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Demissão humanizada: por que é importante cuidar de quem deixa a empresa

A carreira é feita de ciclos, e debater esse processo faz parte da agenda de treinamento das empresas contemporâneas.

Construir uma marca empregadora forte é um dos temas estratégicos para as empresas contemporâneas. No Brasil, vivemos um terrível paradoxo. De um lado, taxas elevadas de desemprego e mais de 13 milhões de pessoas sem trabalho. Do outro, um déficit em torno de 450 mil vagas abertas que não são preenchidas por falta de pessoas qualificadas. Esse apagão amplia a complexidade para atrair e manter talentos. Portanto, construir uma marca que seja atraente e desejada é fator decisivo para o sucesso de um negócio.

Investir nas ferramentas de seleção, integração, desenvolvimento e construção da carreira estão no centro da experiência do colaborador. Essas estratégias são fundamentais para manter os profissionais engajados e reduzir o turnover. No entanto, o ciclo de saída não pode ser esquecido. O offboarding é um dos elementos que mais determina a construção da marca empregadora no mercado. A opinião daqueles que saem da empresa é fator-chave para impactar novos colaboradores.

Segundo dados do Glassdoor, a experiência de como foram tratados na saída é um fator decisivo para 65% dos profissionais quando avaliam uma empresa. E, para mais de 70% dos entrevistados, analisar as opiniões sobre como a companhia trata as saídas é um ponto importante para decidir trabalhar na empresa.

Em síntese, o fechamento do ciclo é estratégico. E, se mal estruturado, pode afastar talentos. Isso quer dizer que a reputação de uma organização no mercado passa pela forma como conclui os ciclos de trabalho.

Um estudo realizado pela Produtive, consultoria especializada em outplacement, mostrou que 56% dos desligados dizem que a maneira como o processo ocorreu e o jeito como foram tratados foram mais importantes do que a demissão em si.

Nessa linha, construir um ciclo de offboarding passa pela organização do processo de saída. Isso inclui preparar gestores sobre como demitir de maneira empática e humanizada. Além disso, é preciso saber receber um pedido de demissão sem tornar traumática a conversa.

A carreira é feita de ciclos e debater esse processo de forma natural e estruturada faz parte da agenda de treinamento das empresas contemporâneas. Ainda me lembro da minha experiência com uma montadora japonesa. Nela, todos os líderes eram treinados para demitir. Mas alguns diziam: não estamos em reestruturação? Por que falar disso? Com profunda sabedoria, o VP de RH repetia: todo líder precisa ser treinado para desligar pessoas.

O ciclo de offbording inclui a ideia de que a saída não é um evento isolado. Seja um pedido de demissão, seja a saída motivada pela empresa. É um processo que precisa de etapas, definição de estratégias de comunicação e planejamento.

A discussão de melhores práticas entre os líderes é um bom caminho para dar musculatura para esse processo. Afinal, alguém que sai de uma empresa pode se tornar um promotor ou um detrator da companhia. E isso vai depender da forma como foi tratado na saída.

 

Segurança psicológica é a base para a cultura de inovação

Há poucos dias foi divulgada a lista de pensadores mais influentes do mundo pela Thinkers50. No topo da lista está a professora da Universidade de Harvard, Amy Edmondson. Ela foi destaque pelo seu trabalho sobre segurança psicológica. No livro intitulado “Fearless Organization” (Organizações sem medo, em tradução livre), ela faz uma imersão na importância da construção de ambientes de trabalho em que as pessoas tenham confiança para se manifestar, fazer escolhas profissionais, discordar e inovar sem medo.

Num mundo cada vez mais dinâmico e imprevisível, as organizações precisam de profissionais dispostos a inovar. E para isso, construir uma cultura em que as pessoas se sintam confortáveis em se posicionar é fundamental.

Os estudos da professora Amy também mostram que as empresas nas quais a segurança psicológica está mais consolidada têm desempenho superior. Ambientes em que fazer perguntas e divergir são comportamentos estimulados são mais favoráveis para alta performance.

Outro nome na lista dos pensadores mais influentes é o escritor Adam Grant. Nos estudos sobre liderança, Grant diz que o novo líder é aquele que cria condições para seus times fluírem. Ou seja, que dá permissões e estimula movimentos de carreira, apoiando naquilo que faz sentido para o indivíduo e a companhia. Em síntese, dá segurança para que as pessoas revelem seus interesses de carreira e possam construir suas trajetórias.

O líder contemporâneo não trava a carreira de seu time para garantir os resultados da área. Ao contrário, estimula o protagonismo e a livre movimentação. Com isso, assegura o engajamento. Além disso, conquista confiança e comprometimento enquanto seus funcionários permanecem na área. A liberdade aumenta a conexão entre líder e liderado. Como afirma Wilmar Schaufeli, referência global em engajamento, paradoxalmente, a liberdade que o funcionário tem para se movimentar na empresa é a melhor estratégia para que ele fique e entregue resultados consistentes.

No entanto, os dados mostram que ainda estamos distantes dessa realidade. Uma pesquisa global realizada pela consultoria Gartner mostrou que 78% dos entrevistados não se sentem encorajados e com liberdade para dizer o que pensam sobre seu trabalho e seus interesses de carreira. Ao contrário, sentem medo de se manifestar e cometer erros.

Na mesma linha, um recente estudo publicado pela McKinsey, mostra que uma pequena parcela dos líderes apresenta os comportamentos capazes de criar o clima positivo esperado para impulsionar a cultura de inovação.

Como consequência, apenas 43% dos entrevistados reconhecem que trabalham num ambiente com segurança psicológica.

Os dados mostram, ainda, que a liderança autoritária ainda é preponderante. Essa transformação parece ser urgente. Os modelos de comando e controle reinaram na gestão por décadas. Agora parecem estar sofrendo seu maior revés. O estudo da McKinsey também apontou que 62% dos profissionais consideram que o ambiente seguro e uma liderança que estimule a liberdade para construção de sua carreira é fator-chave para permanecer.

A construção de um ambiente seguro passa pela intenção clara nessa direção. Exige comportamentos que apoiam de maneira explícita a divergência, respeitem as opções de carreira e a autonomia dos funcionários.

Segundo Amy Edmondson, saber pedir desculpas e rever comportamentos também ampliam a segurança psicológica. A vulnerabilidade do líder, ao contrário do que possa parecer, amplia a conexão. Mostrar suas incertezas e fragilidades para construção de um ambiente seguro é uma competência-chave na economia do conhecimento.

Ajude seus talentos a criar um portfólio, não um plano de carreira

Talentos não podem ser retidos. Eles podem ser engajados. As pesquisadoras norte-americanas Beverly Kaye e Julie Winkle fizeram um extenso trabalho sobre carreira que culminou na publicação do livro “Help Them Grow or Watch Them Go” (Ajude-os a crescer ou assista a eles irem embora, em tradução livre). A profunda investigação mostrou que pessoas talentosas são cuidadosas com a construção de suas carreiras e permanecem numa organização quando conseguem vislumbrar oportunidades e sentem confiança para realizar seus projetos. Quase 70% dos entrevistados afirmaram que a perspectiva de carreira na empresa é o fator-chave para permanecer ou ir embora.

Mas as transformações no mundo do trabalho e os impactos da pandemia nas relações entre profissionais e empresas vêm aumentando a complexidade para desenvolver e engajar esses talentos. A imprevisibilidade dos negócios não permite que a empresa ofereça promessas de cargos, por exemplo. Isso porque, o horizonte incerto das estruturas eliminou a ideia antiga de plano de carreira. Precisamos, agora, construir novas abordagens para o desenvolvimento profissional.

A escritora e palestrante April Rinne sugere, em recente artigo publicado na Harvard Business Review, a construção de um portfólio de serviços em vez de um plano de carreira. O portfólio é um conjunto de possibilidades de contribuição. Essas contribuições são como um mosaico de conhecimentos e interesses. Por exemplo, um profissional que está trabalhando na área de finanças pode construir suas reflexões de portfólio incluindo projetos em recursos humanos ou marketing. Esses interesses vêm de áreas de estudo, hobbies ou interconexão de temas de negócios.

A livre movimentação de talentos também é um fator-chave na construção dessa abordagem contemporânea. Dar liberdade para que os profissionais fluam e eliminar rituais atrozes para que uma pessoa consiga evoluir na carreira também fortalece o engajamento. A segurança psicológica para que o profissional se candidate livremente às vagas e projetos que surgirem na empresa é peça estratégica nessa filosofia de protagonismo.

Na pesquisa de Beverly, quase 60% dos entrevistados afirmaram que tinham receio de expor seus interesses de carreira com medo de contrariar seu líder e sofrer consequências ruins na organização. A cultura de comando e controle ainda é dominante. Essa mudança na forma de acolher os interesses de carreira inclui a revisão das estruturas lineares e a construção de modelagens mais fluidas como projetos, hubs ou squads que permitam ao profissional circular na empresa. O potencial de contribuição das pessoas pode estar além do cargo que ocupam. O portfólio é o mapa para essa zona de contribuição ampliada.

A construção de um portfólio de atividades também inclui reflexões de trabalho fora da empresa. O tabu das discussões sobre atividades paralelas precisa ser vencido.

Ao contrário do que muitos chefes pensam, indivíduos que realizam atividades fora da companhia são mais engajados. O espaço concedido é um combustível para que o profissional contribua e realize seus objetivos. Empresas rígidas e que mantém a ideia de dedicação exclusiva terão mais dificuldade para manter seus profissionais.

O trabalho de April Rinne mostrou que mais de 55% dos entrevistados gostariam de realizar atividades paralelas, como dar aulas e prestar consultoria. Exigir exclusividade ficou obsoleto. Nenhuma empresa garantirá emprego até a aposentadoria, portanto, não pode exigir que o portfólio de carreira fique restrito a ela. A liberdade para construção da trajetória é a melhor narrativa de carreira para engajar os talentos.