A bolha do mercado e as carreiras imunes à crise
Novo artigo de Rafael Souto publicado em sua coluna Novas Conexões, no Valor Econômico, na edição de 28 de maio:
Rafael Souto
A marola chegou com força de tsunami na economia brasileira. Uma onda que carrega incompetências de gestão que irão fazer parte da história. Num governo que já vinha cambaleante havia pelo menos dois anos, o último pilar de refresco era o emprego. O alto nível de ocupação das pessoas dava ainda alguma credibilidade nas promessas desencontradas sobre os rumos da economia. Em 2015, a casa caiu. O nível de desemprego aumenta sem tréguas. O modelo baseado em consumo interno, transferência de renda, gastos públicos desenfreados e aparelhamento das empresas estatais desmoronou. E com ele a bolha do emprego explodiu. No jargão econômico, a bolha está associada ao crescimento desordenado e irreal que não se sustenta no tempo.
O rápido crescimento do Brasil nos anos de 2010 a 2012 produziu graves distorções no mercado de trabalho. As empresas contrataram muito, inflaram e indexaram salários, produzindo uma realidade insustentável. Os ganhos salariais não foram acompanhados de incrementos proporcionais de produtividade. O salto do Brasil foi dado sem consistência. Não fizemos as reformas estruturais necessárias para dar continuidade ao desenvolvimento do país. Isso gerou um ambiente econômico desequilibrado. Ficamos caros antes de ficarmos ricos.
Trazendo essa discussão para a vida executiva e o dia a dia das empresas, a questão passa a ser como sobreviver nesse mar revolto.
Em meio a esse turbilhão de problemas, quero me concentrar em três fatores que tornam as carreiras imunes à crise. Os pontos que quero ressaltar dizem respeito aos aspectos de carreira que independem de área de atuação ou nível profissional. Meu foco é refletir sobre profissionais que mantêm seu nível de atratividade no mercado, mesmo na escassez de oportunidades. Não tenho dúvida de que aspectos como idiomas, formação acadêmica, experiência internacional, entre outros, podem ser ótimos propulsores de carreira. No entanto, esses aspectos dependem do momento profissional e da área de atuação. Meu objetivo nesse artigo é destacar aspectos que são comuns a todas as carreiras bem-sucedidas, em especial nos momentos de retração econômica.
O primeiro aspecto observável nas carreiras imunes à crise são ciclos consistentes de trabalho. Refiro-me ao histórico sólido. São aqueles profissionais que deixam marcas positivas por onde passam. Independentemente do número de anos na empresa, existe um trabalho realizado e um legado. A solidez dos resultados e a lógica das decisões de entrada e saída das empresas são elementos desejados por todo o contratante. O encadeamento das experiências profissionais com bons fundamentos é uma vacina contra o desemprego. Construir uma carreira com resultados e períodos consistentes é a base da competitividade no mercado.
O segundo aspecto chamo de “conectividade”. Essa característica pode ser definida como a capacidade de fazer relacionamentos e construir alianças. É a forma mais avançada do “networking” porque, nesse, o foco é fazer contatos e comunicar-se no mercado. Já a conectividade é gerar movimento para a rede, trazendo valor para as pessoas. Não é simplesmente procurar alguém quando precisa de emprego. Significa estar sempre identificando possibilidades para ajudar e colaborar. As pessoas que possuem alta conectividade destinam tempo e fazem dos relacionamentos um pilar na carreira. Essa agenda externa e a capacidade de se fazer presente na vida de seus contatos é uma forma de alavancar oportunidades.
O último aspecto se refere ao posicionamento diante do trabalho. Chamo esse fator de foco na resolução de problemas. É uma atitude baseada em trabalho e não em emprego. A pessoa com essa arquitetura mental se posiciona como alguém que pode ajudar a resolver problemas. Seja numa entrevista de emprego ou gerenciando uma área, o foco é trabalhar para solucionar questões. Nenhuma empresa contrata alguém para resolver o problema do emprego. A empresa quer soluções para seus problemas de negócio. Isso parece óbvio, mas a imensa maioria das pessoas espera que as organizações resolvam seus problemas e lhes tragam segurança. A regra para tornar-se imune às crises é sair desse jogo de dependência e passividade para uma posição ativa na resolução de problemas. Podemos chamar isso de empreendedorismo corporativo. Para ficar mais simples: cabeça de dono.
Rafael Souto é e sócio-fundador e CEO da Produtive Carreira e Conexões com o Mercado