Como saber que é hora de repensar rumos profissionais? Kátia Ackermann, diretora executiva da Produtive, responde.
Como saber que é hora de repensar rumos profissionais? Kátia Ackermann, diretora executiva da Produtive, responde.
Após três marcos importantes, o mercado de trabalho passou por grandes mudanças, mas o modelo mental das pessoas ainda está dependente do que as organizações podem fazer por suas carreiras. Veja o que Rafael Souto, CEO da Produtive, diz sobre o tema em seu artigo publicado no jornal Zero Hora.
Apesar das constantes mudanças econômicas e dos diferentes ciclos no mercado de trabalho que vivemos, os profissionais ainda seguem com a ideia de que o plano de carreira deve ser ofertado pelas empresas.
Até a década de 1990, a permanência das pessoas era de longo prazo, pois as suas carreiras eram geridas pelas organizações. Com um mapa pré-definido, os profissionais seguiam numa estrada bem estabelecida. O tempo médio de casa era de 12 anos e meio.
Passado esse período, a globalização, a necessidade de reduzir custos e de aumentar competitividade dominaram a agenda dos negócios. O plano já não era tão previsível. Prometer crescimento era arriscado e, muitas vezes, inviável na estrutura de custos. Surgiu o conceito de empregabilidade. Foi aí que os profissionais começaram a pensar na carreira com uma visão de mercado e não apenas numa única empresa para o resto da vida. Mas, ainda assim, a consciência de desenvolvimento continuava associada ao plano de carreira da organização.
Esse problema aumentou na virada do século. Com a competição acirrada, a revolução digital pressionou ainda mais as empresas. A imprevisibilidade dos negócios e a necessidade de ajustes rápidos nas estruturas derrubaram a ideia de evolução em cargos pré-determinada. Os níveis foram esmagados pela necessidade de cortes de custos. Qualquer promessa de plano de carreira virou pura ilusão.
Chegamos, então, na segunda década do século 21, com dois cenários. O primeiro com profissionais investindo pouca ou nenhuma energia em reflexões de carreira, sem planejamento e esperando ansiosamente por respostas de crescimento linear do chefe e da área de RH. Fato é que a expectativa sobre o plano de carreira da empresa aparece nos três pontos de maior valorização das pessoas em 80% dos estudos realizados pelo Instituto Gallup, que pesquisa sobre engajamento no trabalho em diversos países.
Como segundo cenário, nos deparamos com a falta de diálogos de carreira dentro das organizações. Com chefes fechados a conversas com medo de saber os interesses e os pontos de desenvolvimento de suas equipes.
Para mudarmos para um universo onde há milhares de protagonistas de suas carreiras e livres de amarras de cargos, mas focados em desenvolvimento, será necessário trabalharmos a educação para a carreira com mais intensidade.
O desafio das empresas será preparar a liderança para dialogar de forma transparente respeitando os desejos e os interesses do profissional.
Do contrário, colocaremos as pessoas no conhecido e deprimente jogo de agradar o chefe. E aí ficaremos no pior dos mundos: com indivíduos esperando por uma empresa paternalista que defina os seus rumos de vida e sem qualquer vitalidade profissional.
Pense que, daqui a um tempo, o emprego pode não existir mais na sua área de atuação. Por isso, planejar a carreira com apenas uma possibilidade é um erro
Lidar com as mudanças rápidas de mercado não é uma tarefa fácil para a carreira de ninguém. Quando fazemos parte de um mundo globalizado, de acesso rápido às informações e abertura de novos mercados, estar atentos às transformações do trabalho é fundamental para não perdermos o gatilho de crescimento ou ficarmos obsoletos.
De acordo com a consultora de carreira sênior da Produtive, Marcia Oliveira, os profissionais de áreas específicas e bastante técnicas, como de Recursos Humanos, tiveram que passar a entender do negócio com essa transformação. “Uma área de desenvolvimento e treinamento, por exemplo, não pode colocar um projeto para rodar se não tiver uma métrica muito clara para análise do retorno sobre o investimento. Por muito tempo se ouviu que os resultados não eram tangíveis, mas agora, com os reforços do big data, esses profissionais precisaram desenvolver novas competências e oferecer um retorno mais estratégico às áreas das empresas”.
Outro exemplo de mudança que a especialista traz é no mercado financeiro, que tem saído do modelo tradicional, considerando as mais diversas operações de avaliação de risco, de conformidade, com muitas questões regulamentadoras e que exigia perfis muito técnicos, para negócios com novas moedas e novos modelos, como as fintechs. “O caso das seguradoras também é clássico nesse sentido. Hoje, nos deparamos com mais seguradoras online. Em médio prazo, o contexto mostra que teremos muitas pessoas fazendo seguro de forma pontual, sem necessidade do corretor físico, talvez”, comenta ela.
Nesse calibre de cenários futuros, Elisio Carolino Santos, executivo da área de finanças e advogado, tem buscado constante especialização para continuar competitivo e partir para novas atuações de trabalho. “Atuo em finanças desde o início da minha trajetória, mas considerei em ter a minha graduação em Direito, pois entendi que teria conhecimento complementar à minha experiência e também contribuir mais na área Existe uma lacuna grande entre jurídico e financeiro e ter ambos conhecimentos agrega muito valor”.
Ele comenta que procura se especializar muito para um dia atuar no meio acadêmico quando a vida executiva não for mais possível. “Acredito que o profissional de hoje precisa estar aberto a ambientes e conhecimentos novos. Sempre tive muita vontade de aprender e curiosidade”, diz ele que, além da graduação em Direito, coleciona títulos de especialista em Direito Empresarial e em Finanças, doutorado em Administração e está prestes a concluir seu mestrado também em Administração.
Fique conectado!
Veja abaixo as dicas da especialista Marcia Oliveira e saiba se a sua carreira precisa de atualização de rota
1 – A forma como o seu cliente chega até você é a mesma do que antes? Se não, repense sobre conhecimentos ou competências que você precisa adquirir para não perder a mão no relacionamento com os clientes.
2- As ferramentas ainda são as mesmas para realizar o seu trabalho? Com a participação cada vez maior da tecnologia na vida de todos, muitas empresas têm feito uma migração do analógico para o digital e isso tem mudado os processos internos. A dica de ouro aqui é: não seja resistente ao novo. Procure entender e participar desta mudança.
3- Procure conversar com os seus colegas de profissão. Faça networking para trocar ideias e benchmarking. Além de se atualizar, você mantém ativa a sua rede de relacionamento.
4- Para que lado estão indo? Conheça o plano estratégico da organização na qual trabalha. Dessa forma, você conseguirá investir em sua carreira com mais clareza, preenchendo lacunas que podem ser solicitadas em um futuro breve seja internamente ou pelo mercado.
5- O que está acontecendo em mercados estrangeiros? As maiores potências do mundo ditam as regras de tendências de consumo e culturais. Israel, por exemplo, se destaca em relação à cibersegurança. Já a China, está mudando o cenário da área de finanças. Nos EUA, em Nova York, carregam as mudanças da bolsa de valores, assim como na Califórnia, na região do Vale do Silício, é o polo de inovação e tecnologia.
6- Feitos todos os passos, gerencie seu plano de ação e procure validá-lo com especialistas da área para diminuir os riscos e aumentar a efetividade de sua decisão.
A velha máxima de que é melhor estar parado olhando na direção certa, do que correndo na direção errada é atual e não importa o tempo que passe. Saber o que quer, o que gosta e onde quer chegar são nortes para o indivíduo que não tem apetite para o fracasso. Nesse sentido, o propósito torna-se requisito básico para aqueles que desejam recompensas significativas.
Essa fala pode parecer clichê, mas são poucas as pessoas que levam um objetivo a sério ou que o reconhecem. De acordo com um levantamento realizado pela revista Harvard Business Review, apenas 3% das pessoas pesquisadas tinham de fato um plano de ação para suas vidas. E esses 3% detinham 90% da renda de todos os entrevistados.
O motivo desse pequeno percentual é que dá trabalho investigar um propósito. Olhar para dentro e refletir, necessita de muito questionamento, responsabilidade e entrega.
Foi o caso de Henrique Mascarenhas, executivo da área de marketing há mais de 20 anos. Após sair da empresa na qual trabalhava, viu a oportunidade de transpor o cartão corporativo. Passou a fazer um planejamento de carreira junto à Produtive e, com calma, encontrou diversas oportunidades que fizeram sentido para a sua vida. “Me permiti investigar o que eu conquistei desde então, qual é o legado que queiro deixar, como quero criar meus filhos, o que eu faço bem, quais os meus sonhos e valores diante do meu conhecimento”.
Nesse ínterim, o profissional encontrou diversas janelas anteriormente não previstas. Uma delas foi como financial planner, algo convergente à ação de ajudar as pessoas. “Sempre gostei da área de investimento e, encontrar uma renda em que você pode ajudar a mudança de vida das pessoas, é muito significativo para mim”.
Mascarenhas também quis deixar um legado de sua vida para a sociedade atuando em projetos de energias limpas e renováveis, passou a fazer cursos e a estudar mercados que fazem sentido para ele a longo prazo. E, em seguida, começou a dar aulas na FGV (Fundação Getúlio Vargas), uma atividade que já tinha experimentado como convidado, mas não considerava como peça do xadrez.
Distantes de suas próprias rédeas, ele comenta que muitos profissionais vão deixar o legado das cifras, mas que não fazem e nem vão fazer sentido para eles. “A identidade corporativa tem uma data de validade. Hoje, eu percebi que é preciso passar pelo processo de reflexão e estabelecer objetivos próprios muito antes da empresa te dizer adeus. Para mim, essa oportunidade forçada de estabelecer um propósito foi uma das melhores coisas que aconteceram na minha vida. Foi realmente transformador”.
Protagonista da carreira
A Vera Vasconcellos, coach e consultora de carreira sênior da Produtive, foi quem acompanhou Mascarenhas nessa jornada. Segundo ela, quando a pessoa tem clareza do que quer, seja a curto, médio ou longo prazo, ela consegue desenvolver ou fortalecer as competências, conhecimentos, habilidades ou comportamentos necessários para chegar no objetivo pretendido. “Ao longo do tempo, esse propósito vai se atualizando, mas é importante defini-lo antes de mais nada”.
Para Vera, existem vários fatores que podem ajudar a pessoa a atingir o seu objetivo. Um deles é estar aberto ao novo. “O coelho sai da cartola em que menos se espera”, brinca ela. E por estar aberto ao novo, a pessoa fica menos seletiva, reforça a especialista. “A socialização é maior, o que permite a troca de ideias e a ampliação de repertório profissional”.
Outra dica é dar movimento aos dias, principalmente para quem está em transição de carreira. “Faça uma agenda diária e torne os momentos agradáveis com algo que goste. Encontre pessoas, aproveite o tempo para estar com a família, mas tenha cuidado para não esquecer do seu objetivo principal”.
Segundo Vera, é natural que a pessoa tenha uma queda de energia nessa caminhada, mas deve-se evitar qualquer ciclo vicioso, deixando, por exemplo, de se cuidar. “Tenha o equilíbrio necessário”, recomenda.
No futuro, o profissional precisa olhar para trás e ter a clareza de que seus passos valeram a pena. Do contrário, ele terá sido levado pelas mãos dos outros, e elas podem levar a caminhos opostos a seu gosto.