Tag Archives: modelos de trabalho

Já estamos todos demitidos e precisamos agir

A imprevisibilidade do cenário atual, acarretada pela pandemia do Coronavírus, traz não só mudanças no âmbito da saúde e da economia, mas também nos modelos de trabalho. Empresas passaram a revisar seus paradigmas de trabalho em função da crise, aplicando mudanças que podem não ser transitórias. No novo artigo para o Valor Econômico, Rafael Souto, CEO da Produtive, comenta sobre a aceleração das mudanças neste novo cenário e afirma: “Todos nós já estamos demitidos dos modelos tradicionais e teremos que nos reinventar”.

Nas últimas semanas estamos imersos em acaloradas discussões sobre os impactos econômicos gerados pelas medidas de controle da pandemia do coronavírus.

As discussões permeiam questões éticas e se tornam ásperas quando tentamos equilibrar a proteção à vida e aos temas econômicos.

A jornada é árdua e não terá saída no curto prazo. Os dramas decorrentes da quarentena na economia serão profundos e, neste momento, difíceis de mensurar.

Estudos mais dramáticos apontam que os índices de desemprego podem triplicar nas economias emergentes, que são mais frágeis, com pouca disponibilidade para injetar recursos e construir políticas anticíclicas. Elas sofrerão mais e de forma mais prolongada. Tudo isso ainda é difícil de medir.

A imprevisibilidade do vírus faz com que tenhamos que viver o dia a dia. Qualquer projeção que tente projetar números a essa crise econômica é um exercício meramente especulativo. Enquanto os governos de todo o mundo planejam suas estruturas de resposta à doença, com a construção de hospitais de campanha ou discussão da logística de suprimentos e equipes médicas, nos resta tomar medidas de proteção e restringir a circulação do vírus.

Mas, uma coisa é certa quando a pandemia arrefecer. O emprego nunca mais será o mesmo. Todos nós já estamos demitidos dos modelos tradicionais e teremos que nos reinventar.

Há alguns anos defendo o conceito de trabalhabilidade, como sendo a capacidade do indivíduo produzir e gerar renda. Muito além do emprego tradicional, teremos que encontrar novas alternativas. Cada vez mais teremos estruturas em home office, trabalho flexível, revisão de estruturas e níveis hierárquicos.

Recente estudo da consultoria Mckinsey & Company apontou que 80% das maiores companhias do mundo já estão revisando seus paradigmas de trabalho em função da crise. E consideram aplicar mudanças na sua forma de trabalhar e operar a partir dos aprendizados dessa nova dinâmica de operação. Não apenas na questão do home office, mas na forma de trabalhar e gerir as equipes.

Algumas criaram células menores e estruturas mais flexíveis para dar sequência nos projetos. Chamo isso de carreira em nuvem.  E observo que ela está ganhando cada vez mais força. São equipes de trabalho mais fluidas e não vinculadas a uma função específica. Os indivíduos fluem na empresa conforme suas competências, demandas corporativas e interesses de carreira. Isso transforma o modelo hierárquico tradicional e as vastas estruturas de poder. Algumas companhias já fazem isso há algum tempo, como Amazon, Zappos e Spotify. A lógica central do trabalho está na capacidade de contribuir dos indivíduos e não no cargo que ocupam.

A Amcham, Câmara Americana de Comércio, constatou entre seus associados no Brasil que mais de 70% das empresas já ajustaram suas estruturas para seguir operando fora dos escritórios. Certamente levarão conclusões para seus modelos de trabalho.

Essas mudanças não serão transitórias para boa parte das organizações que irão considerar as novas estruturas como possibilidade para reduzir custos e otimizar seus resultados.

Portanto, além do impacto direto na economia, essa crise também trará alterações nas relações de trabalho. E será uma aceleração de mudanças que já vinham ocorrendo. Isso exige uma profunda revisão no modelo mental de trabalho e na forma de fazer gestão.

A tradicional noção de emprego como uma função específica e com um plano de carreira para crescer na organização já estavam com os dias contados. Essa pandemia será a pá de cal nesse modelo.

Sobreviverão no mercado aqueles profissionais que de fato assumem sua carreira, investem de forma permanente no seu desenvolvimento e estão disponíveis para resolver problemas de negócios. Aqueles que esperam uma cultura paternalista em que são guiados por uma empresa, serão engolidos pelo vírus da mudança.

Viver da burocracia empresarial não será mais uma alternativa. A carreira no passado era uma sequência de cargos ao longo de uma trajetória. A carreira contemporânea é um conjunto de experiências significativas ao longo tempo.

O fim da hierarquia

O Zero Hora de hoje traz novo artigo de Rafael Souto, CEO da Produtive, que questiona se as  estruturas atuais de trabalho favorecem a inovação buscadas pelas empresas.

 

A discussão sobre a necessidade de inovar nos negócios segue constantemente na agenda das empresas.

O tema, de fato, exige reflexão. Muitas empresas sucumbiram diante das mudanças nos negócios. Boa parte delas naufragou na incapacidade de acompanhar as transformações do mercado.

Para que as mudanças ocorram, no entanto, precisamos de pessoas que impulsionem a organização rumo ao novo.

Mas será que as estruturas atuais de trabalho favorecem essas mudanças?

Tenho a convicção de que não, porque ainda vivemos imersos em modelos hierárquicos tradicionais que engessam o fluxo de ideias e o espaço de contribuição das pessoas. Os modelos piramidais baseados no poder, emanado do topo, pouco favorecem a inovação.

Algumas empresas já fizeram profundas revoluções nesse modelo, entre elas cito duas grandes companhias norte-americanas que são Zappos e Amazon. Nelas, a hierarquia clássica deixou de existir. Um exemplo disso é que os colaboradores trabalham em grupos e projetos. A valorização está na entrega das atividades e não no cargo que ocupam.

Isso pode parecer uma realidade bem distante da maioria das organizações. Mas é um sinal dos novos tempos.

Por isso, se quisermos falar em inovação e contarmos com pessoas talentosas, teremos de repensar a forma de trabalho.

A hierarquia do futuro será baseada no potencial de contribuição das pessoas e não no peso do seu cargo na estrutura. E, caso não seja possível extinguir completamente o modelo tradicional, precisaremos construir sistemas híbridos. Nesses modelos mistos, o desafio será mapear as contribuições que as pessoas querem e podem oferecer e, a partir desse olhar, organizar espaços para que elas possam se desenvolver na empresa.

Não acredito em retenção de talentos. Isso porque os profissionais talentosos não são retidos e sim engajados quando percebem que podem contribuir e têm perspectivas de desenvolvimento na empresa. Essa realidade só será possível quando oxigenarmos nossas lideranças e substituirmos o modelo de comando e controle para um sistema mais construtivista. As melhores ideias e projetos precisam ter voz, independente de quem as constrói.

Um estudo recente da consultoria Gartner, revelou que 52% das pessoas deixam as empresas quando não percebem oportunidades de carreira e reconhecimento.

As organizações que, realmente, quiserem inovar devem começar revisando suas estruturas e seu desenho organizacional. Para os amantes da hierarquia rígida e da disciplina como filosofia de gestão, restará o árduo sabor de ficar gerindo as pessoas menos inovadoras e com o deprimente hábito de agradar o chefe.