se preparar para ser mais competitivo no futuro do trabalho mesmo que esse futuro não esteja ainda muito claro. Souto exemplifica:

“O contador dos anos 80 era guarda-livros e essa área morreu. Mas os contadores que avaliaram tendências à época e foram estudar controladoria estão muito bem hoje porque controller é uma das funções mais buscadas hoje. Não foi o contador que morreu, mas o guarda-livros.”

Incorpore tendências da área. Atualmente, por exemplo, é exigido dos profissionais habilidades não somente técnicas, mas comportamentais. “Tolerância a frustração, respeito às diferenças, inteligência emocional e abertura ao diálogo estão em alta”, diz Solto. O CEO da Siemens no Brasil, Pablo Fava, disse ao Valor, por exemplo, que hoje 70% de seu tempo é gasto se relacionando com funcionários e clientes, entendendo como criar um cenário onde todos consigam construir um impacto maior.

6. Avalie e reavalie ciclos
Não se prenda à quantidade de anos para se certificar se um ciclo de carreira foi bem realizado ou precisa ser finalizado, diz Souto. “Se você estiver feliz com o que faz e a empresa com os resultados, um ciclo pode durar dois, três anos ou até dez na mesma posição. Não há tempo certo. O que é preciso é reavaliar periodicamente seus ciclos e buscar algo novo – dentro ou fora – se você sentir que caminha como gostaria.” A headhunter Fatima Zorzato usa a analogia de um rio para a jornada profissional para dizer que muitas vezes é preciso “saltar’, buscando novos desafios e experiências, para não “ficar preso nas árvores que margeiam o caminho da correnteza”.

7. Entenda o que é progresso para você
À medida que as empresas criam estruturas horizontais, eliminam cargos e mudam a jornada do colaborador, é possível que elas alterem também estruturas de reconhecimento, promoção e incentivo, diz Cepellos. À parte da questão de
remuneração, o profissional precisará aprender a lidar com novas formas de progresso – que não necessariamente se medem por uma subida na hierarquia. “E isso vai depender muito do que os satisfaz”, diz.

“Há pessoas que sentem que estão progredindo quanto estão se desenvolvendo, outras quando estão aprendendo muito, outras quando conseguem transitar em diversas empresas e áreas e há ainda aquelas que simplesmente estarão se sentindo bem-sucedidas ao finalmente conseguirem conciliar trabalho com vida pessoal”, afirma Cepellos.

8. Preciso ter plano B sempre?
Com a expectativa de vida aumentando, é muito provável que as pessoas precisem pensar em mais transições de carreira e tenham até três carreiras completamente diferentes ao longo da vida, diz Cepellos. Andrade diz que é uma tendência alta no mercado muitos profissionais irem construindo uma nova carreira (B) em paralelo à atual (A), sem esperar que A seja concluída ou encerrada abruptamente. Ele mesmo é executivo em uma multinacional e concilia a atuação como professor na escola de negócios. “E é possível fazer isso construindo várias carreiras dentro da atual, revisitando o plano periodicamente e buscando qualificações e competências que você acha que serão relevantes. É assim que se vai abrindo caminho.” Maria Silvia Bastos ex-presidente do BNDES, da CSN e da Icatu Seguros diz que todas as experiências que vivenciou ao longo da vida a qualificaram para oportunidades seguintes. “Minha dica é viver ao máximo cada experiência profissional, aprendendo tudo que puder sobre aquele tema, porque aquilo vai ser útil em um próximo momento da vida.”

Como devem ser feitas as promoções se a carreira não é mais linear?

A maior parte dos planos sucessórios é feito com base nas necessidades das empresas e não das pessoas. Esse sistema baseado na visão empresarial praticamente exclui as escolhas individuais e se torna um grave fator de risco para as organizações. Rafael Souto, CEO da Produtive, mostra como a nova lógica de sucessão pode beneficiar empresas e profissionais em seu novo artigo para a Você RH.

Durante boa parte do século passado, as relações de trabalho eram construídas num modelo de obediência cega. A empresa determinava o futuro das pessoas, movimentando as carreiras de acordo com as demandas de negócio. O plano de carreira era de longo prazo e previsível. O contrato psicológico significava entrar num local e a empresa cuidar da carreira.

Os planos de sucessão seguiam uma linearidade e previsibilidade no tempo. Alguém apontado para ser o sucessor tinha prazo e cadeira garantidos num modelo com estruturas grandes e que asseguravam essa estabilidade. O engajamento das pessoas ao longo do tempo era baseado nessa promessa sequencial de cargos.

Essa filosofia sucumbiu diante das transformações do mundo dos negócios. As estruturas não são mais previsíveis. Ao contrário, mudam com velocidade supersônica. Isso impede promessas de longo prazo baseado em cargos.

A sucessão contemporânea também precisa ser ajustada na forma de mapear os interesses de carreira dos indivíduos. Nos sistemas do passado era fácil inferir o que era melhor para os empregados considerando avaliações de desempenho e potencial. Depois cruzar com as demandas de negócio e construir um mapa. Esse sistema baseado na visão empresarial exclui ou minimiza as escolhas individuais e se torna um grave risco para as empresas. Por mais que possamos rechear o processo de sucessão com ferramentas, algumas com glamorosas siglas em inglês como “assessment”, “high potential”, “nine in box”, precisaremos repensar o equilibro entre interesse organizacional e visão de carreira do indivíduo.

Desde o final do século passado, o protagonismo na carreira vem ganhando força como uma forma de dar sentido prático para a responsabilidade do indivíduo na construção da sua carreira. Essa diretriz combina com o novo mundo do trabalho e dá clareza no papel de cada profissional na construção de sua trajetória agindo de forma curiosa e ativa na exploração de seu futuro profissional.

Nesse sentido, precisamos conectar a diretriz de protagonismo com os mapas de sucessão para que a visão de futuro da organização faça sentido com a narrativa de carreira do funcionário.

Segurança psicológica

Isso exige uma nova abordagem para o tema, começando pela construção de uma cultura de segurança psicológica que permita livre reflexão e diálogos transparentes entre líderes e sua equipe. Somente num ambiente de confiança e com conversas frequentes é possível construir reflexões potentes sobre carreira. Estimular gestores para estabelecer rituais permanentes de conversas sobre cenários de carreira, interesses e temas de desenvolvimento é um passo estratégico para a construção de planos de sucessão equilibrados e que sejam confiáveis.

Os comitês que discutem pessoas e mapas de sucessão também precisam repensar os modelos de comando e controle na forma de considerar a carreira e os movimentos dos indivíduos. A inferência é um pecado mortal na construção da carreira contemporânea.

Um estudo publicado pelas americanas Julie Winkle Giulioni e Beverly L. Kaye mostrou que 55% dos mapas de sucessão realizados em grandes empresas eram feitos com visão predominante da empresa e pouco incluíam interesses genuínos dos funcionários. Isso se deve à ausência de conversas e mapeamento desses interesses de carreira, e também a falta de liberdade para a livre discussão sobre carreira. Isso torna os mapas de sucessão altamente falhos.

A nova lógica de sucessão não exclui a visão da organização sobre os indivíduos e sim integra a visão de carreira para que os movimentos sejam equilibrados e coerentes com a filosofia baseada no protagonismo. Permitir a diversidade de carreiras e que cada um possa construir o seu projeto são as mais potentes estratégias para engajar as pessoas e garantir consistência nos planos de sucessão.

O plano de carreira hoje

 

Estamos numa era de transformações no mundo do trabalho. O século XXI apresenta tendências que exigem novas estratégias para planejamento e gestão de carreira. Uma dessas mudanças é na forma de pensar o trabalho.

No Brasil, até os anos de 1990, a lógica era o emprego para a vida toda. As pessoas iniciavam numa empresa e queriam por lá ficar. Com frequência, permaneciam toda a carreira num único empregador. A carreira era gerida pela organização e o profissional era guiado de acordo com os interesses da empresa.

Com a abertura da economia brasileira, a estabilidade acabou. As empresas precisaram pensar suas estruturas e aumentar a competitividade. A zona de conforto terminou. As pessoas ganharam e souberam ocupar o espaço de responsáveis por sua vida profissional. Nessa época de protagonismo na gestão de sua carreira, surgiu a expressão “empregabilidade”. O desafio de ser competitivo para o mercado, pensando em múltiplos empregos ao longo da vida. A possibilidade de escolha e a clareza de que é fundamental ser atrativo para o mercado e não somente para uma empresa se consolidaram.

Já nos anos 2000, estamos diante de um novo cenário. É a era da trabalhabilidade. O modelo do emprego se mostra limitado, principalmente quando analisamos o aumento da longevidade. As pessoas vivem mais e não ficarão empregadas por toda a sua vida útil. É necessário construir alternativas para continuar produzindo e gerando valor na sociedade. O emprego continua sendo uma opção de carreira. Mas não deve ser a única estratégia. Essa nova visão de como ser produtivo exige a construção de novas fontes de renda, seja como empreendedor, consultor, sócio, professor, conselheiro ou qualquer outra forma de trabalho. Ser empregável não é a visão mais contemporânea de carreira. No caminho que estamos com empregos cada vez mais raros, o desafio é gerar trabalho.

A outra grande mudança está acontecendo na forma de ascensão profissional. O crescimento linear com mudanças de cargos e promoções verticais se mostra limitado e insuficiente para atender às demandas de resultados das empresas e de reconhecimento das pessoas.

Os organogramas estão mais enxutos. Não há cargos para todos.

Nesse contexto surge a carreira em nuvem. Significa crescimento e oportunidades que podem estar fora da estrutura tradicional. Pensar em “nuvem” é compreender o negócio em que trabalha e construir seu crescimento através de projetos, atividades interinas ou movimentos laterais. Muito mais do que cargos e organogramas, o profissional do século XXI deve procurar projetos e oportunidades para mostrar seus resultados.

Construindo uma carreira genuína e inteligente

A carreira constitui um conjunto de papéis na vida que exige uma reflexão permanente e ampla sobre os papéis que temos e como queremos desenvolvê-los. Em um período marcado por desafios e transformações, o conceito de carreira inteligente pode ser decisivo para organizar uma estratégia que vença as turbulências do mercado e traga realização ao profissional. É sobre este assunto que Rafael Souto, CEO da Produtive, fala em seu novo artigo para o Valor Econômico.

As mudanças aceleradas nos negócios determinadas pela transformação digital impactam todas as carreiras. O ano de 2020 é autoexplicativo quando falamos da necessidade de se transformar e se adaptar. Nesse contexto desafiador em que todos precisamos olhar para nossa capacidade de gerar trabalho e renda, o conceito de carreira inteligente pode ser decisivo para organizar uma estratégia que ultrapasse as tempestades do mercado.

A ideia de carreira inteligente foi desenvolvida pelos professores Michael B. Arthur, Priscilla H. Claman e Robert J. DeFillippi e é composta por três questões essenciais: “por que”, “como”, e “para quem”. O “por que” é uma reflexão fundamental e que embasa a jornada na construção da carreira. Quanto mais habilitado estivermos no autoconhecimento e conscientes do estilo de vida que queremos, mais possibilidades de criar uma carreira com realização e sentido.

Como cita a professora Morra Aarons-Mele, a pior carreira é aquela construída para imitar alguém, seguindo um caminho construído por outro. Ela se esvazia pela ausência de sentido. A carreira é mais abrangente do que vida do trabalho, constitui um conjunto de papeis na vida. Isso exige uma reflexão permanente e ampla sobre os papéis que temos e como queremos desenvolvê-los. A provocação do “por que” pode ser libertadora. A ideia da carreira linear fez parte da forma de encarar o trabalho por mais de 100 anos. O conceito de sucesso ligado à hierarquia e de progressão está enraizado na sociedade.

Atualmente, sabemos os impactos nocivos desse caminho único em direção ao topo: hordas de pessoas infelizes e frustradas com seu estilo de vida ou fazendo atividades que não gostariam para sustentar uma posição hierárquica. A verdadeira noção de carreira inteligente começa pela genuína constatação dos elementos que geram satisfação e que se conectam com os papéis que de fato queremos exercer.

A segunda reflexão é o “como”, que é uma constante análise de possibilidades e autorreflexão, avaliação de cenários e construção de planos. Nas empresas, o cansado e famoso PDI (plano de desenvolvimento individual) seria o repositório para incluir as estratégias de carreira. Infelizmente, na maioria das organizações esse documento é visto como um fardo empurrado pelo RH. A reorganização do mundo do trabalho não permite mais que as empresas ofereçam um plano de carreira como acontecia no século XX. Cada indivíduo é o responsável pela organização de sua carreira.

O “como” inclui uma análise de temas de desenvolvimento e escolha de caminhos para aprimorar a competitividade. A capacidade de acolher “feedbacks” e buscar de forma ativa informações para composição do caminho é um ato de protagonismo. Por fim, a reflexão “para quem”. A análise de com quem eu escolho trabalhar faz parte da carreira inteligente. Refere-se alinhamento de valores, o estilo da empresa e conexão com a cultura da organização. A crença na instituição determina muito da energia e do sentido que se pode atribuir ao trabalho. A reavaliação desse aspecto pode determinar o final de ciclos. E cabe ao protagonista medir o quanto se sente conectado com os valores e o caminho da organização.

Isso ultrapassa eventuais desentendimentos ou problemas numa área. Onde escolhemos amarrar o nosso cavalo diz muito sobre o que somos e o que queremos de nossa trajetória profissional. O protagonista está atento aos seus ativos intelectuais e de forma consciente planeja e gerencia seu desenho de vida. Cabe ao indivíduo construir o percurso. Esta é a chave para lidar com as turbulências e buscar realização.