O império das mentiras e das ficções corporativas


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Artigo publicado na coluna Novas Conexões, na edição desta quinta-feira, 23 de junho, do Valor Econômico:

Alguém me traga água. Estou tonto de tantas mentiras. Essa é a sensação que temos em muitas empresas. O jogo dos negócios tem se tornado um circo de ficções bem articuladas. Por quê?

Primeiro, existe uma incoerência nos discursos. Por um lado, ouvimos acionistas e conselhos de administração falando em estratégias de longo prazo e missão das empresas. Na prática cobram resultados somente em curto prazo. Falam em governança e apoio à gestão, mas pouco fazem para ajudar o CEO a resolver as enrascadas do dia a dia dos negócios. Isso gera um efeito em cascata na organização. Uma pressão por resultados a qualquer custo que leva a um jogo tóxico, em que se fala uma coisa e se faz outra.

Outro ponto é o excessivo turn over de executivos. Na mesma onda do imediatismo, a alta rotatividade faz com que esses profissionais construam agendas pessoais prioritárias em relação à empresa. Sabem que irão ser demitidos na primeira leva de reestruturação ou de não atingimento de metas. Com isso, tomam decisões de curto prazo e comprometem a saúde da empresa. Essa turma de executivos de passagem também aumentam os jogos psicológicos e os discursos que não correspondem às ações. Mentiras inteligentes a serviço da estratégia pessoal.

Sempre defendi a importância do marketing pessoal nas empresas. Entendo e refleti sobre isso em mais de um artigo escrito para esse jornal. Porém, percebo que a arte da sedução tem passado do limite nas organizações. Equilibrar a entrega de resultados com uma boa apresentação pessoal faz parte do desenvolvimento de uma carreira. Somos seres políticos e decidimos através das relações e da imagem que percebemos.

Porém observo, ano após ano, executivos que trabalham apenas a imagem. Constroem muito pouco e deixam um rastro de angústia por onde passam. Hábeis na comunicação, agem quase como psicopatas corporativos capazes de retirar o entusiasmo do mais dedicado profissional. Esse grupo tem ganhado força nesse ambiente.

Outro elemento que amplia essa lógica perversa são as bonificações executivas focadas em curto prazo. A estratégia corporativa de remunerar de acordo com os resultados é uma prática inquestionável. A ideia de valorizar o mérito de quem produz mais está na essência do liberalismo e é um fator positivo para os negócios.

O efeito colateral dessas medidas, porém, foi construir indicadores focados essencialmente nos resultados de curto prazo. Novamente, os executivos foram rápidos na leitura. Num cenário de instabilidade objetivam fazer seu bônus a qualquer custo. Os danos ficam evidentes. A crise de 2008 deflagrada em Wall Street, com o ápice na ruína do Banco Lehman Brothers, foi um dos episódios em que essa política teve sua expressão máxima.

Todos focados no seu bolso e o Sistema indo para o colapso. Os fenômenos de aumento de competitividade das empresas e redução de estruturas também acirraram o clima nas organizações. Muitas pessoas, poucas posições e ascensão mais difícil. A reorganização das empresas para competir também é um fator de estresse organizacional. A falta de espaço e perspectivas é um combustível para as mentiras e armações do modelo salve-se quem puder. O regime de escassez aumenta o drama.

Essa dinâmica nociva e longe do ideal parece não ter solução rápida. Observo um novo grupo de executivos chegando ao poder. Mais transparentes e com intenções genuínas de colaboração e construção coletiva, talvez consigam reverter esse quadro dramático que vivemos nas empresas. Carregados de uma ingenuidade saudável e novas ambições, esses jovens levam certa esperança para construção de um novo jeito de produzir. A economia digital parece nos dar a oportunidade de pensar um novo modelo de ecossistema de empresas. Menos corporações, mais integração e ambientes saudáveis.

Cresci com a ideia de que o petróleo terminaria nos anos 2000. Nossa missão nas décadas de 1980 e 1990 seria construir um mundo não dependente do terrível óleo. Ilusão. O petróleo não terminou como boa parte das previsões alarmistas. O modelo de corporações ganhou força.

Teremos que fazer uma reflexão sincera sobre o que desejamos nesse mundo corporativo. Porque somos parte ativa nele. Questionamos o Sistema, mas pouco fazemos para mudar. Reproduzimos frases de efeito nas redes sociais e quando temos o poder seguimos a velha cartilha. Somos agentes de um Sistema de trabalho que parece estar rumando para suas últimas aparições. Produzindo pouca felicidade e resultados cada vez mais difíceis. Parece que chegou a hora de fazermos, de fato, algo diferente.

Rafael Souto é sócio-fundador e CEO da Produtive Carreira e Conexões com o Mercado

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