Como perder a identidade corporativa sem traumas


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Confira matéria sobre programas de preparação para aposentadoria publicada em 28 de maio de 2015 com participação de Rafael Souto, CEO da Produtive:

Valor Econômico, Luiz De França

Até bem pouco tempo atrás, a palavra aposentadoria era associada à velhice, à perda do convívio social e à fragilidade física, emocional e intelectual. Por isso, ainda hoje muita gente não gosta de ser chamada de aposentado. Apesar de ainda possuir uma carga negativa, o aumento da qualidade de vida, sua consequente longevidade e a possibilidade de começar uma nova carreira pós-aposentadoria transformaram o significado desse termo nas últimas décadas.

A mudança de sentido da palavra, contudo, não alterou um problema que ainda se enfrenta quando é chegada a hora de trocar de chuteiras (e não mais pendurá-las): a perda da identidade corporativa.

Esse é um dos maiores traumas, se não o maior, para uma geração de profissionais nascidos entre os anos de 1946 e 1964, os chamados “baby boomers”. Eles começaram a se aposentar em 2011, dando início a um período que deve se estender pelos próximos dez anos.

A perda da identidade corporativa é um tema que exige atenção não apenas dos que passaram dos 50 anos, mas também dos que ainda estão na meia idade. “A empresa seduz o profissional, o que é normal. Mas o indivíduo deve cuidar desse assunto desde cedo. A verdade é que poucas pessoas se apropriam da sua história ou são autores da sua biografia”, diz o consultor Renato Bernhoeft, presidente do conselho da Höft Consultoria.

A preocupação com a aposentadoria ainda está muito centrada na questão da saúde e da garantia de uma reserva financeira. Poucos incluem a criação de uma nova identidade no projeto de vida para essa etapa. Afinal, sair de uma companhia significa extraí-la do sobrenome. “As consequências de quem não consegue se reinventar têm sido a depressão e até o suicídio”, diz o consultor.

O impacto dessa dissociação costuma ser maior entre os homens, pois as mulheres já estão acostumadas a exercer outros papéis na vida, como o de dona de casa e o de mãe. É o que acredita a consultora Denise Mazzaferro, diretora de negócios da Angatu IDH. “Os homens de que estamos falando foram criados para o mundo do trabalho, onde toda a vida gira em torno do emprego. Os assuntos, seus círculos de amizades e o cotidiano.”

Em alguns momentos, a volta para casa significa uma invasão ao território já dominado pela mulher, o que gera atritos e, às vezes, até a separação dos casais. Esse, entretanto, não foi um problema para Kátia Pessanha, de 56 anos, que se aposentou há um ano junto com o marido, Ayrton Torres, 62. Ambos eram executivos da IBM. “Às vezes eu digo que ele saiu da empresa, mas a IBM não saiu dele”, diz Kátia. Ela cita, como exemplo, o jeito do seu marido administrar uma simples reforma da casa como se estivesse coordenando projetos milionários. “Acho que a mulher sofre mais é com a perda da rede social de amizades no ambiente de trabalho, com a falta de almoçar com uma amiga.”

Quando Kátia se aposentou do cargo de gerente estratégica de gestão de mudanças na multinacional, ela já tinha planos de escrever um romance histórico sobre a vida dos judeus novos no Brasil e precisava de tempo livre para se dedicar ao projeto. “A tomada da decisão foi resultado de um processo que já vinha sendo amadurecido entre mim e meu marido”, conta.

Muitas empresas têm adotado programas de preparação para a aposentadoria – que os especialistas preferem chamar de pós-carreira. O objetivo é ajudar seus executivos a adquirir autoconhecimento e contribuir para que eles tenham uma saída menos dolorosa, com uma visão positiva sobre o fim de um ciclo e o início de outro.

O programa costuma acompanhar os limites de idade de aposentadoria compulsória estabelecidos pelas companhias, principalmente para os cargos hierárquicos mais altos. O limite fixado no estatuto dessas organizações costuma girar em torno dos 60 anos, bem abaixo dos 70 anos adotado pelo funcionalismo público – e que pode chegar aos 75 se o Congresso Nacional aprovar o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) que amplia esse teto para 75 anos no caso de juízes de tribunais de instâncias superiores.

O profissional que é preparado para a aposentadoria se sente reconhecido pela empresa e mais disposto a ensinar

No geral, as empresas que oferecem esse tipo de programa são organizações de grande porte, que já possuem plano de previdência privada e costumam figurar nos rankings das melhores empresas em gestão de pessoas. A maior preocupação é a preservação do conhecimento retido por esses profissionais. O executivo que tem a oportunidade de ser preparado para a aposentadoria se sente reconhecido pela empresa, o que o torna mais disposto a delegar e a ensinar. Caso ele ache que a companhia não está preocupada com o seu pós-carreira, o profissional pode simplesmente se recusar a passar o conhecimento adiante.

Os programas estão amparados legalmente pela Lei 8.842, a Política Nacional do Idoso, que determina a criação e manutenção de programas de preparação para a aposentadoria com antecedência mínima de dois anos do desligamento. Já a Lei 10.741/2003, o Estatuto do Idoso, que ordena “a preparação dos servidores para a aposentadoria com antecedência mínima de um ano, por meio de estímulos a novos projetos sociais conforme seus interesses, e de esclarecimento sobre os direitos sociais e de cidadania”. Uma de suas funções é reconhecer o valor agregado ao negócio deixado pelos funcionários.

“A saída deles pode significar a perda de know-how de profissionais diferenciados, muitas vezes especialistas no segmento de negócio da empresa. Isso pode levar a um desequilíbrio no clima interno e provocar nos mais jovens um sentimento de temor vinculado a um prazo pré-determinado para a sua saída”, considera Jorgete Lemos, diretora de Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-Brasil).

Outras reações negativas podem acontecer na saída, como a apatia e a acomodação. Quando o profissional sai com um sentimento de perda, ele passa uma imagem negativa da organização para o público externo.

Uma característica importante dessas iniciativas é a adesão do funcionário ao programa, que deve ser espontânea.

O processo aborda questões como carreira, cidadania, comunicação, discussões e ensinamentos sobre planejamento financeiro, qualidade de vida e empreendedorismo. “O grande desafio é mudar o modelo mental das pessoas, pois estamos lidando com o medo da improdutividade, de não se sentir útil, além da perda da identidade corporativa”, diz Rafael Souto, CEO da consultoria de carreira Produtive.

O consultor lembra que a pouca abertura do mercado à profissionais com mais de 60 anos, mesmo qualificados, contribui para essa visão. “A falta de oportunidades para o executivo aposentado é um problema global”, diz. O expediente encontrado é buscar outras formas de trabalho, como consultoria, prestação de serviços para a empresa na qual se trabalhou, ensinar, empreender, etc. “É necessário entender que carreira é mais do que emprego, que esse é um tipo de trabalho e o que precisamos é encontrar outros formas de trabalhar”, diz Souto.

Para antecipar essas questões, o recomendável é que os executivos comecem a pensar em alternativas para o futuro de uma forma mais estruturada a partir dos 45 anos de idade. As empresas, por sua vez, devem adotar um esquema de palestras e debates para seus executivos e demais empregados para refletirem sobre o assunto, principalmente para aqueles que estão a cinco anos da aposentadoria. O número de empresas que estão aderindo aos programas de preparação, seja criando internamente ou contratando firmas especializadas, tem aumentado. Na Produtive, esse crescimento tem sido de cerca de 25% ao ano.

Na opinião dos especialistas, os profissionais mais jovens, que ainda não chegaram aos 50 anos, estão mais propensos a pensar no pós-carreira. Eles são menos traumatizados porque começaram a se sensibilizar com o tema já dentro de casa, após ver os exemplos dos pais, que muitas vezes não se planejaram e se tornaram seus dependentes financeiros. “As pessoas entre 40 e 50 anos estão desenvolvendo o trauma financeiro e buscando saídas para não se encontrarem na mesma situação que os pais no futuro”, complementa Denise, da Angatu IDH.

Eduardo Morales, de 49 anos, conseguiu resolver bem essa questão. Ele é diretor de compras em uma multinacional do setor de agronegócios e desde os 23 anos vem planejando sua aposentadoria, participando dos planos de previdência privada duas empresas em que trabalhou e sempre contribuindo com o teto. “Eu não me arrependi de ter pensado no longo prazo desde cedo”, diz. Sua meta é conseguir manter 70% da sua renda atual na aposentadoria. Ele pretende se aposentar aos 60 anos.

“Minha intenção é com 55 anos começar a pesquisar o que vou fazer depois. De uma coisa eu sei, não vou parar, apenas diminuir o ritmo. Talvez trabalhar apenas duas ou três vezes por semana”, diz.

Com o amadurecimento das relações de trabalho e o modo como as novas gerações enfrentam as mudanças de emprego em diversas fases da vida, é bem possível que a perda da identidade corporativa seja menos sentida no futuro. “Quando a preservação da identidade pessoal é maior que a corporativa, esse trauma certamente tende a ser menor”, conclui Souto.

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