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Ajude seus talentos a criar um portfólio, não um plano de carreira

Talentos não podem ser retidos. Eles podem ser engajados. As pesquisadoras norte-americanas Beverly Kaye e Julie Winkle fizeram um extenso trabalho sobre carreira que culminou na publicação do livro “Help Them Grow or Watch Them Go” (Ajude-os a crescer ou assista a eles irem embora, em tradução livre). A profunda investigação mostrou que pessoas talentosas são cuidadosas com a construção de suas carreiras e permanecem numa organização quando conseguem vislumbrar oportunidades e sentem confiança para realizar seus projetos. Quase 70% dos entrevistados afirmaram que a perspectiva de carreira na empresa é o fator-chave para permanecer ou ir embora.

Mas as transformações no mundo do trabalho e os impactos da pandemia nas relações entre profissionais e empresas vêm aumentando a complexidade para desenvolver e engajar esses talentos. A imprevisibilidade dos negócios não permite que a empresa ofereça promessas de cargos, por exemplo. Isso porque, o horizonte incerto das estruturas eliminou a ideia antiga de plano de carreira. Precisamos, agora, construir novas abordagens para o desenvolvimento profissional.

A escritora e palestrante April Rinne sugere, em recente artigo publicado na Harvard Business Review, a construção de um portfólio de serviços em vez de um plano de carreira. O portfólio é um conjunto de possibilidades de contribuição. Essas contribuições são como um mosaico de conhecimentos e interesses. Por exemplo, um profissional que está trabalhando na área de finanças pode construir suas reflexões de portfólio incluindo projetos em recursos humanos ou marketing. Esses interesses vêm de áreas de estudo, hobbies ou interconexão de temas de negócios.

A livre movimentação de talentos também é um fator-chave na construção dessa abordagem contemporânea. Dar liberdade para que os profissionais fluam e eliminar rituais atrozes para que uma pessoa consiga evoluir na carreira também fortalece o engajamento. A segurança psicológica para que o profissional se candidate livremente às vagas e projetos que surgirem na empresa é peça estratégica nessa filosofia de protagonismo.

Na pesquisa de Beverly, quase 60% dos entrevistados afirmaram que tinham receio de expor seus interesses de carreira com medo de contrariar seu líder e sofrer consequências ruins na organização. A cultura de comando e controle ainda é dominante. Essa mudança na forma de acolher os interesses de carreira inclui a revisão das estruturas lineares e a construção de modelagens mais fluidas como projetos, hubs ou squads que permitam ao profissional circular na empresa. O potencial de contribuição das pessoas pode estar além do cargo que ocupam. O portfólio é o mapa para essa zona de contribuição ampliada.

A construção de um portfólio de atividades também inclui reflexões de trabalho fora da empresa. O tabu das discussões sobre atividades paralelas precisa ser vencido.

Ao contrário do que muitos chefes pensam, indivíduos que realizam atividades fora da companhia são mais engajados. O espaço concedido é um combustível para que o profissional contribua e realize seus objetivos. Empresas rígidas e que mantém a ideia de dedicação exclusiva terão mais dificuldade para manter seus profissionais.

O trabalho de April Rinne mostrou que mais de 55% dos entrevistados gostariam de realizar atividades paralelas, como dar aulas e prestar consultoria. Exigir exclusividade ficou obsoleto. Nenhuma empresa garantirá emprego até a aposentadoria, portanto, não pode exigir que o portfólio de carreira fique restrito a ela. A liberdade para construção da trajetória é a melhor narrativa de carreira para engajar os talentos.

Quais as principais causas do turnover?

O turnover sempre existiu, mas nos últimos meses as empresas têm enfrentado um aumento considerável dos pedidos de demissão. O motivo: a grande maioria dos profissionais não quer mais voltar aos modelos tradicionais de trabalho. Rafael Souto, CEO da Produtive, participa da reportagem da BandNews TV, ao lado de Juliana Santana Moraes, Gerente de DHO na Wickbold, e contribui com o tema, trazendo pontos importantes sobre o aumento da rotatividade, dicas de como minimiza-la, os principais desafios das lideranças e organizações, e muito mais. Assista a reportagem na íntegra:

 

 

 

Esmalte híbrido não encobrirá gestão obsoleta

As novas configurações de trabalho requerem mais diálogos abertos e frequentes entre líderes e colaboradores, mas essa realidade ainda parece um sonho distante, na maioria das organizações. Rafael Souto, CEO da Produtive, fala sobre o tema em seu novo artigo para o Valor Econômico.

As empresas encontraram o caminho para o retorno aos escritórios. O avanço da vacinação e o baixo número de casos graves dão condições para construir opções ao severo confinamento a que fomos submetidos. Mesmo com o terrível impacto que a covid-19 gerou, a transformação na forma de trabalhar permitiu a todos uma profunda revisão no desenho de suas vidas.

As conclusões parecem inequívocas. Pesquisas apontam para a escolha massiva de modelos híbridos nas atividades de capital intelectual compatíveis com o trabalho remoto. Ninguém quer voltar ao antigo esquema totalmente realizado no escritório.

Segundo um estudo global da consultoria Pew Research Center, apenas 6% das pessoas pensam no retorno integral ao esquema antigo. O restante busca modelos híbridos ou totalmente remotos, sendo que 59% querem ter a opção de usar o escritório quando necessário e manter a opção de trabalhar em qualquer lugar. Entendem que a flexibilidade trouxe benefícios.

As organizações também reduziram seus custos com viagens, despesas operacionais e locação de espaços corporativos. Parece que o retorno integral para o escritório não é bom negócio para ninguém.

O caminho que se desenha é a mescla de momentos de trabalho no escritório e a possibilidade de trabalho em qualquer lugar. Porém, essa não é uma mudança trivial. O que está em jogo é muito mais do que o local de trabalho. Estamos diante de uma das mais profundas transformações na história das relações entre indivíduos e organizações. O mundo do trabalho que estamos desenhando impõe um novo pensar na forma de gerir, produzir e entregar resultados. É um jeito diferente de realizar atividades e de se relacionar.

Do ponto de vista da liderança, temos um enorme desafio. Os líderes do século passado foram turbinados com modelos de gestão baseados em comando e controle. O contrato psicológico de trabalho era guiado pela empresa. Os indivíduos estavam submetidos às imposições da companhia como forma de garantir o emprego.

Nesse milênio, começamos a ver uma nova formatação. As pessoas passaram a exigir uma configuração diferente de trabalho. Essa nova ordem exige diálogo, construção coletiva e colaboração. O modelo híbrido será mais uma etapa nesse processo de transformação.

Como afirmou a consultora Carolyn Taylor, especializada em cultura, em recente entrevista publicada no Valor, essa é uma caminhada que exige paciência. A mudança precisa considerar a inclusão daqueles que estão no trabalho remoto. O líder não pode privilegiar os que estão no escritório e criar um impasse político que deixe os funcionários remotos com a sensação de que não estar no trabalho presencial é ruim para a carreira. A gestão a distância tem como base a construção de relações de confiança e exigirá novos rituais e conversas frequentes sobre desenvolvimento e performance.

Dados mostram que estamos distantes dessa realidade. Estudo do Gartner mostrou que 70% dos entrevistados não se sentem confortáveis em dizer o que pensam sobre suas carreiras. Mais da metade percebe que seu líder não está interessado em ajudá-lo em seu crescimento profissional, e quase 80% dos entrevistados não se sentem encorajados a explorar possibilidades internas pelo medo de que seu gestor se sinta traído.

Esses números apenas relatam a experiência de quem está no mundo real das empresas. Os sistemas autoritários ainda prevalecem. O diálogo aberto é um sonho distante. Nesse árido cenário, estamos desenhando um novo modelo que exige um conjunto avançado de práticas ainda não consolidadas. O caminho será investir tempo na verdadeira transformação na forma de gerir pessoas e não apenas na cosmética corporativa de embalar práticas velhas com nomes simpáticos.

O líder conselheiro e a gestão aberta de talentos

O engajamento e a experiência dos profissionais dentro das organizações são assuntos de relevância. Entender como o líder pode atuar como conselheiro e incentivando reflexões de carreira de seu time é crucial para a manutenção do profissional na empresa. Os espaços vagas de diálogos e a ideia antiga de manter o talento preso numa área ou a serviço dos interesses do líder, destrói o engajamento e afasta as relações.

 

 

Vivemos em um período de intensa transformação e com desafios crescentes para a gestão de pessoas. A busca pelo engajamento dos profissionais e a construção de uma experiência favorável para os empregados é um tema atual e presente na agenda das empresas.

O peso do flagelo de 14 milhões de desempregados no país e a batalha pelos profissionais qualificados nunca foram tão intensos. Contratar e manter os chamados talentos alcançou seu auge. O paradoxo de desemprego elevado e ao mesmo tempo a falta de profissionais qualificados no mercado não é um aspecto novo, mas está se acentuando.

Nessa linha, não basta ter os profissionais qualificados, é fundamental construir estratégias de engajamento. Algumas empresas insistem nas equivocadas políticas de retenção, que normalmente estão baseadas em revisão de benefícios e ofertas de aumento salarial dadas na última hora quando o profissional ameaça sair ou pede demissão. Políticas reativas que se baseiam em generalizações tendem a não dar o resultado adequado, pois não se conectam com o problema central e tratam apenas da última milha do problema.

Os dados mostram que profissionais mais talentosos, ou com melhor performance, são os mais preocupados com suas carreiras. Esse grupo de pessoas permanece numa organização se perceberem possibilidades para construir seu projeto de vida. Nenhuma empresa consegue oferecer um plano de carreira linear e previsível como acontecia no passado. Portanto, a liderança da organização terá cada vez mais o papel de atuar como alguém que discute e facilita a construção da carreira. É o líder atuando como um conselheiro de carreira. Alguém capaz de conversar sobre desenvolvimento e apoiar a construção da trajetória profissional de seu liderado, independente do caminho ser na sua área, em outro setor ou até mesmo fora da organização.

A ideia de favorecer a construção da carreira traz para a liderança um papel que ultrapassa a gestão de pessoas e a sucessão na área. Diz respeito a apoio para que o indivíduo faça reflexões e construa seu mosaico profissional no decorrer de sua trajetória. Como diz o brilhante Mark Savickas, a carreira não surge, é construída. Nesse sentido, líder e liderado discutem de forma aberta as estratégias de carreira e ações de desenvolvimento que façam sentido para a carreira do individuo.

As pesquisadoras Beverly Kaye e Julie Winkle produziram um extenso trabalho que mostra os fatores de engajamento e de perda de talentos. Os estudos resultaram num livro chamado “Ajude-os a crescer ou assista eles irem embora”. As autoras mostram que 66% dos motivadores de troca de trabalho residem na ausência de uma liderança disposta a apoiar de forma genuína o desenvolvimento do profissional. Esse vazio de diálogo e a ideia antiga de comando e controle para manter o talento preso numa área ou a serviço dos interesses do líder, destrói o engajamento e afasta os melhores profissionais.

Realizar discussões de carreira e a forma aberta de encarar a mobilidade das pessoas não tratam do futuro do trabalho. Estamos debatendo o presente necessário para lidar com o cenário imprevisível e a necessidade crescente de obter o máximo das pessoas.

 

Por que o vírus exigirá líderes com um modelo mental mais moderno

Neste momento em que equipes estão sendo desafiadas a trabalhar numa situação incomum e imprevisível, surge a necessidade de um modelo de liderança capaz de engajar e desenvolver pessoas no caos. Em seu novo artigo para a VOCÊ S/A, Rafael Souto, CEO da Produtive, discorre sobre este tema, indicando estratégias para a liderança ser mais efetiva e com modelo mental mais moderno.

Chefes que coordenam os times baseados em hierarquia rígida, comando e controle, terão de repensar modus operandi no contexto pós-pandemia

Não é de hoje que discutimos a transformação dos modelos de gestão para lidar com a rápida evolução dos negócios e do trabalho contemporâneo. E a pandemia de coronavírus é um acelerador dramático dessas mudanças.

Os já fragilizados modelos de liderança baseados em hierarquia rígida, comando e controle, por exemplo, foram postos em cheque. O mesmo acontece com a dificuldade de chefes falarem com times sobre carreira. Delegar essas conversas difíceis para a área de recursos humanos é uma atitude que ficará no passado.

Neste momento em que diversas equipes estão em home office, sendo desafiadas a trabalhar numa situação atípica e bastante imprevisível, surge a necessidade urgente de um modelo capaz de engajar e desenvolver pessoas no caos.

Certa vez, eu estive em um almoço com o guru de negócios Ram Charan conversando sobre os desafios de gestão. Num tom incisivo, o indiano e mentor de muitos CEOs importantes indagou: “Quer saber se um executivo é mesmo orientado a pessoas?”. Fiquei atento e logo veio a resposta: “Basta olhar a agenda da próxima semana”. E ele prosseguiu: “Veja quanto de tempo ele investe em conversar sobre os funcionários, ou se o seu foco está somente nos processos e nas metas”.

Esse célebre professor de Harvard resumiu em uma fala o que hoje entendemos como o novo jeito de pensar sobre carreira e trabalho. A vida profissional não se resume aos seus papéis no trabalho atual. Essa ideia, chamada de “life design”, ganhou força nos últimos anos quando diversos estudiosos do tema consolidaram essas reflexões, entre eles o expoente professor Mark Savickas, da Universidade de Kent, nos Estados Unidos.

Considerando que a vida no trabalho abarca vários aspectos, o líder precisa integrar na sua avaliação a saúde física, o equilíbrio emocional, o contexto familiar e os interesses futuros de cada funcionário. Ou seja, fazer gestão de pessoas significa conversar sobre carreira, vida pessoal, sonhos e expectativas.

Num contexto de pandemia não podemos isolar os aspectos pessoais. O engajamento se dá quando a liderança compreende os aspectos de vida dos indivíduos e consegue dar apoio para o seu desenvolvimento. E isso não significa abrir mão das metas e rotinas operacionais, mas sim incluir conversas mais amplas sobre a vida do indivíduo.

Tenho falado constantemente sobre a importância da confiança como moeda organizacional. É o combustível do novo mundo do trabalho. Se a liderança estabelece uma relação com vínculo e confiança, conseguirá melhores resultados. Não à toa, um estudo recente da consultoria Gartner mostrou que 88% dos entrevistados não se sentem confortáveis para revelar suas intenções sobre carreira ou compartilhar dificuldades com seus gestores. O medo e a falta de transparência ainda são preponderantes, embora o discurso corporativo e os valores fixados na parede dos escritórios explorem a retórica da transparência e da comunicação aberta.

Confiança é a nova moeda organizacional

Profissionais não sentem confiança em ter conversas sinceras sobre carreira com a liderança. É sobre este tema que Rafael Souto, CEO da Produtive, discorre em novo artigo para o aplicativo da Você RH.

O novo mundo do trabalho traz desafios profundos para a gestão de pessoas. A principal  elas é que estamos diante de um novo contrato psicológico de trabalho.

Durante muitos anos, vivemos os modelos da obediência cega. Nele, o profissional aceitava as imposições de seu chefe e da organização sem muito questionamento.

A organização do trabalho e os movimentos de carreira eram definidos por comando e controle. Essa lógica foi predominante durante todo o processo de desenvolvimento industrial e entrou em colapso nos últimos anos.

No Brasil, após 1994, com a estabilização econômica e a maior possibilidade de fazer planejamento de vida, iniciou-se uma nova dinâmica das relações de trabalho.

Até então, em um país em que não era possível prever o preço do pão francês da semana seguinte, pensar a carreira e discutir questões como satisfação profissional eram ações inimagináveis. As pessoas viviam em modo de sobrevivência em um contexto de desordem econômica e inflação descontrolada.

O fenômeno da globalização também acendeu uma luz de alerta, em que a carreira não poderia ficar na mão da empresa. As mudanças mais frequentes de controle de capital, de estrutura e de novas habilidades determinaram um aumento necessário no protagonismo do indivíduo para cuidar da sua carreira.

Um grupo significativo de pessoas passou a questionar mais a gestão de sua carreira, a exigir líderes mais preparados para diálogos e a não aceitar mais o modelo de obediência cega.

Nesse cenário, surge um novo contrato psicológico. O funcionário da empresa não é mais um recurso que vai sendo utilizado de acordo com o projeto empresarial. Ele passa a avaliar o impacto do trabalho no desenho de sua vida, com temas de carreira, como saúde, família e propósito. E aí a confiança é a chave disso.

Em um recente estudo da consultoria Gartner, entre os fatores de perda de talentos na organização está a falta de perspectiva e diálogos de carreira: 68% dos entrevistados afirmaram não sentir confiança para discutirem, de forma aberta, os seus interesses de carreira com seus gestores.

A pesquisadora norte-americana Rachel Botsman estuda a confiança na nova  economia e afirma que essa será a chave para as relações de consumo e de trabalho.

Em um de seus levantamentos, ela concluiu que apenas 20% dos profissionais sentem liberdade para dialogar de maneira transparente com seus líderes.

E 56% dizem preferir ter conversas de carreira com outras pessoas, porque sentem que o líder direto não irá ouvir ou poderá fazer retaliações, dependendo do rumo da conversa. Em um dos artigos que escrevi para este aplicativo, mostrei que essa realidade se chama a deprimente necessidade de agradar o chefe.

Pela falta de confiança, o indivíduo diz para seu chefe aquilo que ele gostaria de ouvir sobre a sua carreira. Além de deprimente, isso significa o oposto do ambiente de trabalho ideal.

Os dados mostram que estamos diante de um grave problema. Boa parte das pessoas não sente confiança para dialogar sobre suas expectativas e tem receio de seus chefes, que ainda são viciados no modelo de comando e controle.

Temos um desafio fundamental de transformação cultural. Precisamos encorajar líderes a construírem relações de confiança e a entenderem que o gestor da carreira é o indivíduo, mas que é papel deles provocar reflexões e ajudar o profissional a construir seu projeto de carreira, a buscar oportunidades na área e em outros setores da empresa ou até mesmo no mercado se o ciclo na organização já estiver concluído.

A confiança e o interesse genuíno no desenvolvimento das pessoas são ações que aumentam o engajamento e serão cada vez mais cruciais para a gestão de pessoas.

 

Se tudo é imprevisível, faça estas 2 coisas para gerir sua carreira no século 21

A previsibilidade da carreira acabou pela própria imprevisibilidade dos negócios. Plano de carreira com próximos passos definidos não é mais o jeito de se pensar a carreira. Rafael Souto, explica o que é exigido do profissional nessa nova configuração em vídeo publicado na Exame.com.

A viúva do trator e o futuro do trabalho

É nítido que vemos separação de grupos de profissionais quando o assunto é transformação das áreas. É sobre esta escolha que o CEO da Produtive, Rafael Souto, fala em seu artigo para o Valor Econômico. Confira:

 

Em tempos de profundas mudanças no mundo do trabalho uma das reflexões mais relevantes a fazer é como se manter competitivo e navegar nas ondas da transformação. Considerando que a carreira não surge, mas é uma construção baseada nas experiências que vão se somando ao longo da trajetória profissional, a organização das estratégias e dos investimentos na carreira somados ao comportamento exploratório vão oferecendo ao profissional condições de evoluir, se consolidar e prosperar no mercado.

A base de uma carreira é determinada por um conjunto de fatores. Me refiro a esses fatores como pilares, que são: satisfação e propósito, gestão financeira, saúde, networking, reputação e competitividade.

Organizar planos baseados nesses pilares é o que chamamos de planejamento contemporâneo de carreira. Como cita o professor e pesquisador Mark Savickas, a consideração sobre o futuro é uma dimensão importante do protagonismo na carreira. Então, é preciso investir tempo e energia nessas reflexões.

Em meio a isso, surge a competitividade, um dos pilares fundamentais para o profissional e o valor de sua carreira no mercado. Ele refere-se ao foco, à área de atuação e aos conhecimentos técnicos adquiridos ao longo do percurso.

Segundo o professor do MIT, especialista em carreira e estudioso sobre o futuro do trabalho, Thomas Malone, vivemos em uma era de hiperespecialização. Ele representa uma voz dissidente das conversas mais simplistas sobre o tema e provoca de forma incisiva os modismos sobre o rumo do mercado e das carreiras. Malone acredita que a visão geral de negócios é um complemento da carreira, mas o foco é o principal elemento de sustentação. O profissional que não tiver uma área de domínio e capacidade de realização específica será sempre preterido nos processos seletivos e ficará sem caminhos na organização. A visão holística é um aspecto importante, mas é acessório em relação ao foco.

Podemos perceber isso todos os dias. Basta analisar as oportunidades de trabalho e as contratações. A capacidade de entrega focada é o elemento chave. Entende-se como foco as chamadas macro áreas de carreira, como exemplo: vendas, finanças ou tecnologia de informação. Cada uma dessas áreas é um possível foco de carreira.

Por isso, a reflexão de Malone certamente faz sentido e podemos observar seus resultados no ambiente corporativo, todavia, ela não responde a uma questão central. Será que basta ter uma área foco bem consolidada para ter competitividade em um mercado em rápida transformação?

Para responder a esta questão, usamos o conceito de “gap” de oportunidade ou zona de ampliação do foco. O fato de ser um especialista em vendas com ótimos resultados pode garantir um bom trabalho hoje, mas talvez não o garanta nos próximos anos. Esse espaço de oportunidade é a leitura de tendências e o investimento nos novos conhecimentos que vão determinar o futuro daquela área.

Para ilustrar isso, vou citar um caso. Há alguns meses, estive com um executivo do setor do agronegócio. Ele relatou os incríveis avanços na área e as tendências de automação de equipamentos. Mencionou que estavam se formando dois grupos na empresa. O primeiro era a divisão dos incrédulos e insatisfeitos com a automação. Diziam que iriam perder empregos e que os projetos de automação não funcionariam. Já segundo grupo foi daqueles que queriam conhecer o novo e estavam curiosos para aprender sobre drones e máquinas autônomas. Essa primeira turma ficou apelidada como “Viúvas do Trator”. Pensavam nas perdas e nos riscos da automação e não nos ganhos.

Vemos essa divisão acontecer em todas as áreas em transformação. O espaço de oportunidade para aproveitar é a conexão com o novo. É a busca do conhecimento que irá transformar cada uma das áreas de negócio. É provável que algumas atividades desapareçam, mas a maioria delas vai se transformando.

Podemos eleger um grupo sem fim de novos conhecimentos que irão transformar as áreas como as conhecemos. O marketing digital, o “people analytics”, os conceitos da indústria 4.0, o compliance, entre tantos que foram criando espaços de oportunidades para os profissionais de cada uma dessas áreas.

A desocupação estrutural é um desafio que a sociedade terá de enfrentar, porque, de fato, muitos profissionais não acompanharão as mudanças e não terão qualificação para os novos trabalhos. Já, para cada um de nós, cabe elaborar as estratégias e tomar decisões para não ficarmos obsoletos. Buscar mapear os espaços de transformação e novos conhecimentos todos os dias. Ou, então, entrar para o grupo das viúvas do trator e ficar esperando os últimos dias de competitividade no mercado.

Os efeitos perversos de uma cultura hierárquica na gestão de pessoas

Com a necessidade de reestruturação das empresas em função da globalização, o sistema em que as carreiras são controladas de maneira previsível dá sinais de colapso. Rafael Souto, CEO da Produtive, faz uma reflexão sobre este tema em seu novo artigo para o Valor Econômico.

A discussão sobre cultura organizacional e seu impacto nos negócios não é nova. A cultura pode ser definida como o conjunto de crenças e práticas que, ao longo do tempo, vai se enraizando na organização. É aquilo que se faz em uma empresa e não o que gostaria que fosse feito.

No que se refere à forma de organizar e estruturar o trabalho e as carreiras, as empresas optaram por um modelo piramidal baseado em comando e controle para gerir as pessoas. Isso há mais de 70 anos.

A forma de desenvolver as carreiras em uma empresa era definida por um plano que tinha um conjunto descrito de regras para crescer. Esse modelo prosperou pela previsibilidade, largas estruturas com diversos cargos e níveis, e serviu de mantra organizacional por anos.

A lógica do plano de carreira, modelo hierárquico, crescimento linear e comando e controle na gestão de pessoas moldou a forma de trabalhar e administrar as empresas.

Já tem algum tempo que esse sistema vem sofrendo pressões por não representar a dinâmica exigida pelos negócios do século XXI. Desde o final do século passado, com a necessidade de reestruturação das empresas em função da globalização, esse sistema em que as carreiras eram controladas de maneira previsível dá sinais de colapso. A necessidade de inovar, acelerar mudanças nos negócios e atrair talentos tornaram esse modelo antiquado.

O problema é que ele está profundamente enraizado na cultura de um número significativo de empresas e na forma de trabalhar de muitos líderes.

O Profº da Columbia University, Dr. Tomas Chamorro-Premuzic, em recente artigo, apresentou uma pesquisa sobre como profissionais talentosos naufragam nas culturas tóxicas e hierárquicas. Esse modelo tradicional de gestão hierárquica traz consigo diversos efeitos perversos. Talvez o mais agressivo para o engajamento das pessoas seja o impacto nos movimentos da carreira. Limitados na sua área e com medos decorrentes de um sistema de comando e controle, os profissionais arriscam pouco, não exercitam sua curiosidade e ficam reféns de gestores autoritários.

É aí que alimentamos um sistema fadado ao caos. As empresas estão com estruturas cada vez mais enxutas e sem condições de oferecer crescimento linear e previsível como tinham no passado.

Outro dano da cultura hierárquica é a de limitar o protagonismo dos indivíduos. Sem espaço para dialogarem sobre suas carreiras e fluírem na estrutura, as pessoas devolvem para a empresa a responsabilidade que deveriam ter sobre suas carreiras. Então, entramos em um modelo circular em que todos os lados estão insatisfeitos.

O modelo hierárquico talvez não possa ser extinto. Nem todas as empresas podem ou devem romper totalmente com a hierarquia. Também não é razoável pensarmos que elas irão operar no modelo de holocracia, como os exemplos da Zappos, Spotify ou Amazon. Mas, precisamos construir alternativas ao cansado sistema hierárquico tradicional.

Os modelos híbridos baseados na construção de estruturas mais flexíveis são uma alternativa para favorecer movimentos laterais e permitir que as pessoas fluam na organização sem ficar restrito ao seu cargo para contribuir. A hierarquia não é rompida totalmente, mas permite ter outras formas de evolução na carreira.

Investir tempo na construção de uma cultura de trabalho mais arejada e com novas formas de desenvolvimento também permitirá ao indivíduo exercer seu protagonismo na carreira. Cabe ao profissional refletir sobre seus caminhos e construir essa jornada.

Líderes mais capacitados para esse diálogo contemporâneo e com a visão de que seu papel é colaborar para o crescimento das pessoas serão os verdadeiros agentes dessa transformação.

Premiar erro dá coragem para inovar sem medo

Em reportagem para o Valor Econômico, Rafael Souto é entrevistado e fala sobre como fazer a gestão de erros como fator chave para a inovação dentro das empresas. Ele acredita que, mesmo quando adota o discurso de incentivo à inovação, a maioria das empresas ainda é pouco tolerante ao erro na prática.

Em 2018, os funcionários da farmacêutica Sanofi foram convidados a participar de uma votação curiosa: escolher o maior erro cometido dentro da companhia no ano anterior. Organizado pela própria empresa, o concurso recebeu 22 candidaturas a “erro do ano” e teve votos de 184 funcionários. Os ganhadores – uma equipe de uma das marcas de medicamentos que tentou promover, pela primeira vez, distribuição de amostras para médicos, mas na pressa descobriu que o processo disponível não era adequado – levaram para casa prêmios simbólicos, entre eles um “valecoragem”, que representava a aprovação por parte da empresa de que a equipe, apesar do erro, agiu certo.

Nos últimos anos, muitas companhias deram início a uma corrida para promover mais inovação internamente e assim sobreviver em um mundo marcado pelo desenvolvimento rápido da tecnologia e pela chegada de novos players aos mais variados mercados. Criação de áreas de inovação, parcerias com startups, mudanças para espaços de coworking, tentativas de transformar a cultura e uma sopa de letrinhas de novos jargões importados do Vale do Silício tomaram conta do discurso de altos executivos. Mas em um mundo corporativo avesso a erros, muitas companhias esbarraram, assim como os funcionários da Sanofi, em uma das características mais comuns aos processos de inovação: antes de acertar, é preciso experimentar, testar e, por consequência, errar.

A Sanofi decidiu criar iniciativas para diminuir o estigma do erro entre suas equipes quando a empresa percebeu que o crescimento da companhia estava sendo sustentado pelo lançamento de novos produtos, conta o diretor de recursos humanos Pedro Pittella. “Olhando para a frente, vimos que sem mais inovação não íamos bater metas”, diz. A empresa, que está no meio de uma mudança cultural que deve durar até 2020, identificou com pesquisas de clima que para ter mais inovação precisaria diminuir o medo de errar dentro do ambiente de trabalho. A palavra “coragem” foi listada como um dos valores da organização, e um comitê de funcionários foi montado para pensar em ideias práticas para acompanhar o discurso.

O concurso de erros veio junto com a formulação de uma “régua” com sete níveis diferentes de erros, do “inadmissível” ao “bom”. “Não é qualquer erro que está valendo, um erro de compliance, por exemplo, não é aceitável”, diz Pittella. Já erros decorrentes da experimentação, como o vencedor, foram considerados positivos. A premiação aceitou indicados a melhor acerto e a melhor erro, e as equipes enviaram vídeos que ficaram disponíveis na intranet da empresa para os funcionários votarem no preferido. Ao todo, 39 vídeos foram recebidos de 10 áreas da empresa – o saldo total foi de mais erros do que acertos. A nova edição do concurso, que vai escolher o maior erro de 2018, já está em andamento.

A expectativa é que, como parte do processo de expor os erros, os funcionários conversem mais sobre os equívocos e o que aprenderam com eles. “Não é só o alto escalão que faz essas coisas acontecerem, a companhia inteira tem que estar na mesma vibração porque um processo de produto passa por várias áreas”, diz Pittella. O nome da premiação da Sanofi é “Oops. Lições Aprendidas”, nome emprestado de um conceito já tradicional na área de gestão do conhecimento: o mapeamento do que deu certo e do que deu errado após o término de projetos e o registro de “lições” para que iniciativas futuras possam evitar cometer os mesmos erros. Dessa forma, o aprendizado não fica restrito à memória dos participantes – que podem deixar a companhia – e é formalizado como conhecimento institucional. Na Siemens PLM, reuniões de avaliação acontecem após o término de projetos estratégicos. É quando a equipe se reúne e analisa o que deu certo e o que pode ser tirado como uma “lição aprendida”. O relatório final fica disponível em um banco de dados interno, que pode ser acessado por qualquer funcionário. “As reuniões de troca de experiências e avaliações de projetos são bastante importantes, pois assim aprendemos a lidar com o erro. Compartilhar essas informações internamente evita problemas similares no futuro”, diz Naira Barros, gerente de RH da empresa.

Rafael Souto, CEO da Produtive, acha que, mesmo quando adota o discurso de incentivo à inovação, a maioria das empresas ainda é muito pouco tolerante ao erro na prática. “No dia a dia, as organizações ainda são totalmente focadas nos resultados de curto prazo“, diz. Em seu trabalho com outsourcing, ele diz já ter encontrado executivos que foram demitidos após projetos de inovação não darem resultado imediato – o que, na sua opinião, manda uma mensagem muito ruim para o resto da empresa. Para Souto, é preciso separar os erros que acontecem por imperícia ou vaidade – ignorar dados que apontam para um resultado negativo, por exemplo – daqueles que são fruto da experimentação, da curiosidade e da iniciativa.

Uma série de pesquisas publicadas no ano passado na “Harvard Business Review” fez um retrato das dificuldades que a curiosidade e a experimentação enfrentam dentro de grandes empresas. Em um estudo com 250 funcionários, a professora de Harvard Francesca Gino fez uma série de perguntas para medir a curiosidade de profissionais que haviam acabado de começar um novo emprego. Seis meses depois, fez uma nova medição e descobriu que o nível de curiosidade deles havia caído em média 20%. Cerca de 70% dos 3 mil respondentes de outro estudo disseram que enfrentam barreiras para fazer questionamentos dentro da empresa, e apenas 24% reportavam sentir curiosidade no ambiente de trabalho. Uma pesquisa do Insead com 23 mil profissionais de todos os níveis hierárquicos apontou que, enquanto 83% dos executivos dizem encorajar “bastante” a curiosidade nas suas empresas, 52% dos demais funcionários concordam com eles. Cerca de 50% das chefias acreditam que a curiosidade é recompensada financeiramente, mas só 16% dos demais profissionais acham o mesmo. “Se você não consegue criar uma distinção no jeito de operar e avaliar as pessoas para permitir que o erro de inovação não seja redutor de performance, não há cultura de inovação”, diz Souto.