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O ecossistema colaborativo e o sucesso profissional

No cenário de rápida transformação, as carreiras não podem ser construídas isoladamente. Em vez disso, elas florescem em ecossistemas colaborativos, onde indivíduos compartilham conhecimento, ideias e oportunidades. O poder transformador da cooperação pode impulsionar a trajetória profissional, elevando o nível de atratividade e afastando o fantasma da obsolescência. 

Há alguns dias estive com o professor Ita Green que veio ao Brasil para um evento sobre inovação. Esse brilhante pesquisador israelense lidera um dos maiores centros de tecnologia do mundo ligado à Universidade de Tel Aviv.

Sobre o impacto da inteligência artificial no mundo do trabalho, respondeu: “não será a inteligência artificial que irá substituir seu trabalho, mas sim aquele que estiver trabalhando com a inteligência artificial”. A singela e poderosa mensagem reflete a importância da evolução a qual estamos desafiados em nossas carreiras.

A inteligência artificial é um tema inquietante pela disrupção dos modelos que estávamos acostumados. Porém, em todas as áreas vêm ocorrendo mudanças que nos provocam a permaneceremos relevantes no mercado. Como inovar e fazer boas escolhas?

Assim como uma orquestra, o ecossistema colaborativo é composto por diversos talentos e habilidades. Precisamos aprender a reconhecer as sinergias entre diferentes áreas e a orquestrar colaborações para alcançar resultados excepcionais.

Em um ecossistema colaborativo, a aprendizagem é constante e dinâmica. É essencial explorar formas de compartilhar conhecimento e aproveitar as habilidades de outros para acelerar o crescimento pessoal e profissional. Troca de experiências e mentorias são fonte inesgotável de inspiração e desenvolvimento.

O coração de um ecossistema colaborativo reside na empatia e na comunicação eficaz. Aprenda a sintonizar-se com as necessidades e expectativas dos outros, cultivando relacionamentos autênticos e construtivos. A difícil arte da escuta ativa e da expressão clara para que as interações fluam é parte central.

A verdadeira riqueza de um ecossistema colaborativo reside na diversidade de vozes e perspectivas. Descubra como promover um ambiente inclusivo, onde todas as vozes são valorizadas e respeitadas. Explore o poder da diversidade para impulsionar a criatividade, a inovação e a solução de problemas complexos. Aprenda com a diversidade cognitiva.

É fundamental ter intencionalidade na construção de alternativas de conexão muitas vezes fora da área ou setor no qual trabalhamos.

Recente estudo do Instituto Gallup mostrou que a 25% dos profissionais fazem ações organizadas para construção de redes colaborativas. Em outras palavras, apenas um quarto dos profissionais fazem de forma intencional conexões e mantém de forma organizada esse pilar da carreira.

A maior parte vive uma bolha ligada ao negócio que trabalham e só usam intencionalmente a rede de contatos quando precisam de algo objetivo, como encontrar um emprego ou resolver algo complexo em sua atividade. O uso é transacional e não transformacional.

É fundamental crescer através da coopetição.  A coopetição, a mistura de cooperação e competição, pode ser um catalisador poderoso para o crescimento. Aprender a navegar pelas dinâmicas de concorrência saudável, onde todos se beneficiam com a colaboração, descobrindo como transformar rivalidades em parcerias estratégicas que ampliam as oportunidades a todos.

Em um mundo interconectado, o sucesso não é alcançado individualmente, mas sim por meio da colaboração. Precisamos superar modelos antigos de construção da carreira para um modelo mais fluído.

Ao cultivar ecossistemas colaborativos você se torna um maestro, une talentos, habilidades e ideias para criar uma sinfonia profissional única.

Abra-se a novas possibilidades, explore as sinergias e esteja disposto a contribuir e receber. Quando colaboramos, nossas carreiras ressoam em harmonia e alcançam novos patamares.

Personalização do trabalho: customizando trilhas de desenvolvimento

A customização da experiência de desenvolvimento numa organização é uma das principais tendências de atração de talentos. Em um contexto de incertezas, marcado por mudanças velozes, a uniformidade para modelos de gestão de pessoas tornou-se tão antiquada quanto a oferta de um plano de carreira. E isso é parte de uma profunda transformação no mundo do trabalho.

Durante muito tempo, a carreira era da empresa. Estudava-se para obter um emprego e a carreira passava, dali em diante, a ser conduzida pela companhia, por meio de um plano de carreira, previsível e linear. A era do emprego acabou. Hoje estamos no que venho chamando de era da personalização, marcada pela individualização do projeto de carreira, onde a gestão é feita pelo próprio indivíduo.

Os ciclos encurtaram e a trajetória profissional, antes vista unicamente como uma sequência de cargos, é entendida atualmente como um conjunto de experiências significativas de trabalho. Está na base da personalização que a escolha do caminho seja do indivíduo.

Uma das principais dúvidas sobre a adequação desse modelo de carreira está na escalabilidade dele. É muito comum ouvir de profissionais de RH: como falar em personalização para uma grande operação?

Na prática, a base cultural da personalização é adaptável a grandes e pequenas empresas. São cinco os alicerces formados por comportamentos e atitudes possíveis em pequena e grande escala.

1. Protagonismo e responsabilização do indivíduo sobre a carreira A carreira é do indivíduo. Cada profissional deve ser encorajado a identificar seus interesses e objetivos de carreira e assumir o controle de seu próprio desenvolvimento.

As organizações devem criar uma cultura que valorize a autogestão e a aprendizagem contínua, capacitando os trabalhadores a tomarem decisões e traçarem seus próprios caminhos de crescimento. A empresa pode oferecer (parte do) recurso para que cada um faça o seu caminho.

Muitas empresas têm conseguido dar protagonismo aos funcionários em oferecendo no trilhas customizáveis de desenvolvimento. A personalização é uma das funcionalidades de softwares educacionais LMS (abreviação para Learning Management System) que gerenciam, organizam e oferecem material de treinamento online.

2. Diálogos para apoiar o desenvolvimento É fato que a mudança de um padrão ancorado em comando e controle por 100 anos para um modelo de protagonismo individual pode deixar muitos trabalhadores se sentindo perdidos.

Daí a importância do papel do líder-conselheiro. O líder dá suporte ao desenvolvimento dos funcionários. Eles devem investir tempo em conhecer os interesses e ambições individuais de suas equipes.

Através de diálogos regulares sobre a vida profissional, os líderes podem atuar como conselheiros de carreira, fornecendo orientação, apoio e feedback construtivo.

O simples ato de dialogar sobre carreira aumenta o engajamento dos trabalhadores, criando um ambiente propício ao crescimento pessoal e profissional. O líder que desenvolve talentos dialoga sobre carreira com a equipe.

3. Livre-movimentação Para que as trilhas personalizadas de desenvolvimento e carreira sejam eficazes, é fundamental que as organizações ofereçam segurança psicológica e liberdade de movimentação interna.

Os funcionários devem estar confortáveis para dizer o que pensam e explorar diferentes áreas e funções, adquirindo novas habilidades e ampliando sua experiência. A mobilidade interna não apenas desenvolve e enriquece a trajetória profissional do trabalhador, mas também contribui para a retenção de talentos e o compartilhamento de conhecimentos dentro da organização.

4. Estímulo à curiosidade A curiosidade é a bússola da jornada de aprendizagem e já dediquei a minha coluna de maio deste ano falando da sua importância. Ao criar um ambiente que valorize a curiosidade, as organizações cultivam uma cultura de aprendizagem, inovação e de aprimoramento constante.

As organizações devem incentivar a curiosidade dos funcionários, proporcionando-lhes oportunidades de aprendizado e crescimento. Isso pode incluir a participação em projetos desafiadores, a realização de cursos e treinamentos relevantes, a oferta de conteúdo relevante e o estímulo à busca por novos conhecimentos.

5. O novo PDI (Plano de Desenvolvimento Individual) Há muito tempo, o PDI tem sido usado como ferramenta para organizar e colocar em prática as ações de desenvolvimento técnico e comportamental.

Construído e acompanhado em conjunto pelo profissional e seu líder, o novo PDI não está mais a serviço da correção de problemas de performance apontados pela liderança. A personalização passa pelo estímulo para que cada um construa o seu projeto de carreira, com base em seus interesses, ambições, satisfação e propósito. Nesta nova abordagem, o PDI é o reflexo desse projeto, complementado com inputs dos gestores, sobre performance e resultados.

O novo PDI está a serviço do projeto de carreira do trabalhador. Isso é, por definição, a personalização do trabalho.

Férias sem limite é benefício para atrair nova geração

No início de 2022, Sofia Helena de Oliveira Barbosa, começou como gerente de produto na Nilo Saúde, empresa de softwares para gestão de relacionamento e cuidado ao paciente. Um dos motivos que a atraiu para trabalhar na healthtech foi o estilo de gestão. A empresa segue, por exemplo, uma prática que começou nos anos 2000 em pequenos negócios do Vale do Silício e se difundiu depois entre companhias como LinkedIn, Bumble e até no banco de investimentos Goldman Sachs: as férias ilimitadas. Esse modelo permite que o funcionário tire o tempo de descanso que for necessário, sem dias fixos e o limite de 30 dias previstos pela CLT. A prática ainda é novidade no Brasil, mas algumas startups já começam a aderir.

“Já tinha marcado para o final de maio um intercâmbio para aperfeiçoar o inglês. Era um plano desde 2020 e não queria deixar de lado”, conta Barbosa. Segundo ela, ao levar a questão para a entrevista, ficou sabendo das férias ilimitadas e que não havia problema em manter a viagem. Era o que faltava para aceitar a proposta. “No começo fiquei apreensiva, pois estava começando na empresa e nunca tinha trabalhado num local com essa flexibilidade, mas a organização e a cultura da Nilo para que o benefício funcione ajudou muito”, conta Barbosa.

 

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A ação é reflexo dos novos tempos, nos quais a flexibilidade na jornada de trabalho é um pilar de atração e retenção de talentos, além de essencial para manter a saúde mental e física em dia. Segundo pesquisa global feita pela consultoria Gartner com mais de quatro mil profissionais, 93% dos líderes de RH estão mais preocupados com o esgotamento dos funcionários. E recompensar o excesso de trabalho com folgas é visto como uma ferramenta de atratividade. A ideia não é atuar depois do cansaço ou de as doenças surgirem e, sim, antes. Uma das projeções da consultoria é, inclusive, que as companhias mais competitivas serão as que priorizam o descanso.

“Estamos na era da personalização e muitas empresas já flexibilizam as férias, mas quando falamos em dias de folga sem limites, é essencial tomar cuidado para que isso não vire uma ideia de que as pessoas podem trabalhar quando quiserem, numa visão de mundo cor-de-rosa”, diz Rafael Souto, CEO da consultoria Produtive. Segundo ele, é essencial oferecer orientações gerais e trabalhar para construir uma cultura de autonomia com responsabilidade. “Saber usar a liberdade é uma construção.”

Isadora Kimura, cofundadora da Nilo Saúde, que tem 120 funcionários, reforça que não se trata de incentivar as pessoas a tirarem folgas o tempo todo, mas mostrar que o time tem autonomia para identificar, por exemplo, se precisa de um tempo para cuidar da saúde mental. “Vemos muitos casos de pessoas no limite, mas que não têm coragem de pedir folga ao gestor. Aqui queremos que as pessoas se sintam donas do seu bem-estar e não precisem adoecer para ter um tempo livre”, afirma Kimura.

Segundo ela, o principal pilar para a ação dar certo é a cultura da empresa. “Autonomia e responsabilidade, assim como flexibilidade na forma de atuar e entregar as demandas, são parte do nosso jeito de trabalhar e questões reforçadas desde o recrutamento”, explica. A única regra é avisar com antecedência ao gestor e planejar bem a saída, com todas as entregas alinhadas. Isso varia conforme o tempo de afastamento. Para folgas de um dia, o funcionário deve comunicar uma semana antes, para as de até sete dias, duas semanas antes, e mais de 15 dias, o aviso deve ser feito com um mês de antecedência.

A empresa disponibiliza uma cartilha que orienta como o benefício deve ser utilizado, e uma das recomendações está relacionada às entregas. Os profissionais devem se comprometer com suas tarefas e observar o momento da empresa, se for uma semana de definição de metas, por exemplo, não é recomendado sair. “Temos objetivos e expectativas bem claras, e os gestores acompanham diariamente o status das atividades, assim como realizam conversas de desempenho e feedback com o time”, explica Kimura. Entre os pontos observados estão: quem será o responsável na ausência do profissional, que projetos não podem parar, quais as entregas no período e o impacto da redistribuição de tarefas para não gerar sobrecarga.

“Duas semanas antes de sair comecei o processo de passagem de bastão para meu gestor e analisei o status das entregas, planejando todas as atividades das cinco semanas que ficaria fora”, explica Barbosa. Ela conta que elaborou uma planilha com todos os dias e entregas, e o responsável por cada uma.

A professora de gestão de carreira e recursos humanos Elza Veloso, coordenadora no mestrado profissional da FIA Business School recomenda que, antes de oferecer o benefício, o RH realize um mapeamento minucioso de todas as áreas e suas demandas para entender o impacto da ausência de alguém no time. “Depende muito do setor. No varejo, por exemplo, as coisas não podem parar e é essencial estabelecer a melhor forma de trabalho para não gerar sobrecarga”, diz. O segundo passo, é capacitar os gestores sobre o tema e, a partir disso, estabelecer um manual de boas práticas. Para ela, o segredo é o planejamento e a conscientização sobre a autonomia com responsabilidade. Isso porque, quando se perde a delimitação, perde-se também os parâmetros. “Se não há regra, é preciso criar uma filosofia sobre o tema”, completa Souto.

A Noh, fintech que atua como uma carteira digital compartilhada e tem 16 funcionários, é outra que aposta nas férias ilimitadas. “O modelo tradicional CLT de 30 dias de férias sempre me incomodou e, ao fundar o negócio, quis criar um ambiente de trabalho flexível, no qual as pessoas tivessem paixão em estar. Até porque o comportamento dos funcionários é diretamente influenciado pelo equilíbrio entre vida pessoal e trabalho, e o desequilíbrio impacta nos resultados e na produtividade”, diz Ana Zucato, fundadora da Noh.

Para ela, estabelecer essa prática desde o início do negócio ajuda a criar uma cultura forte e bem estruturada de autonomia com responsabilidade. “Muitas vezes, as organizações tratam os funcionários como crianças pedindo que justifiquem tudo. Precisamos tratá-los como adultos, confiando e dando liberdade de trabalho”, ressalta. Ela reforça que, principalmente na área de TI, na qual os sistemas precisam operar 24 horas, as folgas sem tantas regras são essenciais. “Notamos, com o tempo, que o time ficou mais feliz, com mais energia e gás para trabalhar”, conta. Segundo ela, a única exigência para poder sair é não deixar a peteca cair.

Dhaval Chadha, cofundador da Justos, startup da área de seguros de auto com 92 funcionários, também oferece o benefício e concorda com Zucato. Em sua visão, quando as empresas estabelecem uma série de regras e burocracias, isso não ajuda a criar uma cultura de responsabilidade. “Falamos do tema com frequência, desde os documentos de onboarding e cultura, até nos offsites e treinamentos”, afirma. Para ele, o maior desafio é mostrar às pessoas que isso é de verdade. “Os líderes precisam dar o exemplo para encorajar a equipe”.

“No começo fiquei receosa: será que vai pegar mal e as pessoas vão achar que não estou trabalhando muito”, lembra Lorena Alvarez, gerente de produtos da Justos. Ela tirou uma semana antes de completar um ano de empresa e conta que logo essa sensação passou. O time apoia e colabora quando alguém está de férias. Outro aspecto que ajudou a ter confiança em sair foi o fato de os próprios fundadores usufruírem do benefício. “A prática inverte um pouco o jogo de que a empresa é detentora e os profissionais só estão lá para receber um salário. Estamos todos juntos e somos responsáveis pelo negócio”, diz.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Demissões em massa expõem problema antigo: líderes não sabem demitir

O colunista Rafael Souto ressalta que as empresas deveriam olhar com mais cuidado o processo de demissão dos funcionários – e explica o porquê.

O desligamento de funcionários é um tema difícil de ser tratado nas empresas.

Ao longo dos anos ficou em segundo plano. O foco está nas contratações e no desenvolvimento de funcionários. A saída sempre foi tratada como tema menos relevante na agenda organizacional.

No entanto, nos últimos meses o assunto vem ganhando destaque em função da onda de demissões nas startups. Pressionadas por resultados e com menos dinheiro disponível, muitas iniciantes do setor de tecnologia precisaram apertar os cintos e cortar pessoas.

As demissões em massa e mal conduzidas expuseram um problema antigo: líderes não sabem conduzir desligamentos.

O caso Vishal Greg, CEO da startup de serviços financeiros Better, que demitiu 900 pessoas online em uma videoconferência, expôs a brutalidade de processo de saída mal planejado e terrivelmente conduzido.

Numa fala irônica Vishal disse: “se você está nessa reunião, não tenho boas notícias”. Num tom prepotente encerrou o contrato de trabalho. O episódio viralizou na internet e colocou o tema em evidência.

O emblemático caso das demissões na Better é um extrato do que acontece no dia a dia das empresas.

A consultoria Produtive, especializada em carreira, concluiu uma recente pesquisa sobre a saída de pessoas das organizações. O chamado ciclo de offboarding.

Foram mais de 400 entrevistados que trabalharam em empresas de diversos setores.  Os dados mostraram que as demissões seguem sendo um ponto crítico. 60% dos demitidos perceberam que seu gestor não estava preparado para realizar o desligamento. 58% dos gestores não sabiam explicar o motivo da demissão e não tinham informações claras sobre os próximos passos.

62% dos demitidos foram surpreendidos pela demissão. Ou seja, não tinham feedbacks anteriores ou sinalização do desligamento.

Em relação a segurança psicológica também os dados não foram positivos, 45% dos profissionais desligados não sentiram sequer espaço para obter mais informações e entender a demissão.

A demissão faz parte da vida corporativa, mas a forma de fazê-la é que define a percepção de quem sai da empresa. Para 56% das pessoas, a forma de demitir foi mais impactante do que o ato em si. Entendem que poderiam sair, mas a forma com que a demissão foi conduzida foi o que marcou a experiência.

Esses dados chamam a atenção porque expõem o quanto esse tema precisa ser aprofundado.

Na pauta das empresas contemporâneas vem se discutindo como melhorar o clima interno. A saída das pessoas é fundamental porque mostra para aqueles que ficam como as pessoas são tratadas quando a relação de trabalho se encerra. Mostra a cultura da empresa para tratar uma questão crucial. Não faz sentido contratar bem e demitir de qualquer forma.

A demissão também tem íntima relação com a agenda ESG (sigla em inglês para as preocupações com meio ambiente, sociedade e governança). Na pauta do envolvimento social da empresa, a demissão é uma ação de alto impacto na comunidade.

Além disso, a forma e as percepções do demitido irão determinar muito sobre a marca empregadora nas redes sociais e sites de avaliações sobre empresas. Isso afeta diretamente a atratividade para contratar.

O desafio está em tratar o desligamento como um processo. Investir tempo no treinamento dos líderes. Quem demite também sofre e precisa ser preparado. É preciso falar sobre o tema e tratar as dificuldades. Pensar num processo responsável e que seja estruturado. Organizar o dia do desligamento para que seja feito de forma individual e com os passos bem definidos.

A condução do desligamento deve dar transparência do que está acontecendo e o porquê da saída. Também é fundamental ouvir o desligado, não com a intenção de rever a decisão, mas sim ser empático aos sentimentos envolvidos. E por fim, dar clareza e organização sobre os passos seguintes à comunicação.

Demitir de forma empática e responsável requer tempo, planejamento e medidas objetivas de apoio para o fechamento do ciclo. As entrevistas de desligamentos são uma boa forma de ouvir os demitidos e compreender oportunidades de melhoria. Na prática, ainda são mero protocolo e pouco levadas a sério.

Um longo caminho segue aberto. O fato é que os danos gerados por demissões mal conduzidas são relevantes e construir uma marca forte passa pelo cuidado com aqueles que contribuíram na organização.

Os desafios da nova era do talento para os líderes

O colunista Rafael Souto escreve sobre como a flexibilidade é relevante para reter profissionais chave nas empresas

Depois da transformação digital, a era de ascensão do talento e valorização de competências humanas – demasiado humanas – já vinha sendo anunciada. O fundador do Fórum Econômico Mundial, Klaus Schwab, foi o primeiro a identificar e criar o conceito de “talenteísmo” como sucessor do capitalismo. No início da última década, ele já afirmava que a inexorável automação de uma série de empregos transformaria habilidades, a priori exclusivamente humanas, em diferenciais do crescimento econômico para países e organizações. Imaginação e capacidade de inovação estariam no hall dessas competências.

O economista Marcos Troijo, presidente do NDB, banco dos Brics, é mais um especialista a perceber o “talenteísmo” e a primazia da capacidade de inovação. Ele enxerga uma mudança sensível na noção de talento. Muito mais do que acumular conhecimento, profissionais talentosos são aqueles que ocupam posições estratégicas na conexão com a tecnologia. A união entre tecnologia e talento produz o diferencial competitivo tão buscado pelas organizações.

Os indivíduos que falharem na aquisição de habilidades que os levem para um patamar menos operacional de atuação entram em uma zona de risco de substituição por robôs. Por isso, a educação contínua é crucial para quem quer se manter no jogo contemporâneo.

Dotados do espírito aprendiz, os chamados “lifelong learners” são os mais propensos a se tornarem os talentos. Aprender é percorrer metade do caminho. Mas o número de horas de formação acadêmica e cursos extracurriculares não é medida para a capacidade de inovação de um profissional. Como afirma Troijo, na era da inovação, quem se destaca é quem sabe o que fazer a partir do que foi ensinado. Quanto mais o indivíduo é ágil e se interessa em aprender coisas novas, mais potencial tem para se destacar como talento e ser disputado pelas empresas.

Essa mudança de eixo no desenvolvimento dos negócios para a era dos talentos pede uma revisão de cultura nas lideranças. A reflexão que proponho aos líderes é sobre a criação de um ambiente que favoreça o desenvolvimento de talentos considerando que é isso que vai garantir o sucesso da empresa.

Há que se ir além, muito além, dos belos escritórios. A mudança no “life design” presenciada na pandemia é irreversível. Líderes que insistirem em práticas que cheiram a naftalina vão ficar patinando em estudos de “turnover” da equipe. Fenômenos como a escalada nos pedidos de demissões deixam claro que profissionais qualificados querem modelos mais flexíveis. Se o trabalho pode ser feito de qualquer lugar, líderes não devem forçar as pessoas a voltarem para modelos 100% presenciais. Estamos diante de um novo contrato psicológico que pressupõe mais autonomia e protagonismo de carreira.

Decidir de onde eu quero trabalhar em um dia chuvoso faz parte desse novo contrato. Decidir qual benefício quero receber da empresa, também. A personalização de todo o pacote, deixando maior poder de decisão para o indivíduo, é um caminho para as organizações manterem talentos em posições chave.

A livre movimentação de carreira é outro ponto importante de um ambiente atrativo. Em muitas empresas, as pessoas precisam pedir autorização para seus líderes para se candidatar a uma vaga interna. Nas questões de carreira, o papel do líder é aconselhar e facilitar o desenvolvimento dos liderados. Bloquear movimentações, para manter resultados da área, é mais uma prática de líderes que repelem talentos. O que temos visto é que a autonomia, a liberdade e a experimentação são características de ambientes que as pessoas querem, de fato, estar.

 

Quatro práticas que geram conexão e ajudam a engajar talentos

Antes de começar qualquer alteração na política para atrair e engajar talentos, é importante que o RH reavalie a cultura e propósito da empresa.

Diante de cada vez mais profissionais repensando o sentido do trabalho em sua vida, práticas a favor da flexibilidade viraram estratégicas. “Ainda há muita mudança por vir, mas o futuro certamente será escrito a partir de grupos capazes de conciliar, de forma harmônica, razão e emoção, vida pessoal e trabalho, olhando para as pessoas de forma integrada e criando ambientes adequados, prósperos e sustentáveis em todos os sentidos”, afirma a neurocientista Ana Carolina Souza, sócia da consultoria Nêmesis. Veja quatro práticas que geram conexão a ajudam a engajar talentos nas empresas:

1. Analise a cultura

Antes de começar qualquer alteração na política para atrair e reter talentos, é importante que o RH reavalie a cultura e propósito da empresa. Que organização queremos ser? A empresa permite que o RH reavalie a cultura e propósito da empresa. Que organização queremos ser? A empresa permite que o funcionário estabeleça seu life design da maneira que quiser? Qual o impacto dos negócios na sociedade e no meio ambiente? Como os líderes olham e tratam seu time? “As pessoas não querem mais estar numa empresa apenas para ganhar dinheiro, desejam ver significado no que fazem. A agenda EGS entrou na vida de todos”, diz Rafael Souto, presidente da consultoria Produtive. E o RH deve ser o embaixador dessas reflexões, levando às lideranças conscientização sobre a importância do tema e informações que direcionem as ações, como dados sobre os motivos que têm levado à rotatividade. Os colaboradores com maior probabilidade de permanecer em uma companhia são aqueles que encontram significado e prazer no trabalho.

2. Revise as políticas

Com o mapeamento da cultura em mãos, é hora de rever as ações e programas para checar se estão aderentes aos valores da empresa e aos principais pilares de engajamento hoje, como flexibilidade, propósito e desenvolvimento. “O RH deve analisar se ainda conta com políticas antiquadas. Há empresas, por exemplo, em que o indivíduo ainda precisa pedir autorização ao líder para se candidatar a uma vaga. Isso acaba com a livre movimentação e o protagonismo”, diz Rafael. Outra prática a ser evitada é o líder determinar, no Plano de Desenvolvimento Individual (PDI) do liderado, quais pontos devem ser melhorados. É verdade que muitas empresas pedem ao funcionário que ele se autoavalie. Mas, na prática, o gestor desconsidera as observações do avaliado e chega a um veredito sozinho. Mas é fundamental que o profissional faça essa reflexão de forma aprofundada, assertiva e conectada com seu propósito, e que seja ouvido e respeitado na conversa.

3. Conscientize a liderança

Nenhuma prática vai fazer sentido sem o preparo e a conscientização dos líderes, pois são eles que estão no dia a dia da equipe. “Já não é mais possível contar com gestores que queriam um subordinado para chamar de seu e determinar tarefas e passos profissionais”, diz Anderson Sant’Anna, professor da FGV. Segundo ele, é preciso apostar numa gestão colaborativa, inclusiva e sem punição, com gestores e equipes que atuam em parceria, e não no modelo de comando e controle. Para Rafael, o líder deve ser um conselheiro, não alguém interessado apenas em resolver suas questões usando a equipe como um como um recurso para isso. “Um líder que sabe fazer um bom storytelling ajuda muito nesse sentido, ou seja, alguém que compartilha experiência, mostra os caminhos que seguiu e como tomou decisões na carreira”, afirma.

4. Crie um ambiente seguro e agradável

“Muitas vezes, observamos que o RH dá muita atenção a temas que não necessariamente motivam a permanência dos colaboradores: , diz Fernanda Mayol, sócia da consultoria McKinsey. “Checar se a remuneração e os benefícios estão em linha com o mercado é importante, mas não são os principais fatores de retenção.” De acordo com uma pesquisa da consultoria, 70% dos colaboradores que não estavam inclinados a deixar seus empregos responderam que têm um ambiente de trabalho seguro e confortável; 69% afirmaram não pensar em trocar de emprego porque conseguem equilibrar vida profissional e pessoal, 62% porque têm uma carga gerenciável de trabalho todos os dias, e 58% se sentem valorizados por seus gestores.

 

 

 

 

A cultura de aprendizagem é condição para sustentabilidade de empresas e carreiras

O apelo ao aprendizado contínuo nunca foi tão urgente para a sustentabilidade das carreiras. Se a transformação digital passou a redefinir ou extinguir profissões, exigindo a revisão e o aprimoramento constantes de habilidades, a mudança ganhou velocidade com a incerteza escancarada da pandemia.

Mais de um terço das habilidades consideradas importantes na força de trabalho atual terão mudado até 2025, segundo relatório do Fórum Econômico Mundial. Por isso, aprendizado ativo e estratégias de aprendizagem perdem apenas para pensamento analítico e inovação no ranking das habilidades mais demandadas nos próximos três anos.

Cada vez mais negócios bem-sucedidos são conduzidos por pessoas capazes de aprender mais e mais rápido. A flexibilidade para rever conceitos, desaprender e assimilar novas metodologias e informações proporciona a rapidez necessária à alta performance empresarial.

Agilidade nas respostas aos novos desafios é vantagem competitiva em ambientes voláteis como os enfrentados pela maioria das organizações. Dentro desse contexto, o que vemos é a necessidade de um repertório de habilidades comportamentais e de uma cultura capaz de fomentar a capacidade de aprendizado contínuo nos indivíduos ou lifelong learning

A capacidade de estar sempre aprendendo depende de um estado de espírito aprendiz. Em artigo para a consultoria Mc Kinsey, Lisa Christensen, Jake Gittleson, and Matt Smith classificaram “aprendizado intencional” como a mais fundamental das habilidades. Essa meta-habilidade, uma competência de desenvolvimento de outras habilidades, é treinável. É como se as pessoas com essa habilidade estivessem sempre no “modo aprendiz”, tirando lições práticas e conceituais de situações formais de aprendizado e também de interações e atividades do cotidiano.

Segundo os pesquisadores, o aprendizado intencional é alimentado pela curiosidade e pelo chamado growth mindset.  A mentalidade de crescimento, na tradução em português, é definida pela pesquisadora da Universidade de Stanford Carol Dweck, autora do livro “Mindset: a Nova Psicologia do Sucesso”.  Pessoas que têm o growth mindset encaram desafios como aprendizados e acreditam em seu potencial de evolução e aprendizagem. É oposta à mentalidade fixa – fixed mindset, em inglês – presente em indivíduos que consideram suas habilidades inatas e fixas. Pessoas assim não acreditam na sua capacidade de aprender. Mas, para avançar na carreira, deveriam ter mais autoconfiança em seu potencial de aprendizagem.

As organizações podem ajudar seus colaboradores a desenvolverem o mindset de crescimento, a curiosidade e, consequentemente, aprendizado intencional e contínuo. Empresas com uma cultura de aprendizagem são terreno fértil para o florescimento destas habilidades.

O diálogo frequente entre líderes e liderados sobre desenvolvimento e carreira faz parte dessa cultura propícia a novos aprendizados e à inovação. Os líderes também devem se certificar de que o ambiente de trabalho ofereça segurança psicológica para as pessoas se sentirem confortáveis em se manifestar, errar, aprender e discordar. No livro “Fearless Organization” (Organização Sem Medo, na tradução para o português) Amy Edmondson, professora da Universidade de Harvard, aprofunda a questão da segurança psicológica como base da inovação, por exemplo.

A atitude do líder é sempre fundamental tanto para garantir a segurança psicológica como para estimular o aprendizado contínuo. Liderar pelo exemplo estimulando que seus liderados façam perguntas faz uma baita diferença. E é fato que líderes com flexibilidade, disposição para rever conceitos, abertura a novas ideias e que valorizam aprendizado e curiosidade costumam montar equipes com essas caraterísticas.

Dentro de uma cultura de aprendizagem, aqueles executivos que se consideram experts absolutos encastelados em seus feudos corporativos perdem espaço para quem investe tempo significativo em autodesenvolvimento.  A aprendizagem formal e informal deve estar na agenda dos indivíduos da base ao topo.

Alto desempenho: o lado ruim dos grupos de elite nas empresas

Muitas empresas cujos programas de talentos fracassaram em retenção já repensaram o modelo

Identificar, atrair e reter talentos é um dos principais desafios na área de gestão de pessoas. Uma das práticas discutidas entre os profissionais de recursos humanos é se a categorização de um grupo de um grupo de elite nas organizações faz sentido, já que esses profissionais elevam a régua da produtividade com sua alta performance.

É inegável que o rendimento dos grandes talentos sustenta e acelera o sucesso das empresas, daí a justificativa para segregar esses profissionais e oferecer benefícios que aumentem seu engajamento e interesse em continuar na organização.

As demandas para tal oferta vêm de muitos lugares. Das falas do CEO, interessado em concentrar esforços em pessoas de alta performance, à necessidade de encontrar sucessores para a liderança. A proliferação de programas para talentos com investimentos milionários e ótima remuneração é uma das dimensões da aplicação dessa visão nas organizações, assim como o investimento em programas de recrutamento sofisticados e hackathons atrativos.

Todas essas ações visam acelerar a carreira e promover um salto no rendimento desse grupo especial. Mas toda segregação deixa marcas. E o possível efeito negativo a que me refiro, muitas vezes, custa caro às organizações: a vaidade.

O título de funcionário especial com alto desempenho pode comprometer o comportamento de um talento imaturo. Quando o autoconceito, isto é, o conceito que formamos a nosso respeito — por meio da autoexploração, exploração do contexto e dos feedbacks recebidos —, esbarra no narcisismo, os conflitos são inúmeros. A dificuldade de relacionamento é uma característica quase sempre presente nas pessoas que se acham acima do bem e do mal e um entrave ao clima organizacional.

Muitas vezes, o autoconceito começa a ser distorcido com a ajuda das famílias e escolas que perdem a mão no excesso de reconhecimento. Sem autocrítica, o jovem se considera brilhante antes mesmo de o ser na prática.

Esse comportamento motivou o psicólogo W. Keith Campbell a estudar o que chamou de Epidemia Narcisista, em indivíduos cuja baixa tolerância à frustração é significativa. Fechadas em sua autoimagem, as pessoas se sentem intocáveis e tendem a não assumir erros, culpando sempre o outro que é incapaz de perceber a sua genialidade.

Se ela não cria, a filosofia segregacionista de trabalho nas organizações só piora esse traço. Daí a importância de se falar sobre educação para a carreira. Por meio desse movimento é que podemos mitigar esse comportamento nocivo.

Por mais que as habilidades comportamentais dos talentos sejam investigadas durante programas de recrutamento, é necessário acompanhar a carreira para que ela acelere embasada tanto do ponto de vista das hard skills como também das soft skills.

O quanto a organização pode preparar a sua estrutura para ajudar no amadurecimento dos seus talentos? A resposta está em diálogo e programas de aprendizagem para a carreira. Dessa forma, esses esses profissionais vão conseguir construir relacionamentos mais duradouros e frutíferos nas organizações. Fazer alianças, aliás, é uma habilidade destacada na formação de um pool sucessório, assim sucessório, assim como a adaptabilidade, a habilidade que nos ajuda a colocar em prática o protagonismo de carreira.

A presunção corrói reputações e carreiras promissoras. Questões como colaboração e humildade devem estar na pauta de desenvolvimento, assim como os riscos de atitudes arrogantes e autocráticas. Caso contrário, as chances de enfrentar esse efeito colateral são enormes. Muitas empresas cujos programas de talentos fracassaram em retenção já repensaram modelos para evitar casos de profissionais de alto desempenho demitidos por dificuldade de relacionamento.

A sustentabilidade do crescimento rápido de uma empresa certamente exige uma formação ágil de profissionais. Por isso, o mais atento olhar de negócios se volta para o desenvolvimento de pessoas capazes de dar continuidade à trajetória de sucesso e de sucessão na organização.

 

 

 

 

 

Desmotivação em alta pede novos modelos de trabalho

O colunista Rafael Souto apresenta o que chama de “carreira em nuvem”, que traz possibilidades não lineares aos profissionais

Recente estudo global do Gallup mostra que 85% dos trabalhadores estão desengajados no trabalho. Isso gera perdas de até US$ 7 trilhões em produtividade. Desse grupo, 67% não são funcionários com resultados ruins. São pessoas que gostariam de contribuir mais, mas não encontram espaços e não se sentem reconhecidas. Fazem o trabalho, mas não colocam suas melhores ideias e energia máxima nas atividades. Segundo Jim Harter, pesquisador e líder do estudo, esse grupo não percebe oportunidades para se desenvolver e contribuir na organização. A desmotivação é decorrente da falta de perspectivas de carreira.

Essas pessoas estão mais propensas a deixar a empresa. Talvez isso explique o dramático aumento de turnover. O fenômeno “a grande renúncia” ganha força desde 2020, quando o número de pessoas que pedem demissão aumentou, principalmente em posições mais qualificadas, que permitem mais escolhas. Desmotivação somada a uma oferta de mercado é a chave para o movimento de saída.

O estudo também mostrou que empresas que reformularam seus modelos de gestão de performance para um sistema de conversas mais frequentes – em que o acompanhamento do trabalho é feito da maneira mais dinâmica e focada em construção de alternativas – melhoraram o engajamento. Nesse sentido, o gestor que dedica tempo para compreender interesses e analisar opções de desenvolvimento tende a ter mais engajamento do seu time. Dados do Gallup mostraram que funcionários mais motivados geraram até 21% mais resultados. Os modelos de avaliação anual entraram em colapso e precisam de reformulação.

Outro elemento para aumentar o engajamento passa pela reformulação das estruturas. Modelos hierárquicos são prisões para a criatividade e limitam os talentos. O sistema piramidal tem se mostrado cada vez mais limitado e pouco atrativo para o desenvolvimento dos profissionais. É necessária a construção de modelos mais flexíveis para que o indivíduo possa contribuir.

Há alguns anos chamo essas alternativas de carreira em nuvem. A nuvem representa as possibilidades de trabalho não linear. Um indivíduo pode contribuir em uma área diferente da sua, mesmo mantendo sua posição original. Isso permite fluidez na carreira e parte da premissa de que o potencial de contribuição de um indivíduo está muito além do seu cargo.

O escritor Steve Glaveski, em artigo para a “Harvard Business Review”, projeta o futuro do trabalho em um sistema chamado DAO – sigla em inglês para Organizações Autônomas Descentralizadas. São estruturas mais flexíveis em que indivíduos contribuem de forma autônoma em projetos em que percebam sentido para suas carreiras. As DAOs também podem incluir pessoas de fora da empresa. Esse conjunto constitui um ecossistema mais aberto e livre.

As DAOs funcionam com metodologias ágeis, onde indivíduos produzem em prol do projeto sem apego à hierarquia. Esse sistema não linear pode acelerar o desenvolvimento de atividades necessárias para a organização e fomentar o crescimento dos profissionais.

Conectar as estruturas não lineares com os diálogos de carreira é uma forma potente de trabalhar o engajamento dos funcionários. Em uma sociedade dinâmica e em rápida transformação, as estruturas de trabalho também precisam evoluir. Os modelos hierárquicos tradicionais são frutos de um mundo do trabalho de 100 anos atrás e precisam ser reformulados. Cada empresa terá que pesquisar o desenho organizacional que acredita ser viável, mas é certo que o aumento do engajamento passa pela revisão da oferta de carreira.

 

 

 

 

‘Fui demitida com 35 colegas por vídeo’: as demissões em massa por startups brasileiras

“Era uma empresa bem bacana. A cultura deles era o que chamava mais a atenção. O acesso aos líderes era muito fácil, os benefícios eram bem bons também.”

“O único problema era que as mudanças eram muito rápidas, e não eram comunicadas. Um dos valores da empresa era a transparência, mas isso era só no papel. Quando aconteciam as mudanças, a gente era sempre pego de surpresa. Foi exatamente isso que aconteceu com as demissões”, conta uma trabalhadora demitida recentemente de uma startup de serviços residenciais.

“Marcaram de última hora uma reunião por vídeo com 36 funcionários. Foi onde eles comunicaram a demissão em massa de todo mundo”, diz a ex-funcionária, que optou pelo anonimato.

Segundo ela, o dono da empresa explicou que um grande investimento esperado não aconteceu e, por conta disso, e das mudanças do mercado, a empresa estava mudando seu modelo de negócios.

“Para mim, foi uma forma muito cruel de demissão. Todo funcionário sabe que a qualquer momento pode ser demitido. Mas a notícia não deveria ser dada na frente de todo mundo, após dias sem informação”, afirma.

“É inevitável que você se sinta injustiçada, diminuída, por conta da situação. Ninguém pôde falar nada, porque os microfones foram bloqueados. Então a gente só pôde ouvir e aceitar tudo que estava acontecendo. Faltou transparência e empatia.”

A demissão relatada pela trabalhadora é uma de centenas que têm sido feitas nos últimos meses pelas startups brasileiras, em uma onda que afeta também outros países.

Entre as empresas novatas que demitiram em massa recentemente no país estão Facily, Kavak, Vtex, Favo, QuintoAndar, Loft, Olist, Mercado Bitcoin, Zak, Bitso, TGroup, Sami e Sanar. Todas dispensaram dezenas, e em alguns casos até centenas, de funcionários ao longo do primeiro semestre de 2022.

Os trabalhadores demitidos dizem compreender o cenário macroeconômico, as dificuldades enfrentadas pelas empresas e a natureza volátil de negócios novos e inovadores. Mas criticam a forma considerada desrespeitosa como muitas dessas demissões coletivas têm sido conduzidas.

O caso da funcionária demitida por vídeo e em grupo não é isolado.

A startup Zak, de gestão de restaurantes, por exemplo, anunciou para seus funcionários em 13 de maio, em uma reunião por vídeo, que um investidor havia voltado atrás num aporte de recursos e que, por conta disso, a empresa iria demitir 40% do quadro.

Na sequência, os que seriam demitidos receberam convites para reuniões de 20 pessoas, onde os gestores oficializaram as demissões, relatam ex-funcionários.

“Tinha gente que começou na segunda-feira e foi demitida na sexta. E eles estavam fazendo recrutamento ativo, trazendo pessoas de outras empresas. Eu mesma estava em uma empresa há mais de um ano e fui abordada por um recrutador da Zak. Fiquei pouco mais de 30 dias e aconteceu essa demissão em massa”, conta uma funcionária demitida que também optou pelo anonimato.

Procurada pela BBC News Brasil, a Zak afirmou em nota que vem sofrendo as consequências de um cenário macroeconômico adverso. “Estamos comprometidos a apoiar todos os colaboradores afetados e reiteramos que esta decisão foi tomada com extremo cuidado e ponderação, e como último recurso”, completou a empresa.

Juros em alta e fuga de investidores

Felipe Matos, presidente da Abstartups (Associação Brasileira de Startups), destaca que a onda de demissões coletivas em startups é um fenômeno global, resultado do aumento das taxas de juros pelos governos para combater a inflação.

“Quando os juros sobem, os investimentos de risco costumam ser penalizados. Basicamente, do ponto de vista dos investidores, vale mais a pena deixar o dinheiro em aplicações mais seguras, como títulos do tesouro e outras aplicações indexadas às taxas de juros, do que arriscar investir em uma startup ou no sistema produtivo, que são investimentos de risco muito maior”, diz Matos.

Além de impactar o balanço entre risco e retorno dos investimentos, a alta de juros também afeta o valor das empresas (“valuation“, no jargão de mercado em inglês). Isso porque esse valor é estimado calculando o fluxo de caixa futuro da empresa, descontada a taxa de juros. Assim, quanto maiores os juros, menor a avaliação das companhias.

O aumento dos juros também implica em desaceleração da atividade econômica, já que fica mais caro para famílias e empresas tomarem empréstimos para consumir e investir. Com isso, a própria geração de caixa das empresas é prejudicada e muitos planos de crescimento precisam ser revistos.

“Enquanto antes tinha um paradigma em que valia mais a pena crescer do que ser lucrativo, porque existiam investidores dispostos a bancar esse crescimento, mesmo com caixa negativo, agora isso não é mais verdade. As empresas precisam ter mais atenção ao caixa, mesmo que isso signifique crescer mais devagar”, afirma.

“É basicamente por isso que temos visto essa onda de demissões”, diz o representante. “Ninguém sabe exatamente quanto tempo esse ciclo vai durar, nem o quão profundo ele será, se viveremos uma crise maior. É difícil prever, mas as empresas estão se preparando, congelando investimentos e conservando caixa para atravessar essa fase em que se espera que haverá menos capital disponível.”

Para Matos, o desconforto de trabalhadores com a forma como algumas demissões em massa têm sido conduzidas está relacionado à própria natureza da demissão coletiva por questões econômicas ou de reestruturação das empresas.

“É um problema de qualquer demissão em volume. Uma coisa é demitir alguém por questão de performance, em que a pessoa recebe um feedback [retorno], existe uma avaliação. Essa é uma demissão que está dentro do esperado. Quando vem uma crise e a empresa precisa cortar, muitas vezes ela corta pessoas que têm um bom desempenho. Isso sempre vai causar desconforto.”

‘Me senti descartado, foi humilhante’

Desconforto é pouco para descrever o que sentiu o carioca Vinicius Mota ao ser demitido da Kavak, startup de revenda de carros usados.

“Me senti usado e descartado. Ser mandado embora é normal, todo contrato uma hora chega ao fim. Mas a forma como foi conduzido foi humilhante. Não só para mim, mas para 90% dos colaboradores”, diz o técnico em manutenção automotiva de 28 anos.

Mota, que trabalhou por cinco meses como inspetor de qualidade na Kavak até ser demitido, conta que os funcionários já vinham percebendo uma queda de movimento nas vendas, mas eram repetidamente assegurados pela gerência de que estava tudo bem e dentro do planejado.

Em 6 de maio, a empresa inclusive realizou um grande evento no Rio de Janeiro, reunindo toda a equipe com um farto café da manhã e assegurando que ninguém seria demitido, relata.

Um mês depois, em 7 de junho, a equipe foi chamada para uma reunião, sem informação do que seria discutido. Na chegada, os funcionários foram recebidos por seguranças, portando listas com nomes. Os funcionários eram então encaminhados ao 6º andar ou ao interior da loja — posteriormente, ficaram sabendo que no 6º andar estavam os “salvos” e na loja, os demitidos.

Os cerca de 50 funcionários reunidos dentro da loja tiveram que aguardar por quase uma hora, cercados por seguranças, sendo impedidos de bater o ponto, tomar café ou ir ao banheiro sem acompanhamento, lembra o técnico em manutenção.

Objetos e carros haviam sido retirados da loja, o que fez os trabalhadores — a maioria de operação e vindos de bairros populares do Rio — sentissem que havia um temor de que eles pudessem roubar ou destruir algo, embora naquele momento ainda fossem funcionários da empresa.

Por fim, os funcionários foram divididos em grupos de 12 a 15 pessoas e a demissão feita através da leitura — por gerentes que não eram os gestores diretos dos demitidos — de uma carta formal, que dizia que a estratégia da empresa havia mudado.

Estima-se que a empresa tenha demitido 300 pessoas no Rio e em São Paulo nesse último mês, mas a Kavak não confirma o número oficial. Procurada pela BBC News Brasil, a assessoria de imprensa da empresa respondeu em nota que “a Kavak prefere não comentar”.

Mota conta que alguns colegas pensam em entrar com processo contra a empresa por assédio moral no momento da demissão. Ele se concentra na busca por um novo emprego, mas quer agora ficar longe de startups. “Prefiro passar longe, como profissional eu não confio mais”, afirma.

O que diz a legislação sobre demissões coletivas

Ricardo Calcini, professor de direito do trabalho na FMU, observa que, após a reforma trabalhista de 2017, a demissão individual e a coletiva passaram a ser consideradas equivalentes, sendo dispensada autorização prévia por parte do sindicato profissional.

Em 8 de junho deste ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) ratificou esse entendimento, mas estabeleceu que os sindicatos devem ser comunicados sobre dispensas coletivas.

Nas startups, que são empresas jovens, com alta rotatividade e onde os trabalhadores em geral não estão ligados a sindicatos, Calcini avalia que acaba prevalecendo o texto da reforma trabalhista.

“Sem representatividade [sindical], com número reduzido de funcionários e um giro grande, quando o Supremo fala que tem que comunicar o sindicato, para as startups ficou algo vazio”, afirma.

O especialista lembra que os dispensados em demissões coletivas têm todos os direitos normais de uma demissão: aviso prévio de 30 dias indenizado, 13º salário proporcional, férias proporcionais acrescidas do terço constitucional, multa de 40% do FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço), liberação das guias para saque do FGTS e saldo de salário.

Quanto à possibilidade de ir à Justiça por situações abusivas no momento da demissão, Calcini afirma que é preciso avaliar caso a caso.

“A Justiça do Trabalho entende uma conduta como assediante quando ela passa do razoável. Toda vez que houver excesso ou abuso do exercício do poder de dispensa, isso pode configurar dano moral e ser passível de indenização correspondente. Mas isso tem que ser avaliado caso a caso.”

‘Responsabilidade emocional’

Marina Proença, cofundadora da Favo, startup de venda direta de produtos de supermercado para a classe C, passou pela experiência da demissão coletiva neste início de junho, mas na outra ponta.

Com a decisão da empresa de encerrar atividades no Brasil e focar no negócio peruano, a empreendedora demitiu em um dia 171 funcionários diretos e comunicou a suspensão da operação brasileira aos mais de 7 mil representantes comerciais e 40 motoristas parceiros.

“Fizemos um plano muito detalhado, para cuidar que nada fosse feito de maneira grosseira. Fizemos todas as conversas com os funcionários um a um, com a comunicação majoritariamente feita em dupla — o gestor direto e mais uma pessoa para ajudar a tirar dúvidas. Tudo foi feito em um dia, para evitar que as pessoas ficassem ansiosas”, conta Marina.

As conversas foram feitas por vídeo, pois a empresa não tem escritório, e tiveram duração de 5 a 10 minutos cada, com espaço para os demitidos falaram o que quisessem. Alguns grupos pediram para ter conversas mais longas posteriormente.

Aos funcionários diretos, o plano de saúde e o vale alimentação foram estendidos por alguns meses e os computadores e celulares, oferecidos para compra por valores reduzidos.

Para os representantes comerciais com situação de renda mais crítica, foi criado um plano de “desmame” com a manutenção da operação reduzida por mais 30 dias. A empresa também tenta ajudar na recolocação de funcionários, representantes comerciais e motoristas, inclusive através de parcerias com empresas concorrentes.

A empresa criou ainda uma lista oficial de talentos para apresentar seus funcionários a possíveis novos contratantes. A lista foi publicada no site Layoffs Brasil, criado pelo carioca João Gabriel Santos, de 21 anos, para ajudar na recolocação dos demitidos em massa por startups.

“Eu fiquei com muito medo, tanto de fazer as demissões, como de avisar os vendedores. Porque é muito triste, as pessoas doam muito do seu afeto. Mas combinamos de ser extremamente transparentes, apesar da dor”, diz a fundadora.

“Não consigo nem imaginar fazer de outro jeito, apesar de já ter passado por isso em outros lugares quando não era minha empresa. Infelizmente, acho que a menor parte dos líderes e dos empreendedores têm uma responsabilidade emocional com a empresa. Quando a gente fala em segurança psicológica, a maioria não sabe nem o que é isso”, afirma.

É possível demitir em massa de maneira humanizada?

Para Rafael Souto, especialista em recursos humanos e presidente da Produtive, consultoria especializada em recolocação no mercado de trabalho, a demissão não deve ser encarada pelas empresas como um evento isolado, mas como um processo, que requer preparo dos gestores.

“A demissão pode ser feita por vídeo, mas não pode de forma alguma ser feita de forma coletiva”, diz o consultor.

“Os gestores de cada área devem fazer a comunicação individualmente, porque uma das premissas para uma demissão responsável é você comunicar a decisão sem enrolação, explicar os motivos de forma clara e escutar a pessoa. Faz parte da demissão humanizada dar espaço para a pessoa falar e é importante ouvir”, acrescenta.

Segundo Solto, a comunicação individualizada é importante também para que a pessoa seja orientada adequadamente sobre os próximos passos — como a entrega de documentos necessários ao processo de demissão —, que devem ser apresentados em uma sequência organizada.

Quanto a benefícios adicionais ao mínimo legal estabelecido pela CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), o consultor explica que eles podem ser de três tipos: bônus em dinheiro; extensão de benefícios como plano de saúde, vale alimentação e auxílio educação; e apoio à recolocação.

“A demissão tem vários envolvidos: o desligado, os familiares, a sociedade e os empregados que ficam”, diz Souto.

“Então cuidar da saída de uma forma profissional, humanizada e com responsabilidade também impulsiona a marca empregadora, para quem está saindo e leva a imagem da empresa ao mercado; para quem fica e sabe que o colega que saiu foi tratado de maneira respeitosa e com apoio; e para a marca perante a sociedade como um todo.”